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São Paulo, domingo, 16 de fevereiro de 2003

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Exportador vende, mas dinheiro não aparece no país

DA REPORTAGEM LOCAL

O tipo mais comum de fraude punido pelo BC nos últimos anos é a chamada sonegação de cobertura cambial. O esquema é simples: o exportador vende seus produtos, mas o dinheiro da operação nunca ingressa no país -ou, pelo menos, não pelo câmbio oficial (comercial), como manda a lei.
Nas importações ilegais, o caminho é inverso: o suposto importador pede autorização para enviar recursos para fora e diz que o motivo é o pagamento de uma futura importação que nunca acontece. Nos dois casos, há evasão de divisas e, com isso, prejuízos para as reservas em moeda estrangeira.
As empresas que cometem esse tipo de delito se encaixam num perfil específico. São pequenas e sem histórico de participação no comércio exterior. Segundo o BC, muitas vezes nem existem mais quando são chamadas a responder a processo administrativo.
Não há estatísticas exatas sobre o número de processos desse tipo já julgados. A Folha teve acesso a relatórios do Conselhinho referentes a oito das empresas multadas e tentou localizá-las, mas apenas duas fizeram operações registradas pelo Ministério do Desenvolvimento nos últimos dois anos: Café Solúvel Brasília e Integração Comércio de Cereais.
Procuradas e informadas sobre a reportagem, nenhuma das duas empresas entrou em contato com a reportagem da Folha.
As outras -Odriozola's Export Comercial e Exportadora, Unifoz Importadora de Hortifrutigranjeiros, Santa Clara Mineração, Inter Corp Comércio Exterior, Interfrios Intercâmbio de Frios e Granero Hortifrutes- não foram localizadas nem em cadastros de empresas de comércio exterior nem em sites de busca da internet.
Embora exporte cerca de US$ 1 milhão anualmente, segundo dados de um cadastro da CNI (Confederação Nacional da Indústria), a Café Solúvel Brasília tem pendentes duas multas no valor total de US$ 10,976 milhões por ter exportado, mas nunca ter recebido os recursos no país.
Alegação apresentada pela empresa ao Conselhinho: sofreu calote de seus clientes no exterior. A justificativa, segundo o BC, é das mais comuns nesse tipo de caso.
O problema é que, na maioria das vezes, as empresas não conseguem comprovar a inadimplência do cliente lá fora -não convencem nem sequer que estão lutando judicialmente para receber o dinheiro. No processo da Café Solúvel, o BC diz que a empresa continuou a exportar para o cliente depois de ele ter ficado, supostamente, inadimplente.
Nesses casos, o banco intermediário da operação de exportação ou importação também costuma ser multado por negligência (não checar melhor documentos apresentados e histórico dos clientes).
O Bradesco, por exemplo, recebeu multa de US$ 551,7 mil por não ter checado uma autorização falsa apresentada em nome de uma empresa que acabou possibilitando uma operação irregular de importação. O banco não quis comentar o assunto.
Embora esse tipo de fraude tenha explodido na década de 90, ainda acontece até hoje. Segundo a Folha apurou, ele tem ocorrido muito em casos de vendas feitas para Argentina e Uruguai. Em alguns casos, tem havido inadimplência mesmo. Em outros, há suspeita de fraude.
Segundo Tereza Grossi, diretora do BC, o grande número de ocorrência de fraudes em operações de comércio exterior não significa que os exportadores brasileiros as estejam praticando. "As empresas tradicionais raramente cometem esse tipo de crime", diz.
A maior parte das operações é feita por empresas desconhecidas e pequenas, que geralmente acabam fechando -muitas vezes logo depois da operação- e dificilmente pagarão suas multas.
O próprio BC diz que, na maior parte dos casos, essas companhias acabam inscritas na dívida ativa da União, onde vão parar os devedores inadimplentes do governo. No entanto a execução dessas dívidas geralmente se arrasta por anos. E, muitas vezes, acaba sem final feliz para os cofres públicos. (ÉRICA FRAGA)


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