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VINICIUS TORRES FREIRE
A festa nos EUA, o Brasil e dúvidas
Análise do efeito imediato do corte de juros tem de esperar ressaca da euforia; no médio prazo, incerteza continua
E O BRASIL com isso? O que sucede aos mercados brasileiros
depois da festa mundial das
Bolsas, embaladas pela superdose
de euforia financeira oferecida pelos
cortes de juros nos Estados Unidos?
Primeiro, a Bovespa pega carona
no trem da alegria americano até
quando, e se, o investidor em ações
nos EUA der um tempo e pensar nas
intenções do Fed e em novos dados.
Segundo, se o talho nos juros acalmar a finança do mundo rico, o dólar
tende a perder valor, a diferença entre juros brasileiros e americanos
cresce, a Bovespa tende a subir e tsunamis de dólares voltarão ao mercado brasileiro, valorizando o real.
Terceiro, se vier a calmaria, tudo
continua como dantes no Brasil.
Quarto, o "cálculo das probabilidades é uma pilhéria" (cortesia de
Manuel Bandeira). Ainda estão
quentes os debates sobre o futuro do
aperto do crédito nos EUA e na Europa, sobre o futuro de PIB e inflação americanos e o do dólar, ontem
em baixa recorde diante do euro.
Qual o problema? Ainda há paralisia ou escassez de crédito no sistema
financeiro americano e em parte do
europeu. Ainda há bancos, pequenos, quebrando, e prejuízos a checar
nos balanços das próximas semanas.
O Fed cortou ontem dois tipos de
taxas de juros. Baixou sua meta para
a taxa básica, a dos juros dos empréstimos entre bancos e uma espécie de referência, piso, para os juros
cobrados dos clientes. Por meio de
injeções ou retiradas de dinheiro do
sistema bancário, o Fed ajusta os juros de curto prazo à sua meta, o que
tende a regular expectativas do mercado a respeito de taxas de inflação e
dos juros de longo prazo na praça.
Ontem o Fed ainda cortou para
5,25% o juro do redesconto, a taxa
pela qual o BC ele mesmo empresta
a bancos em dificuldades. Logo depois do corte de meio ponto percentual, para 5,75%, em 17 de agosto, tal
oferta não teve muito apelo. A fim de
ajudar o Fed na sua campanha de
atenuar a má imagem do redesconto, bancões tomaram US$ 2 bilhões
nesse balcão estigmatizado (banco
que vai ao redesconto queima o filme). Na semana passada, o total desses empréstimos cresceu para US$ 7
bilhões. Há dificuldades por aí.
De janeiro até o início de agosto,
os textos do Fed repetiam que o núcleo da inflação inspirava cuidados,
pressionado pela alta do uso da capacidade produtiva. Quando o Fed
deu tento da crise, em 17 de agosto,
em meio ao pânico, não tratou de inflação e cortou o redesconto.
Agora, com redução forte nos juros, a inflação reaparece nos comunicados do Fed. O gesto de ontem teria sido apenas "psicoterapia" no
mercado, um corte só e pronto ("one
and done" foi uma das frases do
dia)? Não parece razoável.
Enfim, o Fed está mais preocupado com recessão ou inflação? A economia "real" anda devagar, mas por
ora sem drama. Mas ainda há aperto
de crédito, o preço do petróleo preocupa e a ruína imobiliária continua.
Mais, o corte de juros em tese só reanimaria o PIB daqui a um ano -e
meio ponto não bastaria. No mercado futuro dos EUA, estima-se outro
corte de juros básicos, dos 4,75% de
agora para 4,5% em outubro.
Em dois dias, Ben Bernanke, presidente do Fed, vai falar sobre crise
imobiliária para deputados. Outra
oportunidade para a hermenêutica
ou a leitura de cartas financeiras.
vinit@uol.com.br
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