São Paulo, terça-feira, 17 de abril de 2007

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

BENJAMIN STEINBRUCH

Marketing de fora pra dentro


No exterior, o Brasil parece ser, neste momento, mais bem avaliado do que o é internamente

FOLHEIO O caderno "Fim de Semana" do "Financial Times" de 7 deste mês. Lá está um longo relato de uma conversa do editor de economia do jornal, Chris Giles, com o professor Jeffrey Sachs, da Universidade Columbia.
O tema da conversa com o famoso economista é a economia mundial. Mas Sachs prefere começar falando da América Latina e do Brasil. Vale a pena transcrever o que ele disse: "A América Latina está fazendo muito mais do que se poderia imaginar. Eu sou otimista sobre o Brasil. E se você olha o mapa, sendo otimista com o Brasil isso já é meio caminho para ser otimista com toda a América Latina. Não perco muito sono com a América Latina -é pacífica, não sofre com o terrorismo, é democrática e tem feito grandes avanços na área do desenvolvimento humano. Aquilo que foi extremamente iníquo e uma sociedade dividida está se tornando lentamente mais igualitário.
Mesmo a profunda divisão étnica e racial está sendo melhorada por meio de políticas democráticas". Talvez Sachs esteja exagerando ao mencionar a influência do Brasil no cenário latino-americano. Talvez esteja se fixando muito numa visão geográfica, olhando o mapa e o tamanho do território brasileiro, sem dar a importância devida ao avanço do populismo nos países vizinhos.
Mas, seguramente, não é só isso. Lá fora, o Brasil parece ser, neste momento, mais bem avaliado do que o é internamente. Na semana passada, o diretor-gerente do FMI (Fundo Monetário Internacional), Rodrigo Rato, previu que o Brasil deve ser elevado à categoria de "grau de investimento" em breve. Isso não é pouco. Significa que o país, aos olhos do mercado, atingiu um nível em que praticamente não oferece mais riscos aos investidores internacionais. Está livre, finalmente, da pecha de caloteiro que o acompanha desde a desastrada moratória dos anos 1980.
Na "The Economist" desta semana, há o que a publicação chama de "Survey", uma ampla e longa reportagem de avaliação sobre o Brasil. A revista não é complacente. Faz críticas à deficiente infra-estrutura que obriga 80% das cargas a chegar aos portos de caminhão; à insegurança geral da população, aterrorizada por bandidos que dão instruções de dentro dos presídios; à educação deficiente, que privilegia a quantidade de estudantes -e não a qualidade do ensino; e à legislação trabalhista antiquada, copiada da Itália fascista de Mussolini.
Apesar dessas críticas, a revista sustenta que o Brasil de Fernando Henrique Cardoso e de Luiz Inácio Lula da Silva forjou um "milagre econômico diferente": inflação baixa; superávit comercial elevado, na casa de US$ 45 bilhões por ano; reservas acima de US$ 110 bilhões, que tornaram o governo credor internacional; melhor distribuição de renda dos últimos 25 anos; e democracia real, a mais sólida entre os Bric (Brasil, Rússia, Índia e China).
Às qualidades econômico-sociais soma-se agora o novo atributo brasileiro: a liderança mundial em combustíveis alternativos, como etanol e biodiesel, que ajudam a compor a imagem de país credor em matéria ambiental. A floresta amazônica, outro atributo, adquiriu potencial de valor estimável -talvez em dezenas de trilhões de dólares- depois que o mundo acordou para os riscos do aquecimento global. Um terceiro atributo diz respeito à paz mundial: o Brasil é o único entre os Bric que não tem bomba nuclear.
Internamente, talvez pela vergonha de ufanismos do passado recente, não há uma percepção muito clara das oportunidades que se apresentam para o país no atual cenário mundial. O marketing brasileiro está sendo feito mais de fora pra dentro do que de dentro pra fora.
Temos a obrigação de combater políticas equivocadas que, a despeito de todas as condições atuais favoráveis, mantêm o baixo crescimento da produção, ameaçam a continuidade dos superávits nas contas externas e impedem o país de se alinhar com os demais emergentes em matéria de expansão econômica.
Não podemos aceitar, por exemplo, a absurda carga tributária que inviabiliza negócios enquanto o setor público gasta descontroladamente. Mas daí a olhar o próprio país com desesperança vai uma grande distância. Principalmente quando, lá de fora, às vésperas dos 507 anos do Descobrimento, ele é visto com tanta curiosidade e cobiça. Independentemente de escolhas políticas ou ideológicas, é preciso dar valor ao que tem valor.


BENJAMIN STEINBRUCH , 53, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho de administração da empresa e primeiro vice-presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).

bvictoria@psi.com.br


Texto Anterior: Álcool provoca impasse entre Brasil e Venezuela
Próximo Texto: Mercado eleva previsão de crescimento para o ano
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.