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ALEXANDRE SCHWARTSMAN
A galinha voadora
Líderes industriais aparentam desateção aos 14 trimestres consecutivos de aumento da produção
TIVESSE EU qualquer dúvida
acerca do vigor do crescimento econômico recente, ela teria se dissipado à luz das declarações
recentes de líderes industriais que,
mantendo longa tradição, já o classificaram como "vôo de galinha", aparentemente desatentos aos 14 trimestres consecutivos de aumento
da produção, o mais longo ciclo de
expansão industrial em 15 anos. A
obsessão galinácea costuma ser sintoma claro da exasperação que surge
quando a atividade econômica, torcida contrária à parte, começa a se
expandir mais fortemente. Nessa
hora, os cérebros de galinha (sem intenção de ofensa à saborosa espécie)
formulam complexos argumentos,
cuja principal qualidade é jamais
passarem pelo teste dos dados.
Tomemos como exemplo uma tese recente patrocinada pelas lideranças industriais: que o Brasil passa por um processo claro de "desindustrialização", contra o qual todo
patriota deve se insurgir. Afinal de
contas, segue a cantilena, o crescimento industrial é cada vez mais resultado da expansão de poucos setores, com baixíssimo potencial de geração de emprego e sem dinamismo
que dê sustentação aos investimentos. Será?
O primeiro argumento é falso. A
inspeção mais cuidadosa dos dados
revela que o crescimento industrial
tem se tornado menos (e não mais)
concentrado do que há poucos anos.
Eu e Cristiano Souza estimamos recentemente a relação entre a taxa de
crescimento da indústria e o índice
de difusão, isto é, a proporção dos
segmentos industriais que apresentam taxas positivas de expansão
num dado mês.
Como esperado, achamos forte relação positiva: quando o crescimento industrial acelera, mais setores
crescem. O importante, porém, foi
achar que essa relação se tornou ainda mais positiva no período mais recente, ou seja, hoje uma mesma taxa
de crescimento corresponde a uma
proporção maior de setores em expansão do que há dois ou três anos.
As evidências, portanto, não apóiam
a tese da maior concentração do
crescimento, uma das pedras fundamentais do pensamento galináceo.
Quanto ao emprego, não é necessário nenhum grande esforço de
pesquisa: os dados da Confederação
Nacional da Indústria mostram aceleração do nível de emprego industrial, cujo crescimento no primeiro
trimestre de 2007 atinge 3,5%, a segunda maior taxa de expansão para
o período desde o início da série,
perdendo apenas para o primeiro
trimestre de 2005. Já a criação de
empregos (dados do Caged) atingiu
cerca de 290 mil novas vagas industriais nos últimos 12 meses, 50% a
mais que nos 12 meses anteriores.
Na mesma base de comparação, a
criação total de empregos manteve-se praticamente inalterada ao redor
de 1,3 milhão, revelando a indústria
mais dinâmica que a economia como um todo.
Por fim, os dados de investimento
são eloqüentes. Por exemplo, a produção de bens de capital para uso industrial cresceu 9% nos últimos 12
meses (16% no primeiro trimestre),
contra 5,5% em 2006, mostrando
aceleração do investimento. Vale dizer, os próprios empresários não parecem acreditar muito na história de
"desindustrialização" apadrinhada
por sua liderança.
Ainda que certos setores enfrentem condições cada vez mais difíceis, os dados mostram que nada parecido com "desindustrialização"
tem ocorrido. Há, sim, uma mudança em curso, da qual emergirão novos vencedores e segmentos em declínio. E o estridente cacarejar à distância...
ALEXANDRE SCHWARTSMAN, 44, economista-chefe para América Latina do Banco Real, é doutor pela Universidade da Califórnia (Berkeley) e ex-diretor de Assuntos Internacionais do Banco Central.
alexandre.schwartsman@hotmail.com
Internet: maovisivel.blogspot.com/
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