São Paulo, domingo, 19 de outubro de 2008

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Para ministro, analistas estão errados

Mantega mantém previsão de crescimento entre 4% e 4,5% para 2009, bem acima das estimativas de economistas

"Sempre pensamos em cortar gastos de custeio que não são essenciais; o que não podemos cortar são os programas do PAC"

Ueslei Marcelino - 1º.out.08/Folha Imagem
Mantega (Fazenda), para quem o Brasil não deve pôr o pé no freio

GUILHERME BARROS
COLUNISTA DA FOLHA

O governo está disposto a ampliar os gastos para não deixar que o país se desacelere demais com a crise global.
O ministro da Fazenda, Guido Mantega, é enfático ao afirmar que o Brasil não deve colocar o pé no freio.
"Temos condições de passar por esta crise mantendo um padrão bastante razoável de crescimento", diz Mantega, que mantém a previsão de crescimento de 4% a 4,5% para 2009.
O ministro não se impressiona com as previsões bem menos otimistas por parte de muitos economistas. De acordo com o último Boletim Focus do Banco Central, os economistas prevêem crescimento de 3,5% para o ano que vem. Mantega diz que eles têm errado sistematicamente suas previsões. "Deviam tomar um Prozac para ver se melhoram."

 

FOLHA - O governo não está sendo otimista demais quando prevê crescimento de 4% ou até 4,5% para o ano que vem?
GUIDO MANTEGA - Quem está pessimista são os outros países. São os analistas dos Estados Unidos, da Europa e do Japão. Esses sim estão pessimistas, e até têm razão para isso. Vai haver mesmo uma retração da atividade mundial. Não tenho a menor dúvida, mas os países emergentes têm condições de passar pela turbulência com desempenho muito melhor do que aqueles que estão no epicentro da crise. É claro que não estamos a salvo da crise, que vamos sofrer conseqüências, principalmente nesta segunda fase, depois do dia 15 de setembro [dia em que quebrou o Lehman Brothers]. Desde essa data, as coisas mudaram e passamos a sofrer mais. Mas, mesmo assim, ainda não vejo necessidade de revermos nossas projeções. Para que vamos nos antecipar? Vamos deixar as coisas se definirem melhor.

FOLHA - Mas já há alguns sinais de retração na economia.
MANTEGA - Até agora, o que aconteceu? A pesquisa mensal de comércio mostra crescimento de 9,8%. Estão sendo criados mais de 2 milhões de empregos formais, o que significa mais renda e mais consumo. A arrecadação da Receita Federal se mantém dentro das nossas projeções. Até agora, de relevante, o que aconteceu foi um problema de liquidez.
A economia estava crescendo 6% e vai baixar, claro, mas já estava prevista essa desaceleração. Se ela será menor ou maior, não posso dizer nada. Estamos numa fase mais aguda da crise. Vamos esperar mais um pouco para ver se a crise se resolve no plano internacional. Não vou me precipitar.
O que posso dizer é que o Brasil está muito mais preparado, como nunca esteve, para enfrentar uma crise dessa magnitude, sem sofrer conseqüências devastadoras, como já sofremos no passado. Esta crise é maior do que a da Ásia, a da Rússia, a do México e de outras, mas, até agora, não provocou as mesmas conseqüências.
Temos reservas externas, reservas internas [compulsório] e o nível de atividade é maior. O Brasil tem um mercado interno que poucos países têm. Os efeitos da crise serão diferentes para o Brasil e estamos aqui para minimizá-los.

FOLHA - Muitos economistas apostam em crescimento de, no máximo, 3,5% para 2009. O sr. concorda?
MANTEGA - Não posso seguir os conselhos desses eternos conselheiros do mercado que dizem: "Ah, vamos pôr o pé no freio"; "Ah, não vamos crescer mais". Esse pessoal é deprimido ou é pessimista. São os eternos pessimistas.
Se você pegar as projeções desses cidadãos, desses analistas que ganham muito mais do que eu para fazer projeções erradas, eles têm se equivocado sistematicamente. Em 2006, erraram. Erraram também em 2007 e, felizmente para nós, vão errar em 2008 e em 2009.
Deviam tomar um Prozac para ver se melhoram. Em 2007, nenhum desses analistas disse que o Brasil ia crescer 5% -cresceu 5,4%. Diziam 3%, 3,5%, no máximo. Agora, esses analistas dizem que a economia vai crescer 2%, 1% ou até zero em 2009. Eles estão totalmente equivocados. Mais uma vez vamos mostrar que eles estão errados. Vamos aguardar para ver o tamanho da encrenca da economia internacional, mas nós temos antídotos.

FOLHA - Quais antídotos?
MANTEGA - Se diminuir o mercado externo, e certamente vai diminuir, o mercado interno pode substituí-lo em parte. Há compensações. O sistema se ajusta. O fato de ter câmbio flutuante é muito bom numa hora dessas. O governo tomará medidas anticíclicas e não deixará a peteca cair.
Vamos aproveitar o mercado interno. Temos uma demanda tão forte que, se ela cair uns 10% a 15%, ainda teremos uma demanda suficiente para crescermos 4% a 4,5%. Temos condições de passar por esta crise mantendo um padrão bastante razoável de crescimento econômico. Não temos os problemas que os Estados Unidos têm.

FOLHA - Quais medidas anticíclicas o governo pode tomar?
MANTEGA - Não colocar o pé no freio, mas tentar manter o nível de investimento público e privado; o BNDES, por exemplo, continuar com um volume de recursos para financiar os investimentos de longo prazo; continuar implantando a infra-estrutura e manter o PAC.

FOLHA - Há idéia de cortar gastos públicos?
MANTEGA - Sempre pensamos em cortar gastos de custeio que não são essenciais. O que não podemos pensar em cortar são os investimentos e os programas do PAC.
Não há nenhum programa de redução de gastos dessa natureza. Também não pensamos em reduzir as despesas com os programas sociais. Quem vai puxar o crescimento seremos nós. Nós temos condições para isso.


Texto Anterior: Fabio Giambiagi: Equívocos sobre a questão fiscal
Próximo Texto: Bush convoca cúpula global de líderes contra a crise
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.