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JOSÉ ALEXANDRE SCHEINKMAN
A agenda minimalista do presidente
O governo parece ter
compreendido que o país não
tem as condições para crescer
5% de maneira sustentada
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NO FINAL do ano passado, escrevi uma coluna lamentando a oportunidade perdida
em 2005. O bom desempenho da
economia global naquele ano permitiu a muitos países emergentes
superar previsões que já eram bastante otimistas. A exceção foi o Brasil, que, apesar das condições externas extremamente propícias, cresceu 2,2%.
Lamentavelmente, eu poderia hoje republicar a mesma coluna. O ano
que termina foi ainda melhor para a
economia mundial do que 2005, e o
PIB dos países emergentes, puxado
por China e Índia, aumentou 7,6%, e
o da América Latina, 4,9%. Os preços das commodities continuaram
favoráveis, e as taxas de juros internacionais longas não aumentaram.
Mas a economia brasileira registrou
um crescimento de cerca de 3%.
Como muitos outros observadores, eu estou convencido de que a
política monetária excessivamente
apertada reduziu o crescimento.
Mas a verdade é que, mesmo se o
Banco Central seguir uma política
de juros de melhor qualidade, a economia brasileira não vai obter, no
longo prazo, resultados muito superiores ao atual.
O presidente Lula anunciou no dia
de sua reeleição que a economia brasileira cresceria 5% ao ano no segundo mandato, mas esta Folha noticiou que o Planalto já trabalha com
uma previsão de 4% para 2007. O
governo parece ter compreendido
que o Brasil não tem as condições
necessárias para crescer a 5% ao
ano de maneira sustentada. Um
pré-requisito importante para
atingir tal meta seria que a taxa de
investimento, hoje em torno de
20%, chegasse a 25% do PIB.
O nível dos juros reais é somente
uma das razões para a nossa baixa
taxa de investimento privado. A
carga tributária e a falta de ambientes regulatório e institucional
adequados contribuem também
para reduzir os investimentos.
O Brasil precisa de uma reforma
tributária que substitua os impostos indiretos sobre bens, serviços e
trabalho (ICMS, IPI, ISS, Cofins
etc.) por um imposto sobre o valor
adicionado, preservando a cobrança do Imposto de Renda. Para combater a informalidade, a reforma
deveria reduzir a contribuição previdenciária paga pelos trabalhadores com menores salários. Também deveria ser aprovado o projeto
do senador Tasso Jereissati
(PSDB-CE) que propõe uma redução gradual da CPMF até atingir
0,08% em julho de 2010. Mas cobrar impostos de maneira mais racional não é suficiente. É preciso
também reduzir a nossa carga tributária, que não só supera a de outros países com o nosso nível de
desenvolvimento mas também a
de países muito mais ricos, como
Coréia do Sul ou Estados Unidos.
Estudos econométricos documentam que uma das razões para o
mau desempenho da economia
brasileira a partir da década de 80
foi a falta de investimentos em infra-estrutura. A privatização dos
anos 90 ajudou em setores como a
telefonia, em que o Brasil já apresenta bons índices, mas a ausência
de regulamentação adequada para
setores cruciais, como o de geração
de eletricidade, e o nível quase nulo de investimentos do governo federal resultam em um déficit em
infra-estrutura. Além de melhorar
o ambiente legal para atrair capital
privado, o governo precisa aumentar o investimento público.
Diminuir a carga tributária enquanto se aumenta o investimento
público requer corte nos gastos do
governo. A dívida pública equivale
a 50% do PIB e é só em parte indexada à taxa Selic. Assim sendo, uma
redução da Selic real, isto é deduzindo-se a inflação, de 10% para
6% ao ano, traria uma economia
inferior a dois pontos do PIB. O
presidente Lula precisa atacar os
gastos correntes federais, o que
não deveria ser difícil em um país
em que os três níveis de governo se
apropriam de quase um terço do
PIB.
Infelizmente, o presidente Lula
parece ter adotado uma agenda minimalista. A reforma tributária que
se desenha é menos ambiciosa do
que a necessária e sem redução da
carga. O governo defende a prorrogação da CPMF, mas mantendo a
atual alíquota. No final do ano passado, os ministros Paulo Bernardo
e Antonio Palocci Filho defendiam
maior controle das despesas correntes, mas a equipe econômica de
hoje prefere esperar que o crescimento reduza a proporção entre
gastos correntes e o PIB.
Espero estar errado, mas é bem
possível que a coluna que escrevi
em 2005 continue atual no final de
2007.
JOSÉ ALEXANDRE SCHEINKMAN , 58, professor de economia na Universidade Princeton (EUA), escreve quinzenalmente aos domingos nesta coluna.
jose.scheinkman@gmail.com
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