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LUÍS NASSIF
O gigante e o áulico
Há quem se surpreenda,
ainda hoje, com a diferença entre a imagem pública
e a imagem privada das pessoas -como se os maiores não
fossem eles, também, humanos. Esse descompasso é tema
recorrente na história mundial. No caso brasileiro, não
há personagem contemporâneo mais intrigante que o ministro das Relações Exteriores,
Celso Amorim.
Mesmo sem acompanhar o
dia-a-dia do Itamaraty, ouso
dizer que é o mais brilhante
diplomata da sua geração.
Não há nenhum grande feito
diplomático da história recente do país que não tenha tido
sua participação muitas vezes
decisiva.
Foi o caso da vitória sobre as
patentes de remédios, um trabalho do ex-ministro da Saúde José Serra, que contou com
sua participação decisiva no
campo diplomático e do convencimento da opinião pública norte-americana. Do mesmo modo, foi decisiva sua participação nas negociações no
âmbito da OMC (Organização
Mundial do Comércio) que resultaram na condenação dos
Estados Unidos no caso do soja e do algodão, dando o apoio
diplomático de que necessitava Pedro de Camargo Neto, do
Ministério da Agricultura.
Tudo isso antes de se tornar
chanceler. Indicado para o
cargo, em pouco tempo organizou o grupo dos 22 e assumiu papel central nas grandes
articulações diplomáticas internacionais, ampliando
enormemente a estratégia de
independência diplomática
adotada no governo Fernando
Henrique Cardoso.
No entanto, esse gigante da
diplomacia tem características comuns aos que vivem na
corte, de demonstrar uma
lealdade aos chefes um pouco
além do que recomendam as
normas de convivência entre
iguais.
O recente episódio de criar
um álibi conspiratório para a
questão da expulsão do correspondente do "New York Times" do país foi a demonstração mais flagrante de um estilo que já incomodava seus admiradores.
À medida que a poeira vai
baixando, fica-se sabendo que
a reação de Luiz Inácio Lula
da Silva ao episódio foi descontrolada. Virou uma espécie de "quem não está comigo
está contra mim". Houve os
que ficaram contra e, depois,
vieram a público defender a
medida como posição de governo -mas fazendo questão
de deixar claro sua contrariedade.
Houve os que ficaram a favor, inicialmente, até por falta
de informação adequada sobre as conseqüências do ato,
mas que evitaram defender
publicamente sua posição, por
considerar que seria jogar gasolina na fogueira, dificultando ainda mais uma saída honrosa para o governo.
A incrível tentativa de Amorim de conferir um caráter
épico à atitude de Lula, vindo
de uma pessoa de sua estatura
intelectual, acabou mais exposta ainda pelo contraste
com a personalidade do ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos. Em nenhum momento Bastos apoiou a medida, em nenhum momento deixou de trabalhar para encontrar a saída adequada ao país
e ao presidente.
Que o destino reserve a
Amorim inúmeras outras
oportunidades de continuar
servindo ao país com o brilhantismo com que sempre se
conduziu. E que essa sua característica pessoal não atrapalhe sua obra pública admirável.
E-mail -
Luisnassif@uol.com.br
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