São Paulo, terça, 19 de maio de 1998

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

OPINIÃO ECONÔMICA
As professoras e o impossível

BENJAMIM STEINBRUCH

É preciso inverter as prioridades. O Brasil já mostrou que sabe assumir decisões políticas, motivar lideranças e talento, reorganizar a economia, realizando o impossível. Foi assim na criação da URV e do Real, quando a sociedade avançou decidida a definir a estabilidade, para a criação do novo Brasil. É impossível, disseram os críticos. Não foi. A nação materializou o milagre. Agora é preciso repetir a dose, para que possamos apostar, realmente, no "setor gente", eliminando as chagas que os derrotistas continuam dizendo que são impossíveis de resolver.
A grande meta é a educação. Se avançarmos neste terreno será mais fácil resolver os dramas da saúde, da moradia e do emprego. A tarefa não pode ficar só na mão dos governantes. As empresas e as lideranças privadas precisam se engajar no grande combate. Os números mostram um grande descompasso entre o que se investe no ensino básico e o que se aplica nas universidades, inchadas por desacertos de toda a sorte. Os jovens que ali investem, não se conformam quando descobrem que o "canudo" recebido não vai se traduzir em oportunidades de emprego. Mais ainda, ficam perplexos ao ver como o ensino que receberam se distanciava da vida real, de um trabalho cada vez mais inacessível.
Os avanços tecnológicos e a competição criam, todos os dias, novas carreiras, sepultam outras, definem novas exigências para quem precisa trabalhar. É importante ajustar os currículos, para que o jovem se prepare para o mercado. A educação não pode ser apenas a transmissão de informações culturais, certamente necessária. É preciso que o conceito de instrução esteja presente, orientando os alunos para a vida diária e para o uso dos seus direitos de cidadania. Algumas ações neste sentido já estão em andamento. Aqui vão mais duas propostas para debate:
1) estimular as empresas a se engajarem nesta nova etapa do ensino, criando escolas nas comunidades em que atuam, voltadas para o ensino básico e as lições de vida prática. A guerra fiscal que já existe -e é legítima- para atrair investimentos, deveria ser estendida, em parte, para a educação. Essas escolas teriam na porta os nomes das empresas que zelariam para que o ensino tivesse o mesmo nível de excelência dos seus produtos e serviços;
2) outra idéia. Para as escolas, custeadas e dirigidas por Estados e municípios com repasses do Orçamento da União, exigir o mesmo ensino pragmático. Ao mesmo tempo estabelecer critérios objetivos e não políticos (que já existem) para uma avaliação permanente. Seriam, então, criados índices a serem atingidos e que dariam direito a um "bônus" extra, a ser incluído no Orçamento seguinte, para novos investimentos educacionais. Estaria assim criada uma espiral positiva: melhor desempenho, mais seriedade, mais verba, mais educação.
Ao redigir este artigo um amigo me fez recordar a professora primária que, desde o jardim-de-infância, ajudou a formar cidadãos pelo Brasil afora. Ela não se limitava a retirar a criança -e, por vezes, o adulto- do analfabetismo. Ao lado das taboadas e lições de leitura, a professorinha dava aulas de vida. Ensinava seus alunos a aprender a aprender. A se ajustar às coisas novas, a se integrar na família e na comunidade, preparando-os para o trabalho que era valorizado desde a infância.
Quantas vezes elas conquistaram o impossível?


Benjamin Steinbruch, 44, empresário, graduado em administração de empresas e marketing financeiro pela Fundação Getúlio Vargas (SP), é presidente dos conselhos de administração da Companhia Siderúrgica Nacional, da Metropolitana e da Vale do Rio Doce.
E-mail: bvictoria@psi.com.br



Texto Anterior | Próximo Texto | Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.