São Paulo, sábado, 18 de maio de 2002

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ANÁLISE

América Latina ainda é aposta arriscada para investidor dos EUA

JAKE KEAVENY
DA REUTERS, NOVA YORK

As empresas latino-americanas estão na fila para o há muito aguardado retorno de suas ofertas de ações no mercado dos EUA, mas aparentemente não conseguem evitar sua reputação como aposta de risco.
No começo deste ano, as baixas taxas de juros nos EUA e a estagnação das Bolsas começaram a conduzir os investidores de volta aos mercados emergentes, em busca de retornos mais elevados.
Meia dúzia de empresas latino-americanas revelaram planos para lançar ações em Bolsas de valores dos EUA, com a emissão de US$ 1,7 bilhão da mineradora brasileira Vale do Rio Doce, em março, servindo de abre-alas.
De lá para cá, no entanto, problemas políticos e econômicos causaram uma redução na demanda. Três dos quatro lançamentos de ações que deveriam ter sido realizados aparentemente foram cancelados, enquanto o quinto, o lançamento de títulos da companhia brasileira de água Sabesp, obteve resultados bem abaixo dos esperados.
No passado, dos investidores que costumavam correr aos mercados latino-americanos em busca de ganhos elevado, muitos saíam prejudicados pelos ciclos de expansão e contração.
A abordagem cautelosa que eles vêm empregando tem fundamentos firmes e leva em conta as realidades do investimento na região. A maior parte das empresas elogiadas como ótimos veículos de investimento na América Latina no começo e na metade dos anos 90 tiveram mau desempenho e as economias dos países em que estão sediadas também.
Das 60 ações de empresas latino-americanas que passaram a ser negociadas nos EUA e continuam cotadas nelas desde a década passada, apenas 11 obtiveram retornos positivos em termos de dólares, de acordo com a Dealogic LLC, uma empresa de pesquisa. A ação média desse grupo perdeu cerca de 30%.
Embora tenha havido alguns destaques positivos, como o desempenho sólido do mercado de ações do México, os riscos políticos e econômicos são graves em toda a América Latina.
É certo que hoje em dia um lançamento de ações a qualquer preço é considerado um sucesso. Os investidores se tornaram mais conservadores desde o estouro da bolha da tecnologia, em 2000, e transferiram sua atenção ao lançamento de ações de empresas estabelecidas e lucrativas.
A demanda por alternativas continua elevada, enquanto os investidores americanos enfrentam a estagnação de seus investimentos domésticos. Agora, depois de sofrer sérios abalos, as condições que geraram as altas passadas nos mercados de ações estão de volta: baixas taxas de juros nos EUA, retorno fraco das Bolsas de valores e sinais de uma virada na economia mundial.
Como resultado, os administradores de fundos estudam as ações estrangeiras baratas.
Embora os países asiáticos tenham apresentado o melhor desempenho entre os mercados emergentes, o dinheiro também começou a voltar à América Latina. Em fevereiro e março, os fundos especializados em América Latina acompanhados pela Lipper Inc. registraram um influxo líquido de US$ 225 milhões, mais dinheiro novo do que nos dois anos anteriores combinados.
Até agora este ano, o fundo brasileiro da iShares teve alta de 800%, para US$ 238 milhões, enquanto o mexicano cresceu em 500%, para US$ 209 milhões.
Os dois países são o principal foco dos investidores. As ações do México, cuja economia está muito ligada à dos EUA devido ao Acordo Norte-Americano de Livre Comércio (NAFTA), tiveram desempenho melhor do que as americanas nos últimos dois anos, e registram alta de mais de 10% este ano.
A despeito desses fatores positivos, a recepção aos lançamentos de novas ações tem sido gélida. Como resultado, não há novas empresas registradas para lançar títulos, e as atividades provavelmente não se animarão até que sejam conhecidos os resultados da eleição brasileira, em outubro, dizem os banqueiros.
Em janeiro, a Companhia de Concessões Rodoviárias, maior operadora de rodovias pagas brasileira, testou as águas com a colocação privada de US$ 127 milhões em ações, em março as ações da Vale do Rio Doce, a maior mineradora de ferro do Brasil, também atraíram forte demanda estrangeira.
A Sabesp, que opera o sistema de água em São Paulo, levantou US$ 207 milhões, cerca de um terço menos do que pretendia, e colocou apenas 36% de suas ações nos EUA e não a maioria, como planejara antes.
Se os investidores aprenderam alguma coisa desde aqueles dias foi escolher entre as empresas e países, em lugar de entender a América Latina como um elemento único dentro de uma classe de ativos.
Essa é uma das razões para que a moratória recorde da dívida externa argentina tenha exercido efeito modesto sobre o México, ou mesmo o Brasil.


Tradução de Paulo Migliacci


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