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Presidente propõe "agenda da esperança"
DO ENVIADO ESPECIAL A MADRI
O presidente Fernando Henrique Cardoso usou ontem a tribuna da cúpula União Européia/América Latina e Caribe para propor trocar o medo ao terrorismo
pelo que chamou de "agenda da
esperança".
Depois de afirmar que compreende "as reações, mais que justificadas, às ameaças do terrorismo e do uso de armas de destruição em massa", o presidente cobrou: "Mas não queremos que,
movidas pelo medo, as potências
substituam a agenda da esperança
-o comércio aberto, uma nova
arquitetura financeira, a luta contra a pobreza e a exclusão social e
cultural- pela obsessão única
com o tema da segurança".
Todo o discurso é uma crítica
aos Estados Unidos, embora o
nome do país não tenha sido citado uma única vez.
Mas o presidente brasileiro cobrou da União Européia uma
aproximação com a América Latina-Caribe, para "a configuração
da ordem internacional no século
21, que desejamos seja uma ordem plural, policêntrica, sem monopólios do poder ou da riqueza".
Trata-se da mesma crítica feita
por FHC ao unilateralismo norte-americano em seu discurso de outubro na Assembléia Nacional da
França, aplaudido ecumenicamente pela esquerda e pela direita
locais, mas que provocou irritação no governo Bush.
Tanto o discurso teve como alvo
os Estados Unidos que FHC voltou a citar, tal como o fizera em
Paris, iniciativas unilaterais norte-americanas que ferem a cooperação internacional.
Mencionou o Protocolo de Kioto, destinado a conter as emissões
de gases que produzem o efeito-estufa do qual a administração
Bush se recusa a participar.
Citou igualmente o Tribunal Penal Internacional, uma iniciativa
destinada a fortalecer "a cooperação pelos direitos humanos", que
os EUA também decidiram não
aceitar. É verdade que, na hora de
ler o texto, FHC suprimiu tais
menções, mas, como o discurso já
estava distribuído, a praxe diplomático diz que é dado como pronunciado na íntegra.
Corolário inevitável: um apelo à
"participação ativa da Europa"
para construir um sistema internacional "mais solidário, mais representativo e, por isso mesmo,
mais legítimo e eficaz".
Mas o discurso foi igualmente,
tal como prometido na véspera,
um ataque ao protecionismo, capítulo em que a Europa e os Estados Unidos se igualam, assim como outros países ricos.
"Há preocupação quanto à sinceridade do compromisso da comunidade internacional com o livre-comércio e com a construção
de uma ordem favorável ao progresso de todos", disse.
Emendou: "Há uma percepção
de que o protecionismo foi condenado como instrumento de desenvolvimento dos mais pobres
apenas para converter-se em instrumento de defesa dos privilégios dos mais ricos".
Citou as inúmeras barreiras às
exportações dos países em desenvolvimento, que considerou um
"mecanismo de congelamento
das desigualdades".
FHC insistiu em um de seus temas favoritos, a assimetria no
processo de globalização, que favorece os mais ricos.
O presidente criticou a perspectiva de "um sistema internacional
no qual a melhor forma de ser
competitivo seria, pura e simplesmente, ser rico".
FHC reconheceu que, nos três
anos transcorridos desde a cúpula
anterior, realizada no Rio de Janeiro, houve "o aprofundamento
de um sentimento de mal-estar
com o processo de globalização."
O presidente dedicou dois parágrafos de seu discurso à questão
da democracia. "Na América Latina, episódios recentes mostraram
o quanto permanece viva a ameaça golpista. Mas mostraram também a força das instituições democráticas", em óbvia alusão à
tentativa de golpe contra o presidente venezuelano Hugo Chávez,
abortada em 48 horas.
Acrescentou FHC: "No próprio
continente europeu, berço da
idéia antiga e moderna de democracia, surpreendemo-nos com
manifestações de extremismo e
intolerância".
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