São Paulo, quinta-feira, 17 de outubro de 2002

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Dólar caro leva à falta do algodão

ADRIANA MATTOS
DA REPORTAGEM LOCAL

No Porto de Paranaguá (PR) há lotes de algodão aguardando a liberação para serem enviados para a Europa e Índia. Com o excesso de cargas esperando o sinal verde, houve atraso de cerca de um mês no envio, informam fabricantes do Mato Grosso do Sul. Esse grande volume de exportação já causa falta de algodão no Brasil. Fabricantes de roupas têm dificuldade para achar o produto. Redes varejistas "correm" atrás de novos fornecedores de roupas por causa dessa escassez de matéria-prima. Querem evitar o risco de falta de mercadoria no final do ano.
As vantagens obtidas com as exportações fizeram os produtores transformarem mercado externo em prioridade. É o que a SLC Agrícola, grande fabricante do sul do país, tem tentado fazer desde meados do ano, assim como fabricantes como a família Schlatter, com 5,5 mil hectares de plantação de algodão e 20% da produção sendo exportada hoje.
Por conta desse cenário, segundo a Folha apurou, um grande fornecedor de meias não está conseguindo dar conta de todos os pedidos para novembro. Isso por causa da dificuldade em achar o algodão. "A vontade deles em exportar é tamanha que os produtores já estão mandando para fora até a pluma do algodão (o produto antes de passar pela fiação)", diz o executivo.
Quando o dólar dispara, fica mais interessante mandar mercadorias para fora do país. O produto torna-se mais barato no exterior e a empresa ainda consegue receita em dólares.
O problema é que a medida causa respingos na cadeia produtiva. No último domingo, a C&A decidiu publicar um anúncio chamando novos fornecedores para conhecer e fechar contratos. Segundo a Folha apurou, a decisão ajuda a afastar o risco de receber menos itens no final do ano, por causa da escassez de algodão.
A companhia diz, no entanto, que isso em nada tem a ver com a subida do dólar. "Sempre fazemos esse contato com fabricantes", diz Marcelo Fernandez, porta-voz da companhia.
A indústria do vestuário fatura cerca de US$ 16,5 bilhões por ano -são 5,3 bilhões de peças fabricadas-, e mais de 70% do montante é obtido no verão. Ou seja, o período é o "ganha-pão" do setor.
Na ponta do lápis, dá para entender porque há tanto produto indo para fora.
Segundo a direção da SLC Agrícola, o mercado de algodão em pluma (em fardos de aproximadamente 220 quilos, obtidos após o descaroçamento), trabalha com as cotações em reais ou em dólar por libra-peso. Neste momento, há demanda no exterior e os clientes estrangeiros têm pago R$ 1,78 por uma libra-peso. Cerca de duas libras-pesos equivale a um quilo de algodão.
No Brasil, entretanto, o valor varia de R$ 1,48 a R$ 1,50 por libra-preso. "O produtor está preferindo exportar neste momento porque o mercado externo está bastante comprador. O valor pago compensa mais do que o praticado hoje pelas indústrias têxteis no país", diz Werner Tiede, gerente de Negócios da SLC.
O aumento na exportação é contínuo: são entre US$ 20 milhões a US$ 30 milhões exportados por mês desde maio, quando o real começou a se desvalorizar. Apenas neste ano, até agosto, foram exportados US$ 189 milhões.
Os ganhos também aparecem como forma de compensar o ano perdido de 2001. Os subsídios ao algodão americano e a supersafra da China acabaram complicando a vida dos produtores brasileiros no ano passado. Neste ano, a idéia é vender abusando da recuperação das cotações lá fora -que subiram 30% em 2002.
Na avaliação dos compradores de algodão e tecidos no Brasil, a situação só não está mais delicada -com a necessidade urgente de insumos- porque não há demanda forte por roupas no Brasil atualmente.


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