São Paulo, terça-feira, 16 de janeiro de 2007

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BENJAMIN STEINBRUCH

União Americana


Será utópica a idéia de um continente americano unido e mais igualitário, do Alasca a Punta Arenas, no Chile?

TROVÕES que assustam a América Latina mostram quão longe estamos de uma união continental nas Américas. A Venezuela expulsa companhias estrangeiras e anuncia plano de estatizações. A Bolívia expropria empresas que operam na produção de petróleo e gás, envolvendo também a Petrobras. O Equador dá indícios de que poderá seguir o mesmo caminho. A Argentina interfere nos preços de tarifas de empresas multinacionais instaladas no país e vai à Organização Mundial do Comércio contra o Brasil. A mesma Argentina duela com o pequeno Uruguai e bloqueia os acessos ao território vizinho para impedir a instalação de fábricas de celulose na fronteira binacional.
O bloco de países americanos, num mundo em que a união regional se mostra cada vez mais importante, não existe nem no imaginário de lideranças continentais. A UE (União Européia) é um exemplo de sucesso. Funciona tão bem que já conseguiu diminuir as diferenças entre os países mais pobres e os mais ricos da Europa ocidental. Nas Américas, é difícil até buscar estatísticas conjuntas dos 35 países da região. Números da América do Norte não costumam ser somados aos da América Latina.
As desigualdades das Américas são muito mais gritantes que as da Europa. O grande líder, os EUA, com o Canadá, tem PIB (Produto Interno Bruto) entre os mais altos do mundo, enquanto muitas das 35 nações continentais vivem em extrema pobreza. Sozinhos, os EUA possuem uma produção anual de US$ 13 trilhões, equivalente a 76% de todo o PIB das Américas (estimado em US$ 17 trilhões) e cerca de cem vezes maior que o dos 20 países da América Central. Por essa liderança, os Estados Unidos deveriam dar mais atenção aos vizinhos de seu próprio quintal.
Se olhasse mais atentamente e com mais generosidade para o sul, a grande nação americana poderia enxergar enormes sinergias latentes nas Américas e investir na idéia de construir uma verdadeira união continental.
As sinergias são muitas: minérios, petróleo, gás, agrobusiness, bioenergia, manufaturados, serviços e a infinita biodiversidade da Amazônia. Juntas, construiriam um poderoso e diferenciado continente. Uma parcela dos bilionários orçamentos direcionados para guerras proporcionaria às Américas condição de aproveitar o que de melhor existe em cada país. A própria Constituição dos EUA poderia ser um paradigma continental.
É óbvio que o mundo caminha para formar três blocos distintos: Europa, Ásia e América. Com seus recursos naturais, as Américas poderiam ser auto-suficientes, embora obviamente não fechadas a outros blocos. Explorar sinergias, como se faz nas as grandes fusões empresariais, seria uma forma de aumentar produtividade, baratear custos e estimular investimentos conjuntos.
A construção de uma verdadeira União Americana exige determinação, para chegar a um nível muito além do imaginado pela finada Alca, um simples tratado de livre comércio, engendrado para que os Estados Unidos possam comprar matérias-primas baratas e vender tecnologia cara.
Contra a triste realidade do curto prazo -que cultiva a pobreza, mantém desigualdades e semeia o populismo com fachada de socialismo- é possível ter uma visão de longo prazo, calcada em sinergias e na idéia de maior eqüidade entre as nações americanas do norte, do centro e do sul. Nada de desmontar nacionalidades. Como na União Européia, as identidades nacionais e os interesses estratégicos podem ser tranqüilamente preservados. Com uma população estimada em 900 milhões de pessoas, as três Américas seriam um bloco tão sustentável e poderoso quanto Europa ou Ásia.
Será utópica a idéia de um continente americano unido e mais igualitário, da glacial Barrow, no extremo norte do Alasca, à não menos gélida Punta Arenas, no extremo sul do Chile? Será loucura pensar numa UA (União Americana)?


BENJAMIN STEINBRUCH , 53, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho de administração da empresa e primeiro vice-presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).

bvictoria@psi.com.br


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