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São Paulo, domingo, 16 de março de 2003

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TENDÊNCIAS INTERNACIONAIS

EUA e PT dão atualidade a teorias de Rosa Luxemburgo

GILSON SCHWARTZ
ARTICULISTA DA FOLHA

A semana que provavelmente precedeu a ofensiva militar dos EUA sobre o Iraque começou com a celebração do Dia Internacional da Mulher. Ninguém, no entanto, lembrou a obra da pensadora marxista Rosa Luxemburgo (1871-1919).
Em suas análises econômicas, "Rosa" formulou hipóteses fortes sobre o papel dos gastos militares e dos mercados externos no desenvolvimento do capitalismo. Também ganharam atualidade suas previsões de que o capitalismo conduz à barbárie.
Suas preocupações também parecem ganhar vitalidade à medida que se amplia o debate dentro e fora do PT sobre a sustentabilidade do reformismo "paz e amor" do governo Lula. Rosa Luxemburgo foi uma das principais críticas de Eduard Bernstein, líder que se caracterizava pela opção em favor do "revisionismo" e do "reformismo".
Rosa aceitava a proposta de mobilização do partido dos trabalhadores em favor das reformas, mas, como elas não levariam à superação do capitalismo, os operários deveriam manter-se prontos para conquistar o poder via revolução.
Para os críticos à esquerda, o governo do PT é revisionista e não passa de mais uma versão social-democrata da opção por reformas no capitalismo.
Para os críticos à direita, o PT vai fomentar ao longo do governo Lula um movimento de massas capaz de mudar o capitalismo brasileiro, de baixo para cima, em ações que lembrariam o espontaneísmo ultrademocrático da proposta luxemburguista.
Na economia, a abordagem convencional acredita que "a produção cria seus próprios mercados". É o que se conhece nos manuais de economia como "Lei de Say". A partir daí, a tendência dos mercados ao equilíbrio é só uma questão de tempo.
Contra essa visão, Rosa Luxemburgo dizia que a única possibilidade de expansão contínua do capitalismo reside na conquista de mercados "externos".
Pode-se entender esses mercados como territórios ainda não ocupados, mas também como forças que estão "fora" do mercado, como o gasto público, e, em especial, os gastos militares.
Frequentemente essas duas interpretações do que seja "externo" ao capitalismo coincidem. Isso ocorre quando uma potência capitalista recorre a gastos militares para conquistar novos territórios e, assim, ampliar os seus mercados.
Todo debate marxista em torno de Rosa Luxemburgo tinha como pano de fundo a disputa entre potências que, na virada do século 19, lutavam contra tendências depressivas cíclicas que pareciam irreversíveis.
A luta pelo socialismo equivaleria, na prática, a unir os trabalhadores contra a guerra.
A bandeira que unificaria os trabalhadores era "lutar contra a guerra imperialista" cujas principais vítimas seriam os países menos desenvolvidos.
Assim como o capital se expandia pondo-se fora dos espaços capitalistas, Rosa acreditava que somente se o trabalho se colocasse fora do sistema poderia forçar a vinda do socialismo.
O estabelecimento do Dia Internacional da Mulher, em 8 de março de 1911, teve na militância de Rosa um ponto de apoio. A primeira conferência internacional antibélica foi organizada por mulheres.
Defensora do "conselhismo operário", Rosa Luxemburgo oscilou entre o democratismo e o ceticismo não só ante o capitalismo mas também ante o marxismo ortodoxo.
Para os herdeiros de Rosa, imperialismo é sinônimo de machismo. A uma semana de uma provável guerra que muitos acusam de imperialista, sua obra feminista pioneira continua atual.


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