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ANÁLISE
"Helicopter Ben" enfrenta maior desafio
MARTIN WOLF
DO "FINANCIAL TIMES"
Os BCs podem em breve recorrer às suas mais poderosas
armas contra a deflação: a licença para imprimir dinheiro e
a liberdade para "lançá-lo de
helicóptero". Será que as armas
funcionarão? Inquestionavelmente, sim: se usadas de maneira impiedosa, eliminarão a
deflação. Mas voltar à normalidade será muito mais difícil.
Bernanke pronunciou um
célebre discurso sobre o tema
em novembro de 2002. As autoridades temiam, então, que
os EUA em breve seguissem o
Japão no caminho da deflação.
Bernanke insistiu, na ocasião, em que "a chance de deflação nos EUA é extremamente
pequena no futuro previsível".
Mencionou "a força do nosso
sistema financeiro" e que "os
balanços empresariais e domiciliares estão majoritariamente
em boa forma". Seis anos e uma
bolha de habitação e crédito depois, ele deve se sentir não só
mais triste como mais sábio.
A posição dele era também a
de que "a melhor maneira de
escapar a um problema é não
entrar nele". O medo da dificuldade de reverter as expectativas deflacionárias explica por
que o Fed vem reduzindo as taxas de juros tão rapidamente.
A deflação é uma probabilidade realista? Os indicadores
centrais de inflação sugerem
fortemente que não. Por que,
então, os BCs deveriam temer a
deflação? Primeiro, ela torna
impossível que a política monetária convencional propicie taxas reais de juros negativas.
Quanto mais rápida a deflação,
mais altas serão as taxas. Segundo, a "deflação de dívidas"
-o valor real ascendente das
dívidas à medida que os preços
caem- se torna uma ameaça
letal. Nos EUA, onde a dívida do
setor privado disparou de 118%
do PIB em 1978 para 290% em
2008, a deflação de dívidas pode deflagrar uma espiral de
queda que envolveria insolvência em massa, queda na demanda e deflação ainda maior.
O Fed já adotou diversas medidas pouco convencionais para manter a economia à tona.
Em 10 de dezembro, o balanço
do banco central atingiu os US$
2,2245 trilhões, um salto de
US$ 124 bilhões na semana e de
US$ 1,378 trilhão em um ano,
com ampla gama de papéis públicos e privados em sua carteira. Se isso continuar por muito
tempo, o Fed pode se tornar o
maior banco do mundo.
E ele está enfrentando restrições? Na verdade, não. Mesmo
quando os juros chegarem a zero, o Fed pode relaxar ainda
mais a política monetária. Imagine o que aconteceria caso um
alquimista soubesse transformar chumbo em ouro, a custo
zero. O ouro não valeria muito.
Os BCs podem criar quantias
infinitas de dinheiro a custo zero. E assim podem reduzir seu
valor a nada também.
Assim, o que podem fazer os
BCs? Podem reduzir os juros de
prazo mais longo ao adquirir o
máximo possível de títulos do
governo ou ao prometer manter baixas as taxas de juros por
um período prolongado. Podem fazer empréstimos diretos
ao setor privado. De fato, podem adquirir quaisquer ativos
privados, a qualquer preço, e
em qualquer quantidade. Também podem adquirir ativos denominados em moedas estrangeiras. E podem financiar os
governos.
Já as autoridades fiscais podem operar com o déficit que
desejarem e depois financiá-lo
emitindo papéis de curto prazo
que o BC teria de comprar, para
manter o juro baixo. Na fronteira do juro zero, a política fiscal e a monetária se unificam.
Mas o reverso também é verdade: o BC pode enviar dinheiro a
cada cidadão. É essa a idéia de
jogar dinheiro de um helicóptero, proposta pelo economista
liberal Milton Friedman.
A esta altura, deve haver
quem esteja imaginando por
que o Japão enfrentou a deflação por tanto tempo. Faço pouca idéia. Mas a explicação parece ser o comedimento do Banco
do Japão e do Ministério das
Finanças. Contenção como essa não se fará sentir nos EUA.
Assim, será que o Fed afogará
o mundo em dólares e nos permitirá despertar do pesadelo?
A resposta é não.
Assim que a inflação retornar, o Fed terá de vender ativos
para sugar o dinheiro excedente que criou contra a deflação.
Já o governo precisará reduzir
seu déficit a dimensões passíveis de financiamento pelos
mercados. De outra forma, as
expectativas deflacionárias podem rapidamente se tornar expectativas de inflação.
Ironicamente, chegamos ao
presente em parte porque o
Fed tinha tanto medo da deflação há seis anos. Uma bolha de
crédito mais tarde, Bernanke
precisa enfrentar aquilo que
então temia, em larga medida
devido aos esforços de prevenção do Fed. Perigos semelhantes surgirão em breve, com as
medidas drásticas que parecem
cada vez mais prováveis.
Desta vez, suspeito, o resultado final não será deflação,
mas inflação inesperadamente
alta, ainda que daqui a muitos
anos.
Tradução de PAULO MIGLIACCI
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