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TECNOLOGIA
Impulsionado por redes de TV e fabricantes, produto é visto como promessa de novos e melhores mercados
TV de alta definição começa a se consolidar
TIM BURT
DO "FINANCIAL TIMES", EM NOVA YORK
Nas entranhas do Sony Plaza, a
principal loja do grupo japonês
em Nova York, uma tela imensa
serve como discreta demonstração para o mais recente modelo
de TV de alta definição. Por trás
das cortinas de pingentes de cristal e dos sofás modernos, um pequeno cartaz revela o custo da experiência visual cristalina: US$
19.999 [cerca de R$ 57 mil]. O preço disfarça uma silenciosa revolução nos hábitos americanos de
TV. Depois de anos de desenvolvimento, a TV de alta definição
ganha espaço no maior mercado
mundial de entretenimento.
A despeito dos preços elevados
dos aparelhos da Sony, a demanda por TVs de alta definição (AD)
deve subir rapidamente nos próximos anos. Os analistas estimam
que quase um terço dos domicílios americanos terão um televisor AD até o final da década, o que
estimularia crescimento similar,
se bem que mais lento, em outras
regiões do mundo. Os preços das
TVs AD mais baratos são, em certos casos, pouco mais de US$ 1 mil
mais altos que os comuns.
"Nós ultrapassamos o ponto de
adoção", diz Aditya Kilgore, analista sênior de mídia e entretenimento do Yankee Group, empresa de pesquisa de mercado sediada em Boston. "Os televisores AD
ficaram estagnados por um bom
período porque ninguém queria
aceitar acordo quanto a um padrão setorial. Agora estamos
avançando porque todo mundo
- os fabricantes de televisores, as
redes de TV, as autoridades regulatórias e os produtores de programas- está trabalhando com o
mesmo objetivo".
A TV de alta definição vem sendo promovida pelos fabricantes
de bens eletrônicos de consumo,
em meio ao crescente entusiasmo
dos consumidores por televisores
de tela larga, que se prestam muito bem à exibição de imagens e
som muito superiores propiciados pelas transmissões AD.
Segmento premium
Em um setor de varejo no qual a
forte competição predomina e há
risco de queda de preços, as TVs
AD oferecem aos fabricantes a
promessa de um segmento premium. De forma semelhante, os
distribuidores de TV paga, via satélite e cabo, vêem a programação
AD como forma de garantir os
consumidores dispostos a pagar
caro, aqueles que se interessam
por adotar novas tecnologias o
mais cedo possível e já adquiriram aparelhos como gravadores
pessoais de vídeo, que lhes permitem compilar uma programação
personalizada de TV para assistirem quando quiserem.
Para seus defensores, a TV de alta definição e a qualidade superior de imagem que oferece representam um salto nos padrões de
programação, usando sistemas de
produção de alto custo e câmeras
sofisticadas para oferecer novos
ângulos, close-ups e imagens indisponíveis para os televisores comuns. Os proponentes da tecnologia argumentam que ela é capaz
de promover as vendas de TVs e
de serviços por assinatura que
ofereçam uma experiência visual
radicalmente diferente, acoplada
a pacotes de serviços como filmes
a pedido e funções interativas para grandes eventos esportivos.
O custo de produção desse tipo
de programa, porém, é elevado, e
as transmissões foram prejudicadas pela capacidade de cabos requerida para conduzir os dados.
Questões como essas estão sendo
resolvidas, agora, pelos avanços
nos sistemas de câmera e ampliação da capacidade de satélite. Isso
encorajou novas redes de TV a
adotar os serviços.
Surto de crescimento
Ainda que a TV de alta definição
tenha sido desenvolvida inicialmente no Japão há mais de uma
década, a resposta inicial da
maior parte das redes de televisão
e potenciais clientes foi morna.
Falta de programas, baixa confiabilidade e custos elevados eram
poderosos obstáculos à aceitação.
Hoje, a televisão AD vem passando por seu primeiro surto real
de crescimento. A tendência foi
alimentada por uma combinação
entre o desenvolvimento de TVs
de tela larga realmente eficientee e
a busca ansiosa dos operadores de
TV a cabo e via satélite por novos
clientes. Isso, por sua vez, encorajou o consenso quanto aos padrões de transmissão e persuadiu
mais criadores de programas a filmar em padrão AD.
Os governos, começando nos
EUA e passando por Reino Unido, França e Japão, estão apoiando iniciativas de TV de alta definição. Para eles, isso representa
uma promessa de avanço na aceitação da TV digital pelos consumidores, o que permitiria aos países desativar os canais de transmissão analógicos e revender as
freqüências ocupadas por eles.
Nos EUA, a expectativa é de que
mais de 30 milhões de domicílios
adquiram aparelhos de televisão
AD nos próximos três anos, e analistas da Data Monitor, empresa
de pesquisa sediada em Londres,
dizem que o número de televisores AD em uso na Europa deve
aumentar de 50 mil no final de
2003 a 4,6 milhões em 2008.
"Alemanha, Reino Unido e
França devem liderar na adoção
da televisão AD, com a Itália ocupando um distante quarto posto",
de acordo com a Datamonitor.
"Recentemente, a Sky, no Reino
Unido, e M6, TPS e TF1, na França, anunciaram planos para oferecer programação AD aos telespectadores -a TPS a partir de
2005, a Sky, em 2006".
James Murdoch, presidente-executivo da British Sky Broadcasting, que controla a Sky e é afiliada à News Corp., diz que a iniciativa reflete a mudança no gosto
dos consumidores e a batalha por
assinantes dispostos a pagar mais
caro. "Nós o faremos com um pacote de canais e eventos para acelerar a decolagem da televisão
AD", disse. "A comunidade de
criação convergirá em torno do
sistema, porque é excitante."
A Sky está seguindo os passos
de redes americanas como a Discovery, que vem produzindo programas AD há dois anos. A HBO,
o canal premium de TV a cabo da
Time Warner, e a rede de esportes
ESPN, controlada pela Disney,
também estão levando adiante a
iniciativa, na produção de dramas
e programas esportivos, respectivamente. TVs por assinatura como a Cablevision e a DirecTV, coligada da Sky nos EUA, promovem a tecnologia pesadamente.
Experiência cinematográfica
O apelo da televisão de alta definição está seu poder de fogo eletrônico. Os televisores usam tubos de raios catódicos para criar
imagens na tela, disparando elétrons de um "canhão" localizado
na parte traseira do aparelho para
uma tela dotada de carga elétrica.
Os padrões existentes de TV nos
Estados Unidos oferecem resolução de imagem (com base no número de elétrons atingindo a tela)
de 525 linhas. Na Europa, o padrão é mais alto 625 linhas.
Na TV de alta definição, as telas
oferecem ou 720 ou 1.080 linhas
de definição transmitidas em velocidade de até 60 quadros por segundo, criando uma imagem que,
segundo os fabricantes de televisores de alta definição, é pelo menos cinco vezes mais clara do que
os velhos sinais analógicos. "É
uma qualidade completamente
diferente", diz Murdoch. "Uma
experiência cinematográfica, é o
que as pessoas desejam em suas
casas. Basta observar as vendas de
DVDs para perceber o potencial
da idéia".
Mas embora as vendas de televisores AD e a produção de programas venham ganhando ímpeto, o
avanço para o DVD de alta definição rasteja. O lançamento do sistema foi retardado por um duelo
setorial opondo a tecnologia Blu-Ray, da Sony, ao padrão rival defendido pela Toshiba e pela NEC.
Alguns dos mais importantes
executivos de mídia do mundo
estão monitorando o resultado de
perto. Esperam que um padrão
único reanime o ímpeto dos
DVDs, que já geram mais receita
para Hollywood do que as salas de
exibição.
Da mesma forma que os consumidores substituíram os envelhecidos videocassetes por DVDs,
presidentes de empresas do setor
esperam que os DVDs de alta definição sirvam para estimular
uma nova demanda.
Dick Parsons, presidente-executivo e do conselho da Time
Warner, diz: "Acredito que a TV
de alta definição oferecerá o novo
estímulo de crescimento se, e
quando, a demanda atual por
DVDs se estabilizar. O número de
aparelhos de alta definição vendidos é o maior já registrado, e a tecnologia poderia nos oferecer métodos de conter a pirataria, porque a codificação será renovável".
Parsons vem instando seus colegas da Sony, Toshiba e NEC a evitar uma guerra de formatos,
acrescentando que "se houver
acordo, dentro de 24 meses veremos a demanda virar do DVD para o DVD de alta definição".
A falta de um acordo pode reduzir o apetite dos consumidores
por televisores AD, limitando a
tecnologia a alguns poucos domicílios mais ricos.
Luxo inacessível
Uma análise recente do Leichtman Research Group, dos Estados Unidos, sugere que a alta definição continua a ser um luxo
acessível a poucos. Nos EUA, a
empresa constatou que apenas
2% dos domicílios com renda
anual inferior a US$ 75 mil dispõem de televisores AD, ante 12%
dos domicílios com renda mais
elevada. Mesmo que a demanda
atinja a previsão de 40 milhões de
aparelhos no mercado americano
até o fim da década, o total seguirá
a ser baixo diante do universo de
275 milhões de TVs no país.
Essa penetração pode ser restringida pela capacidade que a TV
de alta definição requer. A quantidade de dados necessária a transmitir imagens AD ocupa espaço
vital nas redes de cabos e satélites.
Isso é uma boa notícia para as
empresas que vendem essa capacidade. Mas existe um potencial
gargalo, que poderia retardar a
chegada maciça dos televisores
AD ao mercado.
Romain Bausch, presidente-executivo da SES Global, maior
operadora mundial de satélites,
considera a questão como uma
oportunidade. "Com a compressão digital, nossos clientes estão
acomodando entre seis e dez canais de TV em um transceptor. Isso significa uma demanda potencialmente enorme pela capacidade de transmissão de televisão
AD."
A SES está se preparando para
lançar três satélites para a EchoStar, operadora norte-americana
de TV por satélite, e Bausch prevê
demanda adicional na Europa e
na China. "Nossos parceiros na
Ásia nos dizem que por volta de
2005 a China gostaria de ter boa
penetração de TV de alta definição, o que exigirá capacidade adicional... A Olimpíada de 2008 na
China será a primeira a ser transmitida mundialmente via TV de
alta definição."
Para justificar o investimento
nesse tipo de tecnologia e capacidade, as redes mundiais de TV
precisam ver retornos em termos
de audiência.
Mudança inevitável
Mesmo as redes públicas de TV
acreditam que a mudança seja
inevitável. A BBC, maior rede pública de televisão do mundo, planeja produzir todos os seus programas em sistemas de alta definição dentro de seis anos. John
Varney, vice-presidente de tecnologia da BBC, disse que a empresa
adotará a televisão AD para atender à demanda dos consumidores
e enfrentar o desafio competitivo
oferecido pelos rivais no segmento de TV comercial.
Todas as quatro redes abertas
de TV norte-americanas -NBC,
CBS, ABC e Fox- seguirão esse
exemplo. Estão oferecendo programas em formato AD, mesmo
que não haja garantias de que a
tecnologia decolará. O motivo é
que os provedores de cabo e satélite o exigem, e a tecnologia é tão
superior à transmissão analógica
que pode melhorar a audiência.
Executivos de canais como HBO,
ESPN, Discovery e TNT já estão
transferindo a maior parte de suas
novas produções para o formato
AD.
George Bodenheimer, presidente da ESPN, alega que sua rede
"é um catalisador importante tanto para vendas de televisores AD
quanto para assinaturas de pacotes que incluem transmissões
AD".
"Guerra nas Estrelas"
Os produtores de cinema vêm
usando a tecnologia AD para criar
peças promocionais para a série
"Guerra nas Estrelas" e para o
controvertido documentário
"Fahrenheit 11 de Setembro", de
Michael Moore. A Sony, que fabrica câmeras AD, alega que mais
de 300 filmes foram produzidos
usando sua tecnologia de câmera,
além de 42 programas de TV nos
Estados Unidos.
Somadas, alegam executivos do
setor e analistas de investimento,
essas tendências apontam para a
ascensão da TV de alta definição,
há muito aguardada: da produção
de programas à disponibilidade
de aparelhos, capacidade de satélite e, possivelmente, um padrão
unificado para os DVDs de alta
definição.
Na BSkyB, onde os acionistas se
assustaram diante de alguns dos
planos de investimento necessários para a adoção da TV de alta
definição e outros serviços, Murdoch não se arrepende da decisão
de adotar a tecnologia: "A aceitação pra valer da televisão de alta
definição vai começar agora".
Tradução de Paulo Migliacci
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