São Paulo, quarta-feira, 20 de março de 2002

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GLOBALIZAÇÃO

Proposta do investidor é que auxílio dos países ricos seja dado a programas apresentados pelas nações pobres

Soros quer ajudar pobres com Bolsa-Escola

France Presse
Mexicano observa policial na área de conferência em Monterrey


CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A MONTERREY

Erigido pela esquerda como ícone de um capitalismo que ela detesta, o megainvestidor George Soros, paradoxalmente, dispõe-se a financiar o Bolsa-Escola, menina-dos-olhos do PT, o maior partido da esquerda brasileira.
"Se eu estivesse encarregado dos fundos, financiaria o Bolsa-Escola, que me parece um excelente programa", diz esse húngaro de 71 anos, naturalizado norte-americano, que se transformou numa verdadeira lenda no mundo das finanças.
Soros interessou-se tanto pelo programa atualmente aplicado em todo o Brasil pelo governo federal que chamou para explicá-lo o ex-governador do Distrito Federal, o petista Cristovam Buarque, o idealizador de uma das variantes do Bolsa-Escola.
George Soros faria mais: incluiria o Bolsa-Escola entre as iniciativas que poderiam ser financiadas por sua nova proposta para aumentar a ajuda ao desenvolvimento concedida a conta-gotas pelos países ricos.
O megainvestidor sugere a utilização dos DES (Direitos Especiais de Saque), uma espécie de moeda contábil criada pelo FMI (Fundo Monetário Internacional), a que tiveram direito todos os países-fundadores do organismo, Brasil entre eles, em proporção ao aporte de cada um deles.

Verba adicional
Agora, o FMI quer emendar suas regras, de forma a alocar algo em torno de US$ 27 bilhões adicionais aos países-membros, sempre em DES.
Para que a emenda seja aprovada, falta apenas a aprovação do Congresso norte-americano.
Para mudar regras no FMI são exigidos 85% dos votos. Países que detêm 72% dos votos já ratificaram a emenda. Como os Estados Unidos têm 17,13% (a maior fatia), se aprovarem, o quórum estará atingido.
Soros propõe que os países ricos usem esses recursos em doações para programas específicos a serem apresentados pelos países pobres.
"Os países desenvolvidos não necessitam dos DES", diz Soros, ao contrário do que ocorre com os países em desenvolvimento que usam os DES para compor suas reservas, "necessárias para torná-los confiáveis", na visão autorizada de um megainvestidor.
Os US$ 27 bilhões em ajuda ao desenvolvimento superam de muito longe os magros US$ 5 bilhões anunciados na semana passada pelo presidente George Walker Bush e também o pequeno incremento aprovado pela União Européia em sua cúpula de fim de semana em Barcelona.
Soros, aliás, criticou o anúncio de Bush, não apenas por ser pouco dinheiro como por só começar a ser desembolsado em 2004. Até convidou os jornalistas a pressionarem o presidente norte-americano para que reconsidere a decisão antes mesmo de chegar a Monterrey, amanhã.

Inclusão nos debates
A novidade na proposta de Soros é que ela será debatida em Monterrey, quando se reunirem os chefes de Estado/governo, a partir de amanhã. Pelo menos o presidente francês Jacques Chirac teria dito ao megainvestidor que levantaria o tema.
Outro país importante que apóia a proposta é o Reino Unido, pela voz de seu ministro do Tesouro, Gordon Brown.
Soros diz que a idéia não chegou a ser rejeitada por ninguém, mas lembra que "há um longo caminho entre não ser rejeitada e ser implementada de fato".
De todo modo, ainda que a proposta seja colocada em funcionamento, ela não serve para o Brasil (a não ser para o Bolsa-Escola e mesmo assim se fosse Soros o responsável pelo gerenciamento dos fundos). A ajuda ao desenvolvimento destina-se apenas aos países muito pobres, os 49 que têm renda per capita inferior a US$ 900.
Tampouco serviria para um caso como o da Argentina, como o próprio investidor deixou claro ontem, em entrevista coletiva.



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