São Paulo, quinta-feira, 17 de maio de 2007

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Brasil esnoba convite do "clube dos ricos"

OCDE convida país para um "envolvimento reforçado", mas Amorim diz que "o Brasil não precisa do selo de qualidade'

Chile, Estônia, Israel, Rússia e Eslovênia são convidados a se tornar membros plenos da instituição, que hoje tem 30 integrantes

CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A PARIS

A OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico) formalizou ontem o convite para que cinco países (Chile, Estônia, Israel, Rússia e Eslovênia) se tornem membros plenos dessa instituição tradicionalmente conhecida como o clube dos países ricos (são 30 seus integrantes).
O Brasil, embora sua economia seja bem maior do que a dos convidados, exceto a Rússia, foi chamado apenas para um "envolvimento reforçado, com vistas a uma eventual adesão", com China, Índia e Indonésia.
Mas, ao contrário do que acontecia até recentemente, quando a OCDE é que não se entusiasmava com o Brasil, agora é o Brasil que esnoba as constantes insinuações do secretário-geral da instituição, o mexicano Ángel Gurría, para que adira plenamente.

Sem selo
O chanceler Celso Amorim diz que "o Brasil não precisa do selo de qualidade [que representaria ser membro pleno do clube dos ricos], porque já o tem na sua política econômica, na sua política social e na própria política, com a consolidação da democracia".
Ontem, na conversa com Amorim, Gurría deixou bem claro que era ele, como executivo da OCDE, quem demandava a entrada do Brasil, ressalvando, como é óbvio, que cabe ao país decidir se, quando e como iniciar negociações para a adesão plena.
O Brasil já tem com a OCDE, desde 1998, um acordo de cooperação que estabelece uma "relação especial", como a define Nicholas Bray, porta-voz da organização. Significa que o país participa de muitos comitês, que são a forma prática de atuação da OCDE. Como diz Gurría, o Brasil "já trabalha hoje em praticamente todos os comitês substantivos".
Ainda assim, o desejo da OCDE, expresso pelo próprio Gurría, é o de ter com o Brasil "um relacionamento tão próximo quanto o Brasil deseje", o que fica a um passo de um convite público para adesão plena. "Não estamos nos oferecendo", responde indiretamente Amorim.

Proteção e abertura
Esclarecidos os termos do namoro, quais são as dificuldades? Explica, pela OCDE, Bray: "A questão não é apenas ser uma grande economia, mas ter mercados financeiros e do trabalho que funcionem bem e leis adequadas para que o mercado funcione bem. Ou seja, leis que protejam a propriedade e que sejam abertas aos investimentos estrangeiros".
Dessas restrições, parece evidente que o grande problema é a proteção dos investimentos.
Há alguns anos, a OCDE preparou um acordo (MAI, sigla em inglês para Acordo Multilateral de Investimentos), que era tão liberal que provocou o rechaço até da França, sem falar na revolta das ONGs que atuam nessa área. O Brasil nem quis ouvir falar do MAI quando suas regras entraram nos debates sobre a relação entre comércio e investimento.
Agora, por mais que o Brasil tenha feito reformas liberalizantes, ainda há o desejo de preservar o espaço para eventualmente adotar políticas industriais que limitem a liberdade absoluta do investimento externo.
O que facilitaria uma futura adesão plena do Brasil ao clubão do mundo rico seria o tratamento em bloco dos Brics (Brasil, Rússia, Índia e China, países em desenvolvimento que seriam as grandes potências mundiais a partir de 2020, segundo exercício especulativo da firma financeira Goldman Sachs). A esses quatro, Gurría acrescentou ontem a África do Sul e a Indonésia.
De que serve ser membro pleno da OCDE? Explica o ministro espanhol da Economia, Pedro Solbes: "A OCDE centra sua atividade na análise dos principais problemas econômicos e sociais, identificando as boas práticas, ou políticas que demonstraram sua eficácia para enfrentar os diferentes desafios e oportunidades decorrentes da globalização".
Ou seja, o Brasil poderia, em tese, beneficiar-se da experiência do mundo rico nos mais diferentes campos. Na prática, pode não funcionar tão bem assim. Tanto que o Brasil assinou o acordo anticorrupção debatido e decidido no âmbito da OCDE, o que não quer dizer que o país tenha evoluído nesse quesito, como demonstra sua classificação (ruim) no ranking da Transparência Internacional.


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