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COMÉRCIO EXTERIOR
Franco Macri, presidente de grupo argentino, crê na expansão brasileira nos próximos anos
"Brasil crescerá mais que Argentina"
ANDRÉ SOLIANI
de Buenos Aires
O Brasil vai crescer mais do que
a Argentina nos próximos anos,
diz Franco Macri, presidente de
um dos maiores grupos empresariais argentinos.
O industrial, que pretende faturar US$ 2,4 bilhões em 99, demonstra na prática acreditar nas
suas previsões. Neste ano, diminuiu seus negócios no setor de alimentos na Argentina e aumentou
a participação no Brasil.
Macri, 69, afirma que na Argentina não existe acesso a financiamentos de longo prazo para empresas de capital nacional, justificando o fim dos seus negócios na
área de farináceos (bolachas e
pastas) no vizinho brasileiro.
"No Brasil, existe um forte
apoio ao empresariado local",
afirmou o industrial italiano, naturalizado argentino.
Hoje, 30% do faturamento do
grupo está no Brasil. Mas, em dois
anos, espera faturar no Brasil o
mesmo que na Argentina.
Na semana passada, o grupo
Socma se desfez da Canale, dona
de 5,8% do mercado de biscoitos
na Argentina. Com a venda, Macri, que está no setor de correios,
estradas e frigoríficos, passou a faturar na Argentina cerca de US$
110 milhões com alimentos. Vendia antes US$ 340 milhões.
Dentro da estratégia de aumentar a presença no Brasil, adquiriu
neste ano o frigorífico de carne
suína e de frango Chapecó e a
marca de macarrão Adria. Já possuía a Abet (chocolate e biscoitos), a Basilar e a Isabela (ambas
pastas). Hoje, fatura, no Brasil,
cerca de US$ 250 milhões no setor.
A seguir leia trechos da entrevista que deu à Folha.
Folha - O senhor é presidente
de um dos poucos grupos argentinos que ainda estão na
mão do capital nacional. Qual o
segredo?
Franco Macri - Desde a criação
do Mercosul, estou tratando de
me transformar num empresário
do Mercosul.
Nosso projeto para os próximos
dois anos é chegar a um faturamento de US$ 5 bilhões, metade
no Brasil, metade na Argentina.
No Brasil, estamos muito presentes no setor de alimentos. Produzimos bolachas e macarrão.
Em macarrão, somos o primeiro
fabricante do Mercosul e o quarto
mundial.
Na Argentina vendemos as empresa de alimentos que tínhamos.
Neste momento, não há condições para uma empresa nacional
investir na Argentina. Não conseguimos competir com as multinacionais instaladas no país.
Folha - O governo argentino
não oferece condições para o
produtor nacional?
Macri - Para novos investimentos não existem condições. Precisávamos construir mais fábricas e
de financiamento de longo prazo,
com taxas de juros internacionais.
Na Argentina não há acesso a crédito para o capital nacional.
Folha - No Brasil existe?
Macri - No Brasil, nossa posição
em alimentos, em farináceos, está
crescendo. Possuímos a marca
Adria e temos muito respaldo dos
bancos brasileiros.
No Brasil, há uma grande diferença com relação à Argentina:
existe um forte apoio ao empresariado local.
Existe um nacionalismo saudável. Igual a todos os países progressistas do mundo.
Folha - O senhor se sente um
investidor estrangeiro?
Macri - Eu me sinto brasileiro,
não me sinto um investidor estrangeiro. Tenho três nacionalidades: italiano de nascimento e,
como empresário, argentino e
brasileiro. Mas pretendo ter como
nacionalidade o Mercosul.
Folha - A desvalorização do
real colaborou para a estratégia
de expansão no Brasil?
Macri - Outra atividade importante que temos no Brasil é no setor de carnes. Compramos o frigorífico Chapecó e estamos negociando a compra de outro muito
importante. No setor de frigoríficos, a desvalorização do real é
muito positiva, pois é um segmento altamente exportador.
No setor de consumo interno,
não. A desvalorização é uma desvantagem, pois se perdeu rentabilidade e é preciso compensar a diferença cambial dos investimentos que fizemos em dólar.
Folha - Mas o senhor acha a
desvalorização boa ou ruim?
Macri - A verdade é que a desvalorização brasileira era necessária
e teve muito êxito. A economia
brasileira está em moeda local,
como qualquer outro país desenvolvido.
A Argentina está mentalmente
dolarizada. Se desvalorizar o peso, imediatamente os custos internos aumentam mais que a desvalorização. Por isso, a força da
Argentina é o mecanismo de conversibilidade. A fortaleza brasileira é o poder de deixar flutuar o
câmbio.
Folha - O senhor acha que a
Argentina conseguirá crescer
mantendo a conversibilidade?
Macri - Na Argentina, o crescimento depende de uma boa gestão do próximo governo. O governo precisa fixar políticas industriais ativas para aumentar a
produção industrial e aumentar o
PIB (total de riquezas no país).
Folha - A Argentina fez um
abertura econômica pouco racional?
Macri - A abertura argentina
era, filosoficamente, mais do que
necessária. Era um país protegido
e a proteção não permitiu a existência de indústrias saudáveis.
Mas devia ter sido feita uma
ação paralela de políticas, que
permitissem ao empresariado se
estruturar, produzir e exportar. E,
depois, abrir totalmente.
Folha - Em que outros negócios no Brasil o grupo Socma
gostaria de entrar?
Macri - Nos associamos com o
Bradesco para nos apresentarmos
nas privatizações de rodovias federais. Estamos de olho nas privatização de empresas de fornecimento de água e vamos nos preparar para competir na privatização dos correios.
Folha - O senhor pretende
usar as plantas de produção de
farináceos no Brasil para exportar para a Argentina?
Macri - Não. Na parte de frigoríficos, vamos ter fábricas nos dois
países. No Brasil, suínos e frangos. Na Argentina, de carne de vaca. Mas será uma única organização. Para farináceos, voltaremos
para Argentina com uma fábrica.
A nova marca para a Argentina
será a Adria, que vamos tratar de
colocar em todo o Mercosul.
Com essa marca, vamos competir com as multinacionais. Podemos esperar do governo brasileiro condições para competir
com igualdade com as multinacionais.
Folha - O governo brasileiro
prevê um crescimento de 4%
para 2000, e o Argentino, 3,5%.
O que o senhor acha disso?
Macri - O Brasil vai crescer muito acima das estimativas. A Argentina vai ter pelo menos esse
crescimento, entre 3% e 4%. Mas
não pode crescer mais.
Folha - O senhor parece mais
otimista com o Brasil.
Macri - Eu sou realista. Nosso
grupo tem um departamento de
análises. Vemos o Brasil crescendo mais do que a Argentina.
Brasil e Argentina deveriam sacrificar muitas coisas para crescer. Além de obter o respaldo
mundial, vai permitir chegar ao
pleno emprego.
Folha - Que tipo de sacrifícios
os países teriam que fazer?
Macri - Preferir usar recursos
para o crescimento do que usar
recursos em outros setores.
Quando os recursos são escassos,
alguns setores têm que se sacrificar. Nunca o crescimento. Em vez
de embelezar uma cidade, é melhor deixá-la feia e tornar mais eficiente uma fábrica.
Folha - A Argentina pode sair
algum dia da conversibilidade?
Macri - A Argentina não pode
sair da conversibilidade. Na formação da comunidade econômica latino-americana é possível
que os economistas descubram
que a conversibilidade pode ser,
para todos os países, a dolarização da região.
Folha - O senhor apostaria no
Brasil se a desvalorização não tivesse acontecido?
Macri - Não é uma aposta. É um
plano estratégico. Faria mesmo
sem a desvalorização. No longo
prazo, todas essas situações são
acidentes pontuais do caminho.
O importante é seguir crescendo.
Folha - Como o senhor analisa
a atual crise do Mercosul?
Macri - É ruim tomar decisões baseadas em interesses específicos.
Folha - O senhor apóia as medidas argentinas para calçados,
têxteis e papéis?
Macri - Não conheço o conflito e
não me meto. Mas análise que deve ser feita é a que faria uma consultora internacional, sem interesses específicos.
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