São Paulo, domingo, 17 de dezembro de 2006

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Contrato nada muda em campo da Bolívia

San Antonio, maior produtor de gás da Petrobras, não teve rotina alterada mesmo com ameaças e problemas diplomáticos

Novo contrato de operação da unidade entrou em vigor há duas semanas, mas a rotina continua a mesma, afirmam os trabalhadores

FABIANO MAISONNAVE
ENVIADO ESPECIAL A VILLA MONTES

Desde que o presidente da Bolívia, Evo Morales, invadiu um campo da Petrobras para anunciar a nacionalização dos hidrocarbonetos, em 1º de maio, foram seis meses de crise diplomática, ameaças de lado a lado e reuniões intermináveis até chegar à assinatura dos contratos, no final de outubro. Mas o fato é que, após a entrada em vigor dos novos acordos, nada mudou no dia-a-dia da maior unidade de produção de gás nos 22 países em que a empresa brasileira opera.
Na quinta-feira, a reportagem da Folha esteve no megacampo de San Antonio, na província de Gran Chaco, departamento de Tarija, sul da Bolívia. Trata-se de uma espécie de Itaipu do gás natural, responsável por cerca 25% do abastecimento desse combustível no Brasil. Na rotina ali, asseguram os funcionários, nada mudou apesar de o novo contrato de operação da unidade estar em vigor há duas semanas.
"Até o momento, ainda não houve instruções oficiais, nós continuamos com o mesmo esquema de trabalho, com a exceção de algumas ações do tipo social e voluntária", disse o boliviano Victor Paz, coordenador de San Antonio.
"Vamos ver se continuamos fazendo [trabalhos sociais].
Não é que essa área tenha sido paralisada, mas houve um adiamento de novos compromissos", afirmou.
A assinatura dos contratos e a rotina inalterada, por sua vez, devolveram um pouco da tranqüilidade aos funcionários de San Antonio. "Eles estavam muito nervosos nos últimos meses. Agora, abaixou um pouco, mas o estresse continua", conta a professora de ginástica, que dá aulas diárias numa bem equipada academia instalada na base. "A preocupação, claro, é perder o emprego", afirma ela, que pediu para não ser identificada.
Outro funcionário, encarregado da manutenção da processadora de gás, confirma.
"O pessoal acha que o Evo sempre tem um ás escondido na manga, com ele nunca se sabe." O funcionário também pediu para não ter seu nome revelado.
A falta de mudanças até agora pode ser explicada, em parte, porque as negociações não acabaram -ainda falta definir a aplicação de vários aspectos técnicos do novo contrato, que vive uma disputa semântica entre a Petrobras, que o classifica de "risco compartilhado", e o governo boliviano, que diz ser de "prestação de serviços".
Para o analista boliviano Carlos Miranda, a Petrobras tem mais razão do que a Bolívia. "Os novos contratos têm 80% de reforma tributária e 20% de nacionalização", afirma, enfatizando o fato de que, essencialmente, as empresas passarão a pagar mais impostos a partir de agora.

Cozinheiros e operadores
Apesar de ser a maior unidade de produção da Petrobras, San Antonio, distante 30 km de Villa Montes, tem pouquíssimos funcionários: para monitorar o envio de cerca 25% do gás natural consumido no Brasil, não são necessários mais do que cinco operadores. É menos do que emprega a cozinha, mantida por 11 funcionários a cada turno.
Considerado uma das unidades de produção de gás mais modernas do mundo, o campo de San Antonio dispõe de apenas cerca de 180 pessoas, divididas em dois turnos, que variam de 14 a 21 horas seguidas de trabalho, intercalados pelo mesmo período de descanso.
Ou seja, há apenas 90 funcionários por turno, e isso porque uma parte está empregada na perfuração do quinto poço de gás do campo, o Sábalo 5, um trabalho temporário.
O número de funcionários diretos da Petrobras é menos da metade: apenas 22, sendo 11 em cada turno -exatamente a mesma quantidade empregada na cozinha. Desses, apenas dois são brasileiros.
San Antonio só empregou de forma significativa durante a sua construção, quando chegou a ter 2.500 trabalhadores.
O complexo, erguido entre 2001 e 2002, custou cerca de US$ 220 milhões e inclui obras de grande porte, como uma ponte sobre o rio Pilcomayo, um túnel de dois quilômetros sob um parque nacional por onde passa o gasoduto e um aeroporto.


Os repórteres FABIANO MAISONNAVE e EDUARDO KNAPP viajaram a San Antonio a convite da Petrobras Bolívia.


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