São Paulo, sábado, 17 de novembro de 2007

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Dono da OceanAir cresceu como cliente do governo

Negócios de Efromovich com o Planalto começaram no início dos anos 90, em contratos com a Petrobras

Proposta de transportar os passageiros da BRA pode ser a chance que a OceanAir desejava para crescer no mercado, dizem analistas

Bruno Miranda/Folha Imagem
German Efromovich, dono da OceanAir, que pretende ficar com as linhas que antes eram operadas pela BRA

DA REPORTAGEM LOCAL
DA SUCURSAL DO RIO

Dono do conglomerado Synergy Group, com negócios nas áreas de petróleo e aviação, o empresário German Efromovich mantém relações próximas com a cúpula do governo e a do PT, a ponto de se vangloriar de ter Lula entre seus alunos de matemática no ABC 30 anos atrás.
Na semana passada, Efromovich anunciou que a OceanAir, a quarta colocada em participação no mercado doméstico, com uma fatia de 2,9% em outubro, se responsabilizaria pelo transporte dos passageiros que compraram pacotes de viagem na PNX com vôos da BRA.
Analistas ouvidos pela Folha avaliam que a oferta de Efromovich pode ser a grande chance de a empresa ganhar mercado. O empresário foi o único que já foi recebido em audiência pelo ministro da Defesa, Nelson Jobim. O ministro já fez críticas diretas ao modelo de duopólio TAM-Gol, no mercado doméstico de aviação.
"As grandes empresas estão de orelha em pé, querendo saber o que vai acontecer. Ele tem boa "entrada" com o governo e criou um "crédito" significativo ao aceitar transportar esses passageiros. Isso mostra a crueldade do duopólio no país", afirma o consultor em aviação Paulo Bittencourt Sampaio.
O empresário não se comprometeu a transportar os 70 mil passageiros que compraram bilhetes da OceanAir, mas apenas os que tinham pacotes de viagem da PNX. A BRA, porém, rebateu a OceanAir e afirmou, na terça-feira, que todos os seus passageiros, inclusive aqueles de vôos que não sejam de fretamento, terão transporte garantido pela OceanAir.
Efromovich reclamava havia meses da atuação da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) e dizia que a agência protegia o duopólio. Afirmava que a estratégia da OceanAir para ganhar mercado se daria por meio de rotas alternativas porque não havia como lidar com a "concorrência predatória".
Enquanto a nova diretoria da agência não toma posse, Efromovich resolveu recorrer ao próprio ministro. A expectativa é que a OceanAir seja beneficiada com as linhas da BRA.
Judeu, filho de sobreviventes de origem polonesa do campo de extermínio de Treblinka, Efromovich tem fama de "brigão". É do tipo que fala muito, sempre com gestos largos e o sotaque de emigrante boliviano que chegou ao país com 13 anos. Gosta de vangloriar-se de ter acesso direto à toda-poderosa Dilma Rousseff, ministra-chefe da Casa Civil.
Já a relação com o presidente Lula data de três décadas, quando o metalúrgico assistia a suas aulas de matemática num cursinho oferecido pelo Sindicato dos Metalúrgicos do ABC.
"Ele [Lula] tem muito valor", costuma dizer Efromovich, que também é amigo de Roberto Teixeira, advogado compadre do presidente e um dos lobistas mais ativos do setor aéreo.

De olho na África
O portfólio de empresas de Efromovich inclui a Marítima, que atua na área de petróleo, e os estaleiros Mauá e Eisa. As atenções do empresário, no entanto, concentram-se atualmente no setor de aviação. Além da OceanAir, ele é dono da Avianca (Colômbia), de empresas aéreas no Peru e no Equador e prepara-se para entrar no continente africano.
Pouco depois de Lula apelar por vôos diretos entre o Brasil e a África, a OceanAir pretende iniciar uma linha para a cidade de Lagos, na Nigéria.
A OceanAir começou explorando rotas usadas pelos funcionários da Petrobras, como a Rio-Macaé, como uma pequena empresa de táxi aéreo.
A elevação da OceanAir à categoria de empresa de aviação regular exemplifica a personalidade do empresário. Impressionado com os baixos preços de aviões Fokker-100, que estavam parados no deserto nos EUA, decidiu compor a frota com esse modelo de aeronave, apesar dos conselhos de que o avião tinha má fama no Brasil por estar associado a diversos acidentes na década anterior. Não deu ouvidos a ninguém. A OceanAir tem hoje encomendas de aeronaves A-320 para expansão das linhas. Os planos de expansão incluem ainda a compra de ativos da Vasp, que está em recuperação judicial.
Na Colômbia, por ter comprado a Avianca -"Pegamos essa empresa na lona", diz ele, com orgulho- ganhou de presente do presidente Álvaro Uribe, a quem reserva os mais efusivos elogios, mais uma cidadania, a colombiana. A Avianca é uma das empresas mais tradicionais da América Latina -foi fundada em 1919.

Petróleo
Nos próximos anos, Efromovich pretende ampliar os tentáculos ainda mais, para setores como o do agronegócio.
A mais notória confusão empresarial de Efromovich é uma disputa internacional com a Petrobras, que se arrasta desde o início da década. O empresário quer indenização de US$ 8 bilhões. Reclama ainda de ser perseguido e excluído de licitações.
As queixas, segundo seus adversários, são descabidas. Quem não gosta de Efromovich lembra, com certo veneno, que ele tinha excelente trânsito na petrolífera durante meados da década de 90, sob a gestão tucana, mais especificamente a de Joel Rennó. Nas vacas gordas, a carteira de negócios do empresário com a Petrobras ultrapassava US$ 2 bilhões.
Afirmações como essa fazem os olhos de Efromovich ficarem miúdos por trás dos óculos e são devolvidas em forma de palavrões ou de um silêncio contínuo. É o que também acontece quando alguém menciona um de seus muitos desafetos.
Para desespero de seus assessores, todos escolhidos a dedo entre ex-funcionários da Petrobras, Efromovich gosta de rejeitar acordos e tentativas de conciliação, a despeito de, no passado, ter acionado sua rede de contatos oficiais.
No início do governo Lula, foi recebido por Dilma, então ministra de Minas e Energia, que ouviu suas reclamações e imediatamente telefonou para o então presidente da Petrobras, José Eduardo Dutra, pedindo atenção aos pleitos do empresário. De nada adiantou. "Esses contatos no governo não resolvem nada", diz o empresário.
Apesar do discurso para fora, Efromovich tem o hábito de investir pesado em áreas que dependem de concessão do governo, como a de exploração de petróleo. Diz que o ambiente para seus negócios melhorou sensivelmente durante o governo petista.

"Dia histórico"
Os anos FHC foram de altos e baixos. Efromovich surgiu do nada como papão de contratos da Petrobras no início da década de 90, com a Marítima, espécie de nave-mãe de seu conglomerado, o Synergy Group.
A lua-de-mel com o Estado acabou de maneira estrondosa quando o comando da estatal saiu das mãos de Rennó e passou aos sucessores, Henri Reichstul e Francisco Gros. O naufrágio da plataforma P-36, construída pela Marítima em 2001, azedou de vez as relações.
Efromovich conseguiu reconstruir as relações com a Petrobras nos últimos anos, depois de se tornar sócio majoritário do estaleiro Mauá, citado na operação Águas Profundas, da Polícia Federal.
Segundo relatos, no dia em que retomou negociações com a Petrobras, parou na frente da sede da empresa e disse estar vivendo um "dia histórico" por voltar a colocar os pés na estatal após anos de discussões na Justiça.
De acordo com a investigação, o Mauá integraria um esquema envolvendo o pagamento de propinas a funcionários da Petrobras, centralizado pela empresa Angraporto. Para o empresário, tudo não passa de um esquema armado por grandes empresas para atrapalhar as atividades de sua companhia.

Estilo despojado
Se gosta de uma polêmica em público, Efromovich, em privado, faz o estilo empresário despojado. Dispensa a gravata, brinca com as secretárias, despacha com simplicidade em um escritório enfeitado com maquetes de aviões. Do seu escritório é possível enxergar a pista do aeroporto de Congonhas, na zona sul de São Paulo.
Um mistério é onde ele mora. A base formal é São Paulo, onde estão também a mulher, as três filhas e os dois netos pequenos. Só para agradá-los, aliás, aceita tirar uns dias de folga e esquiar.
Mas é "no ar" onde ele fica 90% do tempo, dizem assessores. É capaz de viajar 80 horas em uma semana. No restante do tempo, gosta de fazer o marketing da simplicidade. Viaja em aviões de carreira dos concorrentes, pega táxis na rua e dirige um Ford Versailles dourado, a álcool, ano 1991.
"Vale R$ 6.000", diz ele, contando que o carro não o torna um alvo óbvio para seqüestradores ou ladrões.


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