São Paulo, sexta-feira, 19 de setembro de 2008

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VINICIUS TORRES FREIRE

O grande tutor do mercado


Governo dos EUA discute com o Congresso a compra de papéis podres em troca de ações de empresas a perigo

O GOVERNO americano joga a toalha. Discute pelo menos desde anteontem com o Congresso um modo de comprar os papéis podres de instituições financeiras em troca de ações dessas empresas, segundo o senador Charles Schumer, o único a dizê-lo ontem tão explicitamente em público. Ao final de uma reunião ontem à noite com líderes do Congresso, o presidente do Fed, Ben Bernanke, e o secretário do Tesouro, Hank Paulson, afirmaram que se discutiu uma "solução abrangente". Seria a criação de um grande tutor do mercado, a mãe de todas as "conservatorships", como o governo chamou a estatização das megafinanceiras imobiliárias?
Schumer começou a vazar a conversa no meio da tarde. Às 14h, a Bolsa de Nova York estava no chão. Depois das 16h, era só alegria.
Schumer disse que o objetivo das discussões é: 1) criar uma "solução abrangente e permanente", em vez de medidas descoordenadas e caso a caso (estatizações e socorros). Isto é, uma estatal; 2) tirar do Fed, o BC dos EUA, a tarefa de administrar a crise e as instituições quebradas, para que se concentre na política monetária.
Não ficou claro se outras duas idéias são apenas dos democratas ou são compartilhadas pelo governo.
Trata-se: 1) de que uma nova agência estatal compre papéis podres ou empreste dinheiro em troca de ações das empresas que não estivessem já à beira da morte, que também foi a sugestão de Paul Volcker, ex-presidente do Fed, e de Nicholas Brady e Lawrence Summers, ex-secretários do Tesouro; 2) que tal agência ajude a refinanciar e a baratear a prestação da casa própria do cidadão comum, que mais e mais fica inadimplente, o que deu origem à crise e ainda ajuda a agravá-la, embora a coisa tenha ido muito além das hipotecas. Tal solução foi sugerida faz seis meses por economistas como Alain Blinder, ex-vice do Fed, e Martin Feldstein. Bill Rhodes, vice do Conselho do Citi, acha que deve vir o pacote completo.
Enquanto os ativos podres (dívidas, seguros de dívida, derivativos de todo tipo) estiverem nos bancos, vários deles ainda quebrarão e outros ficarão com escasso capital para emprestar e mover a economia. De resto, como tem se visto nestes dias, o medo da falência do vizinho na prática congela o mercado de crédito interbancário mundial -ontem o pânico era menor que o de quarta-feira, mas parecido com o de terça.
Se for criado tal mamute, o grande tutor do mercado falido, trata-se de uma espécie de grande banco, quebrado de saída. Tal agência terá de ficar com os papéis podres até que recuperem valor ou vai leiloá-los logo?
Enquanto isso, os bancos teriam como prioridade pagar os empréstimos ao governo. O capital da agência, se criada nesses termos, teria de chegar à casa do trilhão de dólares.
Vai dar tempo de criar isso via Congresso? Será um pacote?
Nos últimos sete dias, o Fed emprestou US$ 128 bilhões em linhas de emergência para bancos e afins.
Ontem foram outros US$ 180 bilhões para BCs do mundo rico. O Tesouro fez US$ 60 bilhões em dívida para financiar o Fed. Mas o medo pouco cedeu no mercado de crédito.
Dinheiro vazava dos fundos de investimento de varejo (também se discutia ontem a criação de um fundo garantidor dessas aplicações).

vinit@uol.com.br


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