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ARTIGO
Os baixos padrões dos Estados Unidos
PAUL KRUGMAN
O título original deste artigo era "America's Poor Standards", um trocadilho, em inglês, com o nome da
agência de classificação de risco
Na terça-feira , a Standard & Poor's, uma agência
privada de classificação de risco, anunciou que tomaria uma medida sem precedentes. Tentaria impor normas contábeis substancialmente mais severas do que as requeridas pelo governo federal dos Estados Unidos. Em lugar de
tomar os relatórios das empresas por seu valor de face, a Standard
& Poor's corrigirá os números a fim de eliminar o que considera
tratamento pouco apropriado de despesas "extraordinárias", receitas de fundos de pensão e, acima de tudo, opções de ações -uma parte ponderável da remuneração
dos executivos que, de alguma maneira, sob os padrões federais,
não precisa ser considerada como uma despesa de negócios. A estimativa de "receita corrigida" da Standard & Poor's para as 500 maiores empresas dos Estados Unidos reduz-lhes os lucros reportados em espantosos 25%.
Por que a Standard & Poor's
-como Warren Buffett, Alan
Greenspan e quase todos os demais economistas financeiros sérios- acredita que as normas
contábeis atualmente em vigor
exigem uma séria reforma? E, se
essa reforma é necessária, por que
o governo não a está realizando?
Por que a Standard & Poor's considera que deve executar o trabalho por conta própria?
Para entender o absurdo das regras atuais, basta considerar as
opções de ações. Um executivo
tem o direito de adquirir ações de
sua empresa, a um preço predeterminado, em algum momento
do futuro. Se as ações subirem, ele
as estará comprando a preço de
banana. Se caírem, ele não exerce
sua opção. Na pior das hipóteses
ele não perde coisa alguma; na
melhor, ganha muito dinheiro.
No entanto, de acordo com as
normas contábeis aceitas pelo governo federal, esse tipo de transação tem custo zero para os empregadores, desde que o preço de garantia das ações não esteja abaixo
do preço de mercado das ações no
dia em que a opção for concedida.
Evidentemente, isso ignora o aspecto de "cara eu ganho, coroa
você perde": os executivos recebem uma parcela dos ganhos dos
investidores caso as coisas transcorram bem, mas não compartilham dos prejuízos se elas derem
errado. As empresas literalmente
adotam um padrão duplo: deduzem o custo dessas opções de sua
receita tributável, embora neguem que elas tenham qualquer
custo em seus balanços.
Assim, como admitir que é sensato ignorar o custo das opções?
Os defensores do sistema atual argumentam que as opções de
ações fazem com que os interesses
dos executivos e os dos investidores se alinhem. Mesmo que isso
fosse verdade, não justificaria ignorar o custo, da mesma forma
que não faria sentido negar que
salários, o incentivo dado aos trabalhadores, são uma despesa operacional. Além do mais, tornou-se
claro agora que as opções de
ações, longe de induzirem os executivos a servir aos acionistas de
forma confiável, muitas vezes
criam incentivos perversos. Na
pior das hipóteses, recompensam
regiamente os administradores
que dirigem suas companhias para maximizar os ganhos de curto
prazo; os executivos da Enron e
de muitas outras empresas enriqueceram graças à alta dos preços
das ações de seus grupos, que
mais tarde desabaram.
As opções são apenas uma das
partes do sistema contábil que enfrenta grandes problemas. É evidente que uma séria reforma é necessária. E tenham em mente que
essa não é uma questão que possamos definir em termos de esquerda e direita; trata-se de proteger os investidores -os de classe
média e os mais prósperos igualmente- contra a exploração praticada por detentores de informações e poder decisório privilegiados. Assim, quem rejeitaria a necessidade de mudança?
Harvey Pitt, o advogado egresso
do setor de auditoria que comanda a Securities and Exchange
Commission (agência que fiscaliza os mercados de valores mobiliários), vem tentando retardar a
reforma. E o chefe dele, George
W. Bush, declarou-se adversário
de tratar as opções de ações como
despesa empresarial. Não seria interessante, só para variar, vermos
o governo Bush se opondo aos interesses de uma elite privilegiada?
Alguns políticos percebem o
problema. John McCain e Carl Levin apresentaram projetos de lei
de reforma dos padrões contábeis
norte-americanos. Mas parece
improvável que o governo tome
medidas rápidas para corrigir os
problemas de regras ineficientes.
Blitzer, da Standard & Poor's,
lembra que, em momentos passados de escândalo nas grandes empresas, "legisladores e promotores públicos assumiram a liderança em debelar as preocupações
públicas sobre os mercados". É
um comentário triste sobre a liderança atual que, desta vez, ele
acredite que lhe caiba cuidar do
trabalho por conta própria.
Paul Krugman, economista, é professor
na Universidade Princeton (EUA). Este
artigo foi originalmente publicado pelo
jornal "The New York Times".
Tradução de Paulo Migliacci
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