São Paulo, quinta-feira, 16 de setembro de 2004

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LUÍS NASSIF

O medo de crescer

Assim como não se pode exigir de Rubens Barrichello que seja um Ayrton Senna, não dá para exigir da equipe econômica que pilote um Fórmula 1. Recentemente o presidente eleito do Ciesp (Centro das Indústrias do Estado de São Paulo), Claudio Vaz, lembrava que não há crescimento sem enfrentar problemas, fricções que ocorrem no organismo econômico. São os chamados problemas do crescimento. Pode ser uma mudança momentânea de preços relativos, um gargalo provisório na oferta, na infra-estrutura. O desenvolvimento significa uma mudança de patamar. E é impossível mudar o patamar sem gerar desequilíbrios, porque o próprio desenvolvimento pressupõe a alteração nas condições anteriores.
Quem tem olhos para ver percebe que a inflação está aumentando por conta de tarifas e de problemas localizados de oferta nos setores exportadores. Não existe explosão de demanda. São preços não afetados diretamente pelas taxas de juros.
Por exemplo, o Ministério da Fazenda poderia operar a economia, reduzindo as tarifas de importação nas áreas de maior pressão. Poderia até criar impostos sobre a exportação para aqueles setores mais aquecidos.
É como o médico que localiza o problema e atua diretamente sobre ele, em vez de tratamentos que afetam todo o organismo da pessoa e, por tabela, atuam sobre a doença.
Mas essas formas de ação exigem dois pré-requisitos: coragem para correr o risco e agilidade e conhecimento para responder aos desafios. E não temos Ayrton Senna. O ex-ministro Pedro Malan consagrou um estilo de política econômica que consistia em nada fazer e passar o trabalho sujo para elevação de juros e arrocho fiscal.
Essa não-política foi revestida com o suposto manto da impessoalidade, do "trabalho limpo". No fundo, refletia apenas o desconhecimento amplo de sucessivas equipes econômicas sobre o funcionamento real da economia.
Tome-se a questão da tributação sobre ativos financeiros. O que a Receita tira de um lado, o Tesouro paga -e com sobra- do outro. Por que ocorre isso? Porque a gestão de política econômica, desde os tempos de Malan, deixou de ser um exercício sistêmico das diversas peças que a compõe.
A vulnerabilidade externa tem sido o principal fator de risco da economia desde o Plano Real. Abortou sucessivas tentativas de crescimento. Mas não há um departamento responsável pelo combate à vulnerabilidade externa. Então, toda vez que a situação melhora, o Banco Central deixa o câmbio apreciar porque vulnerabilidade externa não é seu departamento -mesmo que as sucessivas crises externas acabem explodindo em mais inflação, quando se realizam.
Há tempos a Fazenda perdeu a própria capacidade de analisar a inter-relação entre as diversas ações que conduz. No fundo, em termos de política econômica, o pensamento predominante nos sucessivos governos tem sido tão tosco quanto o da prioridade única das empresas, nos tempos de mercado fechado.
Não adiantam os assomos de voluntarismo e a agonia do ministro José Dirceu. O governo Lula é isso aí.

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