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São Paulo, domingo, 18 de maio de 2003

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SALTO NO ESCURO

Governo é obrigado a bancar aluguel de 77 geradoras que não funcionam por haver excesso de energia

Térmicas paradas geram perda de R$ 2,2 bi

TIAGO ORNAGHI
DA AGÊNCIA FOLHA

O governo federal gastará neste ano R$ 2,2 bilhões com o aluguel de 77 geradoras térmicas de energia elétrica que estão paradas, de acordo com documentos obtidos pela Agência Folha. Para comparação, o programa Fome Zero tem um orçamento previsto de R$ 1,8 bilhão neste ano.
O dinheiro virá do seguro-apagão, o ECE (Encargo de Capacidade Emergencial), uma taxa que passou a ser cobrada dos consumidores e repassada por concessionárias de energia do país para a CBEE (Comercializadora Brasileira de Energia Emergencial).
Os contratos foram firmados pelo governo Fernando Henrique Cardoso durante a crise energética de 2001 como medida de prevenção, pois não se sabia se o racionamento de energia -que durou de setembro de 2001 a fevereiro do ano passado- seria suficiente para evitar apagões.
Como eram contratos emergenciais, foram feitos sem licitação.
As usinas só ficaram prontas para operar depois do fim do racionamento. Hoje, elas estão em condições de funcionamento, mas estão paradas porque "sobra" energia no Brasil.
Segundo números da Eletrobrás divulgados no último dia 5, o consumo de energia no país é hoje inferior ao nível pré-racionamento. Além disso, subiu o nível dos reservatórios das usinas hidrelétricas -principal fonte de energia do Brasil-, o que aumenta a oferta de energia.
O Ministério de Minas e Energia calcula que cerca de 6.000 MW de potência instalada deixem de ser comercializados no MAE (Mercado Atacadista de Energia Elétricas), o que indica que várias usinas "não-emergenciais" estão operando abaixo de sua potência total. Juntas, as 77 geradoras emergenciais somam 2.439,49 MW de potência instalada.

Ação no TCU
Quando os contratos de emergência foram firmados, o governo Fernando Henrique Cardoso preferiu fechar acordos de longa duração, com vigências até 2004 ou 2005, alegando razões de "segurança energética nacional".
O governo Fernando Henrique Cardoso argumentou que precisava de uma fonte de energia elétrica a que se pudesse recorrer no caso de a crise se agravar -o que não aconteceu.
No último dia 8, a FNE (Federação Nacional dos Engenheiros) entrou com recurso no TCU (Tribunal de Contas da União) em que pedia que o tribunal reavaliasse decisão tomada pelo órgão, em 10 de abril, a favor da manutenção dos contratos.
A FNE pediu, no recurso (ainda não julgado), que o TCU avalie a possibilidade de rescindir os contratos, por considerar que sua manutenção é desnecessária e que os valores são abusivos.
De acordo com o diretor da FNE, Carlos Augusto Ramos Kirchner, o governo pode adotar regras de rescisão contratual previstas na lei nš 8.666, a Lei de Licitações, que possibilitam ao Estado extinguir um contrato feito de forma emergencial quando deixa de haver motivo para mantê-lo.
Kirchner diz que a CBEE -órgão que foi criado durante a crise de 2001- já deveria ter rescindido os contratos. A CBEE diz que cabe ao TCU analisar a possibilidade de rompimento dos contratos (leia texto nesta página).
A CBEE tem como função administrar os recursos obtidos com o seguro-apagão (ECE).
Foi por meio da CBEE que o governo assinou os contratos com os PIE (Produtores Independentes de Energia) para garantir que usinas térmicas fossem instaladas em caráter emergencial nos Estados mais atingidos pelo apagão.

Valores
A produção de energia elétrica por meio de usinas térmicas é mais cara do que a de hidrelétricas. A vantagem é que o combustível pode ser armazenado e usado em casos especiais, por exemplo, numa estiagem -quando recua a capacidade das usinas hidrelétricas.
Os PIE administram 77 térmicas espalhadas por 13 Estados. Todas as térmicas pertencem a 26 empresas.
Os contratos com as 26 empresas somam R$ 15.888.858.640,16 -o que daria um gasto de cerca de R$ 4 bilhões anuais, já que os contratos são na maioria de quatro anos.
Mas alguns contratos deixaram de ser pagos neste ano, por estarem sendo revistos. Neste ano, somente até março, já foram gastos R$ 511.352.774,62. Em 2002, o gasto foi de R$ 512.328.663,33.
Em Sergipe, uma empresa geradora foi contratada para a instalação de 60 MW em Aracaju.
Pelo contrato, a empresa receberá ao longo de quatro anos R$ 504.455.103,61 -ou seja, mais de R$ 8,4 milhões por megawatt.
Mas a mesma empresa tem outros seis contratos em vigência com o governo, totalizando um valor de R$ 3.297.563.614,35 pela instalação de 368 MW.
Em média, o megawatt instalado neste caso terá custado para o governo, ao final da vigência do contrato de quatro anos, mais de R$ 8,9 milhões.
De acordo com Kirchner, da FNE, com o mesmo dinheiro, o governo poderia construir uma termelétrica nova com a mesma capacidade.



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