São Paulo, segunda-feira, 19 de maio de 2008

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Fazenda e BC divergem sobre inflação

Sem considerar alimentos, Mantega calcula alta acumulada de 3% no IPCA em 12 meses; Meirelles prefere projetar índice de 6%

Fazenda diz que pressão vem de choque de oferta no exterior, e não de consumo forte no país, e defende aperto monetário mais suave

SHEILA D'AMORIM
VALDO CRUZ

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Na queda-de-braço travada entre o ministro Guido Mantega (Fazenda) e o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, por causa da trajetória de inflação, até mesmo a regra matemática de que dois mais dois são quatro é colocada sob dúvida. A partir do mesmo índice de preços, o IPCA, Meirelles e Mantega retiram o impacto da alta dos alimentos e vêem uma inflação completamente diferente. Com isso, traçam cenários opostos.
Nos cálculos de Mantega, retirando a alta do "feijãozinho" -que nesse caso representa o grupo alimentação e bebidas-, chega-se a uma inflação de 3,03% nos últimos 12 meses. Isso tem dado suporte à argumentação do ministro de que a pressão atual vem de um choque de oferta, puxado pelo comportamento dos preços no exterior, e não de um consumo excessivo no país.
Meirelles, do seu lado, gosta de tratar os números de outra forma. Por exemplo, exclui alimentos e preços administrados do IPCA e chega a uma inflação acumulada nos últimos 12 meses de 4,67%.
O presidente do BC prefere, porém, projetar a inflação no futuro, o que daria o dobro do previsto por Mantega, excluindo alimentos e preços administrados como energia e telefonia: 6,10% anualizados.
O número dá fôlego à defesa dele da atuação do Copom (Comitê de Política Monetária), que, em abril, iniciou um ciclo de alta das taxas de juros de tamanho e duração indefinidos, o que tem gerado apreensões e instabilidade no mercado financeiro.
A matemática do ministro da Fazenda considera o IPCA acumulado no período de 12 meses terminado em abril, abate a alta de 12,62% apenas dos alimentos e bebidas considerando o peso que esses itens têm no índice e chega aos 3,03%.
A do Banco Central contém vários cálculos. No acumulado de 12 meses, por exemplo, prefere excluir não só alimentos como preços administrados. No anualizado, a regra é também excluir esses itens do IPCA acumulado nos quatro primeiros meses deste ano e projetar o resultado no ano: chega aos 6,10%.
Se retirar desse mesmo período as 20% maiores altas e baixas e ainda diluir itens que têm um reajuste sempre naquele período, como educação, a inflação de Meirelles ainda chega a 4,62% anualizados.
Mantega e os técnicos da Fazenda argumentam ainda que itens como carne, leite e derivados, cereais, leguminosas e oleaginosas (em que estão classificados o feijão e o arroz) respondem pelo aumento de 1,32 ponto percentual na inflação total do período, que acumulou 5,04%.

Pão francês
Também destacam a alta de 23,1% do pão francês, que tem um peso de cerca de 1% no IPCA e contribuiu com 0,23 ponto percentual do índice, e a disparada do feijão-preto, que subiu 125%. Com isso, a Fazenda sustenta a tese de que o Brasil sofre o efeito de um choque de commodities agrícolas que se somou aos produtos energéticos (como petróleo) e minerais (cobre e ferro).
Mantega reconhece a necessidade de combater os efeitos secundários que essas elevações podem ter na economia. É o que pode fazer, por exemplo, com que a alta do aço, das tintas e dos plásticos impulsione uma onda de reajustes no setor automotivo, que já opera no limite da capacidade de produção.
No entanto, Mantega e sua equipe negam que isso já esteja ocorrendo, citam a inflação do setor de automóveis, que está em 2,29% nos últimos 12 meses, e defendem um aperto monetário mais brando.


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