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OPINIÃO ECONÔMICA
A responsabilidade de quem manda
BENJAMIN STEINBRUCH
Quando um grande avião
entra em zona de turbulência, o comportamento dos passageiros muda completamente. Todos apertam os cintos, ficam quietos e ouvem atentamente as instruções do comandante de olhos
pregados nos avisos luminosos.
Muitos rezam. Os comandantes
do avião, porém, mantêm os procedimentos de praxe e cumprem à
risca os manuais.
Ocorre o mesmo na economia
quando o mercado financeiro entra em turbulência. Nos últimos
dias, os olhos de quem acompanha a economia voltaram a se fixar nos indicadores do mercado
financeiro mundial, que oscilaram de forma absurda, sem muitas explicações convincentes.
O tema dos juros é outra vez
inevitável. A coincidência de publicar este artigo sempre às terças-feiras coloca-me na obrigação de
escrever, uma vez por mês, sob a
expectativa da decisão do Copom
(Comitê de Política Monetária do
Banco Central), que vai fixar
amanhã a taxa de juros básica da
economia para os próximos 30
dias.
Como os pilotos de avião, os comandantes da política monetária
não podem se deixar guiar por
turbulências passageiras. Sua
obrigação é seguir os manuais,
manter a rota e jamais deixar
passar sensação de insegurança a
tripulantes e passageiros.
Nada ocorreu nos últimos dias
que impeça o Banco Central de
continuar sua já tímida política
de redução de juros. A economia
mundial continua fortemente
aquecida, e a inflação americana
surpreendeu favoravelmente na
última sexta-feira, apesar do efeito petróleo; os juros ainda não subiram nos EUA, a despeito das
previsões que apontam nessa direção; as exportações brasileiras
continuam em ritmo forte e indicam um superávit de US$ 25 bilhões para este ano; há superávit
na conta corrente externa; a produção industrial interna está em
recuperação; a inflação brasileira
mantém-se sob controle; persiste
o superávit fiscal do governo, e até
as taxas de desemprego começam
a mostrar tendência favorável.
Apesar disso tudo, os juros reais
projetados continuam exageradamente altos se forem consideradas as previsões de inflação em
queda. Seria desastroso se o Banco Central passasse ao mercado,
em sua decisão de amanhã, a sensação de que os pilotos da política
monetária estão inseguros. Como
disse Lula, não há nada pior para
um governo do que o medo premeditado.
A continuidade da redução dos
juros, ainda que em doses homeopáticas, é um importante sinalizador para os investimentos produtivos, que precisam urgentemente aumentar. A tradicional
revista britânica "The Economist", observadora atenta das
tendências mundiais, chamou a
atenção na semana passada para
uma "ironia" brasileira. "O governo de Luiz Inácio Lula da Silva, cujo partido de esquerda abomina os especuladores financeiros, tem trabalhado mais para
agradar aos investidores de curto
prazo do que aos de longo prazo."
A observação é correta. Foi exatamente o que se deu no primeiro
ano do governo Lula, sob o argumento de que a nova administração precisava aplicar um choque
de credibilidade. Agora, diz a revista, o Brasil precisa de um segundo choque de credibilidade,
para convencer os céticos de que
esse governo quer ter uma economia saudável, que ofereça rentabilidade aos investidores de longo
prazo.
Nenhum investidor, nem interno nem externo, se anima a fazer
investimentos produtivos de longo prazo em economias que não
crescem. É muito importante ter
os fundamentos da economia
exemplares, sem déficit público,
com inflação baixa e indicadores
decrescentes de endividamento.
Mas isso não vale nada se a economia está estagnada ou apresenta crescimento pífio, como
ocorreu nos últimos dez anos. O
investidor de longo prazo quer saber se o mercado vai crescer e se
apresenta condições de oferecer
oportunidades de lucros. Vide
China.
A queda dos juros é peça chave
para destravar definitivamente a
economia. Desculpe voltar a esse
tema. Mas seria omissão fixar os
olhos unicamente nas turbulências e esquecer de observar que o
Banco Central tem mais uma vez
amanhã a obrigação de agir com
responsabilidade num momento
crucial em que o país precisa desesperadamente de investimentos, produção e, claro, empregos.
Benjamin Steinbruch, 50, empresário,
é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional e presidente do conselho de administração da empresa.
E-mail - bvictoria@psi.com.br
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