São Paulo, Domingo, 16 de Maio de 1999
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CONJUNTURA
Dados recentes do IBGE desmentem cenários traçados por economistas logo depois da desvalorização do real
PIB reage e derruba previsões caóticas

RICARDO GRINBAUM
da Reportagem Local

O Brasil se dividiu em dois nos últimos quatro meses. Até fevereiro, o país descrito pelos economistas tinha cores dramáticas: o PIB cairia até 6%, a inflação bateria em 70% ao ano e poderia ocorrer confisco da poupança.
Na semana passada, o IBGE divulgou dados que estão levando os economistas a traçar outro retrato para a economia do Brasil: o país não só escapou do desastre como 1999 poderá ser um ano de crescimento econômico.
O choque não veio por várias razões. Com o empréstimo do FMI e a troca de comando no BC, o governo conseguiu recuperar a confiança do mercado financeiro e controlar a desvalorização. Não houve quebradeira de empresas e de bancos porque já se sabia dos riscos de uma desvalorização com antecedência e as companhias se protegeram comprando dólares.
A inflação também não subiu tanto porque a economia já estava em recessão e quem mexeu nos preços teve dificuldade de vender os produtos. "Houve um grande erro de avaliação", diz o ex-ministro Marcílio Marques Moreira. "A economia brasileira está mais madura do que se imaginava e os consumidores não aceitam qualquer aumento de preço."
A economia real acabou se mostrando muito mais sólida do que imaginavam até os otimistas. Os economistas erraram feio ao deduzir que a história se repete e que o Brasil enfrentaria uma crise igual à da Rússia ou à da Tailândia.
Os analistas de bancos e de consultorias estão tornando mais brandas suas projeções para 1999. Para a maioria dos economistas, o balanço do ano ainda será uma recessão, embora não seja uma queda tão violenta como se imaginava no início do ano. Hoje, boa parte dos economistas fala em retração de até 1,5% do PIB, contra 3,5% a 4,0%, em média, do início do ano. Os mais otimistas acham, até mesmo, que a economia vai crescer.
"Imaginávamos que o PIB ia cair 2,4%, mas agora achamos que pode crescer até 1%", diz Alexandre Azara, do banco BBA. A consultoria MB Associados, do ex-secretário de política econômica José Roberto Mendonça de Barros, projetava recuo de 1,8% no PIB e agora prevê que não haverá retração.
Os economistas estão revendo suas posições com base nos dados do IBGE. De acordo com o instituto, a economia cresceu 1,02% no primeiro trimestre em comparação aos três últimos meses de 1998. Em comparação ao primeiro trimestre do ano passado, a economia ainda está em marcha lenta, com queda de 0,99%.
O crescimento do PIB foi uma surpresa porque se previa que a economia entraria numa espiral em que a desvalorização provocaria alta de preços e a inflação geraria nova queda do real. Para conter a alta dos preços, os juros ficariam altos por muito tempo. Com o dólar em alta, haveria quebradeira de empresas com dívidas no exterior.
Uma surpresa do PIB veio do campo. Como as estatísticas da agricultura são muito precárias, os economistas não contabilizaram o aumento da safra nem os ganhos dos preços, em reais, dos produtos exportados. No primeiro trimestre, a agropecuária cresceu 17,6%.
"A boa safra de produtos como arroz e feijão diminuiu a pressão sobre os preços da cesta básica e gerou aumento de consumo no campo", diz Mendonça de Barros.
Tudo isso poderia ter sido previsto, em maior ou menor escala, mas alguns economistas preferiram adotar uma técnica mecânica. Em vez de analisar as peculiaridades da economia, traçaram um paralelo com outros países que desvalorizaram suas moedas.
"O que ocorre no Brasil não tem antecedente. Previmos que haveria uma moratória na dívida interna brasileira porque era um caso parecido com o da Rússia", explica Gustavo Canonero, economista do Deutsche Bank. O Deutsche previa inflação de 70% e queda de 5,5% no PIB em 1999. Agora, está refazendo suas contas.


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