São Paulo, quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

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PAULO RABELLO DE CASTRO

2009, um ano de (pré) eleição


O governo precisará de um time especial para jogar em "campo com chuva", de caras novas, com jeito profissional

ENQUANTO os riscos de colapso econômico mundial vão se tornando perceptíveis para todos, nosso governo continua mantendo o mesmo comportamento irregular -às vezes, irrepreensível, às vezes contraditório- que o tem caracterizado desde a aceleração da crise.
Com a aproximação de 2009, não sobrou nada para o lado da marolinha. A decisão do Banco Central de manter os juros não condiz com a gastança projetada do novo Orçamento da União. Ou condiz? O Banco Central sabe que não pode deixar escapar o controle informal que exerce sobre o câmbio. Assim, por via das dúvidas, mantém exageradamente elevada nossa taxa de juros ante as demais. Foi assim desde o começo da gestão Meirelles e não seria diferente agora, senão por uma razão nova: o anúncio de mais disciplina fiscal, para assegurar o valor de nossa moeda durante o ano da crise. Diga-se: o governo Lula não tem se saído mal nos resultados fiscais, mas o herói passivo dessa história de sucesso é o bolso do contribuinte. Seria preciso, agora, aliviar o sofrido setor privado e as famílias.
Lula anunciou recentes vantagens tributárias: pequenas, mas importantes. Teria feito melhor se as tivesse anunciado com um discurso paralelo de contenção do crescimento imoderado do gasto federal. O presidente está aferrado ao discurso de mandar o brasileiro "gastar a qualquer custo" para vencer a crise (que o povo não compra nem de brincadeira). Então, como pode ele defender a prioridade à moderação dos seus próprios gastos correntes?
Motivos não lhe faltariam: tem aí o dispêndio em investimentos do PAC para ser preservado, o que lhe requererá corte no consumo de governo. Mas, politicamente, o governo não se conforma com a pouca sorte de haver visto passar debaixo de sua ponte sua bilionária chance de fazer tudo ao mesmo tempo, gastar e gastar e ainda safar-se com um ciclo monetário virtuoso e juros cadentes. Não mais.
Ao perceber a mudança de vento, a oposição não perdeu tempo. Em São Paulo, o governador José Serra, inteligente e sagaz em tudo o que faz, tirou do armário um projeto de lei estadual para introduzir "contratos de metas" (leia-se, compromisso de gestão pública baseada em bons resultados) em toda a administração do Estado. Não poderia ter sido mais certeiro e oportuno. Para além de pacotes tributários, o que o brasileiro contribuinte e eleitor quer saber é se os poderes públicos estão fazendo sua parte na busca de mais produtividade para combater a crise. Só assim se preservarão empregos.
A estratégia anticrise de 2009 exigirá "comitês de crise" atuantes, que o governo federal poderia implantar desde já. Com o discurso errado, o presidente perdeu o primeiro round. Mas isso não tem nenhuma importância. O que não pode é achar que está abafando apenas por denunciar os pessimistas e largar na arena sua candidata para 2010 quando ainda nem sobrevivemos a 2009. Isso fará mal à sua saúde política, que hoje é invejável.
O governo federal precisará de um time especial para jogar em "campo com chuva", de caras novas, com jeito profissional. E não seria demais pedir uma "agenda de transformação" por meio de reformas arrojadas (não as atuais propostas, minguadas), pois é sempre nas grandes crises que o país avança e melhora.
O presidente pode concluir sua gestão com o mesmo "Vivace" com que a inaugurou em 2003. Manter a esperança na crise é diferente de brigar contra "heranças malditas". Agora o jogo é de decisão. Se não for a campo com o seu melhor time, cederá o placar final ao desafiante, que vem com tudo.


PAULO RABELLO DE CASTRO , 59, doutor em economia pela Universidade de Chicago (Estados Unidos), é vice-presidente do Instituto Atlântico e chairman da SR Rating, classificadora de riscos. Preside também a RC Consultores, consultoria econômica, e o Conselho de Planejamento Estratégico da Fecomercio-SP. Escreve às quartas-feiras, a cada 15 dias, nesta coluna.

paulo@rcconsultores.com.br


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