|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
LUIZ CARLOS BRESSER-PEREIRA
México e Mercosul
Não interessa ao Mercosul a
admissão de país que tem um
acordo com os EUA que o
transforma em dependente
O MINISTRO das Relações Exteriores do México esteve no
Brasil para advogar a admissão de seu país ao Mercosul na condição de membro associado. O governo brasileiro recebeu com natural frieza a demanda. Não interessa
ao Brasil e aos demais membros do
Mercosul a admissão de um país
que tem um acordo com os Estados
Unidos que o transforma em um dependente do país maior. Já temos
uma quantidade suficientemente
grande de problemas dentro do
Mercosul com os atuais membros,
aos quais se junta agora a Venezuela, para acrescentarmos um país
que há muito está dividido entre a
sua solidariedade cultural com a
América Latina e os interesses locais que implicam subordinação ao
vizinho do Norte.
O Mercosul é a iniciativa comercial mais importante que o Brasil
deve e pode levar adiante. A geopolítica continua fundamental. Os europeus, preocupados com a Europa,
construíram a União Européia. Os
japoneses e agora os chineses dão
absoluta prioridade aos países da
Ásia nas suas relações comerciais e
de investimento. Os próprios EUA,
que são uma potência mundial, celebraram a Nafta com seus dois vizinhos.
O Mercosul tem estado na berlinda nos últimos anos, principalmente porque essencialmente é até hoje
um acordo bilateral entre dois países, o Brasil e a Argentina. De um lado, esses países têm apresentado
uma grande instabilidade cambial,
que, naturalmente, dificulta qualquer acordo; de outro, o Brasil, que
vinha obtendo elevados superávits
comerciais com a Argentina, recusou-se durante um bom tempo a
aceitar que a Argentina pudesse
contar com salvaguardas para equilibrar o fluxo de comércio, a partir
da ficção de que o Mercosul é um
acordo multilateral, no qual o equilíbrio da balança comercial não precisa ocorrer bilateralmente, porque
acabaria ocorrendo no conjunto
dos países.
A essas dificuldades agora se
acrescenta um outro problema. Os
Estados Unidos, que não tiveram
êxito em fazer uma Alca nos termos
por eles pretendidos, adotaram a
estratégia de dividir para governar e
tenta fazer acordos bilaterais com o
Uruguai, como já fizeram com outros países latino-americanos fora
do Mercosul. O governo brasileiro
rejeitou a Alca nos termos americanos porque não era um acordo de livre comércio, mas um acordo para
limitar a capacidade dos países latino-americanos de fazerem uma política de desenvolvimento semelhante àquela que os Estados Unidos adotaram no passado (e, em
certos casos, adotam até hoje).
Na OMC (Organização Mundial
do Comércio), o problema é o mesmo. A Rodada Uruguai foi um desastre para os países em desenvolvimento porque criou uma série de
privilégios para os países ricos, como um abusivo sistema de proteção
à propriedade intelectual e fortes
obstáculos a uma política industrial. Agora, na Rodada Doha, os países ricos buscam resultado semelhante, mas os países em desenvolvimento estão mais atentos.
Existem entre nós aqueles que se
preocupam com o compromisso
dos governos brasileiros com o
Mercosul, a partir do raciocínio de
que, dessa forma, não fazemos todos os incontáveis acordos comerciais que o México já fez depois da
Nafta. Esses acordos, entretanto,
não ajudaram o México, que já enfrentou uma crise de balanço de pagamentos em 1994, depreciou o
câmbio então, que voltou a se apreciar em razão do acordo comercial.
E o país continua a apresentar taxas
de crescimento quase tão baixas
quanto o Brasil.
Em 1987, em plena crise da dívida
externa, enquanto ministro da Fazenda, propus a formação de um G3
-a reunião de Brasil, México e Argentina- para tratar em conjunto
do problema. A Argentina aderiu seriamente ao acordo, enquanto a adesão do México foi apenas formal e
provisória. Logo depois abandonou
a idéia e tratou de se entender com
os Estados Unidos. Quando, um ano
e meio depois, o Plano Brady foi adotado pelo governo americano seguindo a linha proposta pelo Brasil
de securitizar a dívida com desconto, o México foi o primeiro a fazer
um acordo Brady, mas aceitou um
desconto irrisório -desconto esse
que, naturalmente, impôs-se para os
demais países. Não interessa ao Brasil ter um país com essas limitações
e condicionantes no Mercosul.
LUIZ CARLOS BRESSER-PEREIRA , 71, professor da emérito Fundação Getulio Vargas, ex-ministro da Fazenda, da
Reforma do Estado, e da Ciência e Tecnologia, é autor de "
As Revoluções Utópicas dos Anos 60".
Internet: www.bresserpereira.org.br
lcbresser@uol.com.br
Texto Anterior: Saiba mais: Negócios com imóveis têm de ser declarados Próximo Texto: Folhainvest Fundo PIBB perde 23% com recente volatilidade Índice
|