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São Paulo, domingo, 19 de outubro de 2003

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Dólar perde o encanto para os investidores

GIULIANO GUANDALINI
DA REDAÇÃO

O dólar já não é mais o mesmo. A moeda passa por um declínio considerado até aqui desejável e suave, mas que, para muitos, corre o risco de se transformar em um tombo brusco, que mergulharia os mercados mundiais no caos. De resto, o dólar poderia ver abalado seu papel de reserva de valor e referência internacional.
Desde o início do ano passado, o dólar já perdeu quase 20% de seu valor, na comparação com uma cesta de moedas dos principais parceiros comerciais dos EUA, segundo o banco de investimentos Merrill Lynch. Para os analistas do banco, a moeda cairá mais 10% até o final do ano que vem.
A fragilização do dólar ocorre porque os investidores internacionais reduziram drasticamente seu apetite por ativos denominados na moeda norte-americana, sejam títulos ou ações. A desvalorização só não é maior porque países asiáticos manipulam o câmbio, comprando dólares e enfraquecendo suas moedas, para não perder competitividade.
"A demanda privada por títulos em dólares está em queda. O que sustenta a moeda é o setor público", diz Gustavo Loyola, sócio da consultoria Tendências e ex-presidente do Banco Central. Por "setor público" leia-se BCs asiáticos. "O setor privado não quer aumentar sua exposição ao dólar."
Como, pelo menos no médio prazo, os EUA continuarão a sentir os efeitos dos déficits gêmeos (nas contas externas e internas), a tendência é o dólar perder ainda mais valor. Assim os ativos em dólar devem se desvalorizar, o que os torna menos atraentes. Daí a fuga dos investidores.
A desvalorização do dólar torna mais caros os produtos asiáticos. Assim, países como o Japão e a China artificialmente mantêm suas moedas depreciadas, comprando dólares.
Segundo Martin Wolf, colunista do "Financial Times", as reservas mundiais em moeda estrangeira cresceram US$ 870 bilhões entre o final de 1999 e junho deste ano. Do total, US$ 665 bilhões foram acumulados na Ásia.
Até o início do ano passado, os EUA conseguiam financiar seu enorme déficit comercial graças ao maciço ingresso de investimentos externos. Mas essa fonte de recursos secou, e o euro já atrai mais investidores do que o dólar.
Segundo o BIS (Banco de Compensações Internacionais), a emissão de títulos denominados em euro alcançou a marca recorde de 226,3 bilhões no primeiro trimestre do ano. No mesmo período, as emissões em dólares ficaram em US$ 95,6 bilhões.
No ano passado, quando o dólar começou a cair, já havia ocorrido uma supremacia da moeda européia ( 523,4 bilhões contra US$ 421,8 bilhões). Em 2001, o dólar ainda captava mais (US$ 651,9 bilhões ante 597,3 bilhões).
"Tanto à esquerda como à direita, há quem acredite que o dólar pode desabar", afirma Antonio Carlos Macedo e Silva, do Instituto de Economia da Unicamp.
Uma queda acentuada, como disse o economista Paul Krugman em sua coluna no "New York Times", poderia lançar os EUA no caos. As taxas de juros teriam que ir às alturas para que o governo evitasse a total seca de crédito.



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