São Paulo, quarta-feira, 19 de setembro de 2007

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análise

Corte de meio ponto carecia de nota mais firme

DO "FINANCIAL TIMES"

MEIO PONTO percentual. Agora sabemos que o Federal Reserve sob Ben Bernanke é um banco central agressivo. Sua ação, em resposta a uma crise crescente no mercado da habitação e a substanciais perturbações nos mercados de crédito, pode se provar sábia. Mas o corte profundo de juros deveria ter sido acompanhado por um comunicado mais firme.
Sempre houve argumentos em defesa de um corte de juros de meio ponto. Ele será um estímulo poderoso para a economia real. As empresas poderão financiar sua expansão, e os consumidores com bons históricos de crédito poderão gastar mais. Isso deve ajudar a compensar impactos da desaceleração no mercado de habitação.
Além disso, um corte de meio ponto agirá como uma espécie de terapia de choque para os mercados de crédito, que atravessam sérias dificuldades. Ajudará a tornar mais atraentes todos os títulos lastreados por ativos e todas as obrigações de dívida caucionada questionáveis. Existem grandes chances de que a ação decidida do Fed restaure a confiança que os mercados perderam.
Mas a ação do banco central é perturbadora. Observe a reação dos mercados depois que ela foi anunciada: o índice S&P 500 estava sendo negociado acima de sua cotação em 7 de agosto, a data da reunião anterior do Fed, antes do início da compressão de crédito. Alguns ativos de risco, como moedas de países emergentes, subiram em direção às suas cotações mais elevadas. Mas dólar e papéis de longo prazo do Tesouro norte-americano caíram: são ativos sensíveis à inflação.
A ação do Fed tem seu custo. Ela cimentará uma percepção de que a instituição corta juros em resposta a crises de mercado, e isso encoraja a especulação. Também coloca em risco a credibilidade do banco central no combate à inflação. Em seu comunicado, o Fed afirma que "continuará a monitorar com cuidado os desdobramentos inflacionários". O Fed precisa esperar que os investidores e os negociadores de salários confiem nele.
Um dos maiores perigos é que uma política monetária frouxa solape a integridade do dólar. O déficit comercial americano é financiado por investidores estrangeiros dispostos a manter ativos e títulos nos EUA e, se eles temerem que a inflação vá destruir os valores desses ativos, começarão a vender. O corte de meio ponto no juro transformou a derrocada do dólar de altamente improvável em praticamente possível.
Se o Fed pretendia cortar os juros em meio ponto, deveria ter equilibrado essa atitude agressiva com um comunicado em que indicasse mais ceticismo sobre novos cortes nos juros de curto prazo. Mas optou por dizer que "agirá quando necessário para fomentar a estabilidade de preços e o crescimento econômico sustentável". Em determinado sentido, isso é só uma reafirmação da missão básica do banco central, mas, dadas as circunstâncias, haverá quem presuma que o Fed possa ser pressionando a cortar ainda mais os juros. A ação do Fed talvez seja uma saída de mestre, mas é tão arriscada quanto audaciosa.


Tradução de PAULO MIGLIACCI

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