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LUIZ GONZAGA BELLUZZO
Analogias falaciosas
Países de moeda fraca têm dificuldades em manter boas condições de crédito interno e a estabilidade da moeda
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O ECONOMISTA Jagdish Bhagwati, ícone dos partidários do
livre comércio, tem fustigado
a liberdade concedida ao movimento
de capitais.
Segundo ele, há quem pretenda
justificar a mobilidade internacional
de capitais a partir de uma analogia
imprópria com a teoria das vantagens comparativas, sustentáculo das
postulações que recomendam a
maior liberdade possível no comércio de mercadorias e serviços. Assim,
conforme essa visão, os países que
sustentam déficits crônicos em transações correntes revelam "preferência" pelo consumo presente em relação ao consumo futuro e, portanto,
têm uma vantagem comparativa na
venda de seus ativos em troca de endividamento, o que é compensado
pela preferência oposta dos países
superavitários e credores.
A vida real não combina com esse
conto de fadas. Os movimentos de
capitais dos países credores para os
devedores são, e sempre foram, pró-cíclicos, para desgosto dos que acreditam em Papai Noel ou em modelos
mais tolos do que inúteis. Nas economias periféricas, de moeda não-conversível -isto é, com demanda nula
por parte de agentes de terceiros países-, o consumo se expande na fase
de ingresso líquido de capitais e sofre
violentas contrações quando o movimento se inverte, não raro subitamente. Num ambiente internacional
de livre movimentação de capitais,
os bancos centrais dos países de
moeda fraca encontram dificuldades
em manter, simultaneamente, boas
condições de crédito doméstico e a
estabilidade de sua moeda.
O controle da liquidez em moeda
forte é, portanto, crucial para a sempre precária combinação entre estabilidade e crescimento nas economias de moeda não-conversível. Os
países periféricos mais bem-sucedidos, como a China e a Índia, preferiram manter controles seletivos e
pragmáticos de câmbio e de capitais.
Acumulam reservas elevadas em
moeda forte (dólares ou euros) para
evitar "choques de desvalorização"
que possam afetar negativamente a
taxa de juros doméstica.
Os estudos que procuram avaliar
os efeitos dos controles de capitais e
as intervenções no mercado de câmbio sobre o desempenho das economias emergentes não são conclusivos. Os resultados econométricos
são, para dizer pouco, ambíguos. As
condenações peremptórias de tais
procedimentos -apontadas como
geradoras de ineficiência alocativa-
partem mais freqüentemente de
doutrinadores e ideólogos, sem uma
base empírica sólida. A experiência
recente parece mostrar, no entanto,
que no rescaldo das crises os constrangimentos sobre as políticas monetária e fiscal são mais duradouros
no caso dos países que abriram imprudentemente suas contas de capital, surfaram nos ciclos de liquidez
externa e permitiram amplas flutuações de suas moedas nacionais.
Quanto aos regimes cambiais, a literatura mais recente está convergindo, um tanto tardiamente, para
duas conclusões (é espantoso que alguns brasileiros ainda insistam no
receituário desacreditado dos anos
90): 1) não é recomendável a adoção
de regimes cambiais "extremos" (taxa fixa ou livre flutuação), e 2) os
bons "fundamentos" fiscais (sobretudo a dinâmica da dívida pública
interna) podem reduzir substancialmente os prêmios de risco, mas não
eliminam -sem reservas alentadas- o prêmio de liquidez na formação das taxas de juros domésticas.
LUIZ GONZAGA BELLUZZO , 64, é professor titular de Economia da Unicamp. Foi chefe da Secretaria Especial de Assuntos Econômicos do Ministério da Fazenda (governo Sarney) e secretário de Ciência e Tecnologia do Estado de
São Paulo (governo Quércia).
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