São Paulo, terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

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BENJAMIN STEINBRUCH

Cada passo será uma conquista


Mesmo que dezembro tenha sido o fundo do poço, não adianta ficar sonhando com a volta dos números de 2008


UM OTIMISTA poderia encontrar números para sustentar a ideia de que já há sinais de recuperação na economia brasileira.
A indústria de automóveis teve forte aumento de produção em janeiro (92,7%) e razoável expansão de vendas (5,11%) -uma montadora até suspendeu férias coletivas previstas para fevereiro. Foram gratas notícias, com a ressalva de que os números se comparam com os de dezembro, quando o setor foi atingido por uma "bomba atômica".
Em São Paulo, a confiança do consumidor cresceu 6,8% em janeiro, depois de quatro meses de queda. O sinalizador de produção industrial, calculado pela FGV para todo o país, aumentou 5,7%, indicando que o setor se recuperou um pouco, depois do desastroso dezembro (-15%). Na indústria paulista, houve perda de 32,5 mil empregos no mês passado.
O turismo interno, beneficiado pelo encarecimento do externo em razão da alta do dólar, deu um salto. A ocupação nos hotéis em janeiro subiu 22% em relação a janeiro do ano passado, levando mais renda principalmente ao Nordeste, e as viagens aéreas cresceram 9%. A indústria do lazer, em geral, faturou mais.
O crédito melhorou. Ainda é escasso, mas já não há o travamento total do último trimestre do ano passado. O mercado anda menos volátil, com o dólar comportado e a Bolsa mantendo uma certa estabilidade no ano.
Diante desse quadro, na avaliação otimista, dezembro teria sido o fundo do poço em matéria de desaquecimento. É possível. Torço para que tenha sido. Persiste, porém, um cenário de grande incerteza.
Da área externa vêm notícias assustadoras. A China, em cujos ombros repousam esperanças de sustentação da expansão da economia mundial, reduziu suas importações de forma impressionante: 43%. Ainda assim, o mercado interno chinês continua vigoroso. Em janeiro, os chineses compraram 735 mil automóveis e superaram, pela primeira vez na história, as vendas do mercado americano, embora esse número mostre um recuo anual de 14%. Na Europa, a produção industrial caiu 12% em dezembro. O bloco de 27 países da União Europeia já está, oficialmente, em recessão. No Japão, o PIB do último trimestre teve queda anualizada de 12,7%. Nos EUA, pesquisas com gerentes de compras mostram resultados levemente positivos, segundo o "Wall Street Journal". Mas a situação geral é muito ruim e há uma certa desilusão com o pacote de Obama, de US$ 787 milhões, aprovado no Congresso.
Do flanco externo, portanto, dificilmente virá tão cedo algum tipo de socorro para a demanda da economia brasileira. O jeito é encarar e tomar tantas medidas quantas forem necessárias para estimular o mercado interno.
O investimento público virou arma ainda mais poderosa para ser usada sem receio nesse ambiente de guerra. O combate ao elevado "spread" bancário também é fundamental para estimular a demanda.
O instrumento mais poderoso, porém, a redução da taxa básica de juros, ainda não foi usado. Manter os juros mais altos do mundo, de 12,75% ao ano, num momento como este é crime de lesa-pátria. A desoneração tributária já feita ainda é insuficiente. Precisa ser mais arrojada, inclusive nos Estados e nos municípios.
Mesmo que o nível de dezembro tenha sido o fundo do poço, não adianta ficar sonhando com a volta dos números de 2008 (até setembro). São o passado. Agora é preciso viver a nova realidade, na qual cada avanço, por menor que seja, será uma conquista.

BENJAMIN STEINBRUCH , 55, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho de administração da empresa e primeiro vice-presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).

bvictoria@psi.com.br



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