|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
"RISCO-PAÍS"
Segundo pesquisa, mais de mil novas firmas foram abertas no ano passado com o objetivo de lesar clientes e fornecedoras
Brasil ganha 3 empresas golpistas por dia
ADRIANA MATTOS
DA REPORTAGEM LOCAL
No ano passado, por quase 40
dias, uma companhia prestadora
de serviços se apossou de diversas
peças que pertenciam às máquinas de uma empresa de porte médio de São Paulo. A idéia era fazer
uma revisão no maquinário, que
foi retirado com o consentimento
da fábrica. O tempo passava, e nada de as peças voltarem, o que
acabava atrapalhando a produção
da indústria. A dor de cabeça só
acabou quando um advogado
contratado localizou a empresa
prestadora de serviços e encaminhou ao grupo uma notificação
ameaçando acionar a polícia.
"O que eles querem é receber
caro pelo serviço e ficam na pressão. Repetem sempre o golpe porque há quem aceite negociar. O
erro, aí, é entrar na negociação
com eles", afirma Antonio Sérgio
Moraes Pitombo, advogado criminalista há 12 anos, que acompanhou o caso de perto.
Há dezenas de golpes entre empresas na praça, que vão desde o
uso de notas frias na contratação
de serviços -ou na compra e
venda de produtos- até a não-entrega de um serviço já pago e
acertado entre as partes.
"O golpista é movido pela boa-fé alheia", diz Alexandre Cambach, gerente comercial da SCI/Equifax, empresa norte-americana
responsável por análises de crédito para grupos privados no país.
"Há golpes comuns. A empresa
fantasma fecha diversos acordos
de compra de mercadorias. Paga
corretamente pelos primeiros lotes e, depois de conseguir a confiança do parceiro, pede um lote
maior de produto. Aí, ela dá o calote e desaparece", afirma.
Pelos cálculos da SCI/Equifax,
estima-se que, em 2004, entre
1.000 e 1.100 empresas foram
abertas no país para dar algum tipo de golpe, o que dá cerca de três
por dia. O resultado fechado será
anunciado em março, mas Cambach acredita que ele deva girar
em torno desses números.
Em 2003, segundo registro da
companhia, foram 934 empresas
-portanto, será uma elevação de
até 17,7% sobre o ano anterior.
A análise foi feita por meio do
Depec (Departamento de Pesquisas Especiais) da SCI/Equifax. Os
técnicos utilizam o banco de dados de juntas comerciais, de empresas do varejo e do setor industrial -a consultoria tem 28 mil
companhias filiadas a seu banco
de informações- para tentar
identificar grupos golpistas. A
existência só é confirmada e passa
a fazer parte do levantamento
anual, se algum golpe é realizado.
Cresce o número de companhias envolvidas nessas operações, assim como o volume de
perdas das empresas com as fraudes. Em 2003, a SCI/Equifax calcula que as perdas provocadas pelas 934 golpistas chegaram a
R$ 43,4 milhões -R$ 700 mil acima do montante de 2002.
Até agosto de 2004, o valor atingiu R$ 21,6 milhões em 689 grupos identificados nos primeiros
oito meses do ano. O volume é obtido pela SCI/Equifax com base
nas informações das companhias
vítimas das fraudes que protestaram os títulos na Justiça. É possível que o número seja maior, levando em consideração a possibilidade de que nem toda companhia vítima protesta a perda.
Atualmente, a Serasa (Centralização de Serviços Bancários) e a
SCI/Equifax vendem serviços para orientar companhias sobre como evitar fazer negócios com empresas "sujas" no mercado.
Empresa antiga, desativada por
anos, que de repente volta a operar somas elevadas ou companhia
que atua em diferentes ramos de
atividade, sem conexão entre eles,
podem motivar alerta pelas consultorias em relatórios enviados
para quem contrata os serviços.
Na pobreza e na riqueza
Os números mostram (leia quadro abaixo) que a ação dos golpistas independe do humor da economia. Isso acontece porque em
cenários de crise aguda (como em
2002 e 2003) as companhias acabam reduzindo seus controles na
tentativa de fechar bons contratos
de venda e compra e para melhorar seus resultados.
Ao mesmo tempo, em períodos
de bonança, como em 2004, as
vendas tendem a crescer, e, com
isso, entra mais dinheiro. Então, a
companhia relaxa o controle.
As empresas de análise de crédito afirmam que há cuidado em
não identificar uma empresa como golpista se o que acontece não
é má-fé do grupo. Um fornecedor
pode, por exemplo, atrasar entregas por conta de uma crise financeira na companhia.
Nesse caso, as empresas que
contratam os serviços de consultorias podem obter a informação
a respeito da companhia em dificuldade e têm a chance de verificar se há o risco em fechar um negócio com o grupo.
É difícil compreender por que
as companhias se deixam enganar
por grupos golpistas sem tomar
medidas de proteção. Para advogados especialistas em direito criminal, nem todas as companhias,
principalmente as de pequeno
porte, têm acesso aos sistemas de
informação das consultorias.
Além disso, a simples consulta
do CNPJ, o recurso mais fácil para
as empresas se protegerem, já não
é uma boa garantia. Isso porque
nem sempre o fraudador tem o
nome sujo na praça. Ele abre empresas "laranjas" -usa o nome
de desconhecidos- que podem
ter o cadastro como pessoa jurídica limpo.
Texto Anterior: Americanos e franceses polarizam convenção da Unesco Próximo Texto: "Fantasma" em SP deu prejuízo de R$ 164 mi Índice
|