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SALTO NO ESCURO
Contrato com a EPE Cuiabá prevê repasse de prejuízo à tarifa
Consumidor pode bancar perda de empresa da Enron
ALEXA SALOMÃO
DA REDAÇÃO
O colapso da Enron não impediu que o governo brasileiro mudasse o contrato com uma subsidiária da empresa norte-americana e transferisse o risco de eventuais prejuízos para a tarifa de
energia.
A EPE Cuiabá, subsidiária da
empresa americana, agora tem
autorização para embutir na tarifa eventuais perdas como geradora de energia.
O repasse para a tarifa pode
ocorrer graças a um efeito dominó que tem no meio do caminho
as empresas estatais Eletronorte,
Furnas Centrais Elétricas e Eletrobras, além da Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), órgão
regulador do setor.
A EPE Cuiabá gera energia para
Furnas. Se por algum problema
técnico não puder cumprir o pedido estabelecido, está isenta da
responsabilidade de complementá-lo. Quem deve comprar a energia é Furnas. Essa operação tem
um custo e pode afetar as contas
da estatal.
Para garantir o "equilíbrio econômico-financeiro" de Furnas, a
Aneel, responsável pela análise
dos contratos no setor, autorizou
a revisão da tarifa quando ocorrer
alteração nos custos. O reajuste
chega às distribuidoras, que podem repassá-lo ao consumidor final. A Eletrobras é garantidora do
contrato.
No jargão do mercado, Furnas
ficou com o "risco de exposição"
no MAE (Mercado Atacadista de
Energia Elétrica). O MAE é como
uma Bolsa, em que as empresas
dos setor negociam contratos de
energia. Seus preços acompanham a relação entre oferta e demanda. Pela cotação média atual,
o MWh (megawatt-hora) está em
R$ 5. Em 2001, durante o racionamento, chegou a valer R$ 684.
O contrato da EPE é uma herança. Foi firmado com a Eletronorte
em 97, quando a subsidiária da
Enron venceu licitação. A região
sofria com a falta de energia. Com
a reestruturação do setor, o contrato foi transferido para Furnas e
alterado.
A Enron -que tem uma dívida
de US$ 13 bilhões, está em concordata e sob investigação nos
EUA- detém 71,9% do empreendimento, e a Shell, 28,1%.
Desde o lançamento, o projeto esteve atrelado à construção do gasoduto Brasil-Bolívia e de um ramal de 645 quilômetros que ligasse a usina ao duto. O gás só chegou em setembro de 2001. Enquanto isso, a termelétrica operou
com óleo diesel fornecido pela
Refinaria de Paulínia, em São
Paulo. Para amortizar os altos
custos com o óleo, o empreendimento tinha direito à CCC (Cota
de Consumo de Combustível, que
rateia custos). Durante a mudança de combustível, uma das turbinas falhou e ficou parada por 140
dias, 60 deles por conta do defeito.
Segundo a Aneel, as alterações
no contrato foram feitas para adequar o documento à nova realidade do mercado. Mas a Folha apurou que a Enron insistiu em agilizar as mudanças para ter bases sólidas na negociação de um projeto
de financiamento na Opic (Overseas Private Investment Corporation, empresa de fomento ligada
ao Tesouro dos EUA).
O dinheiro do financiamento
cobriria os desembolsos de capital próprio feito pela Enron. Todo
o projeto, incluindo o ramal, está
avaliado em US$ 700 milhões. No
contrato, Furnas estabelece alguns compromissos com os financiadores, como dobrar o prazo para o saneamento, caso a EPE
torne-se inadimplente. A Opic divulgou no início do mês que tinha
suspendido todas as negociações
com a Enron, inclusive no Brasil.
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