São Paulo, quinta-feira, 20 de maio de 2004

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

GASTO BRASIL

Caem o consumo per capita de carne bovina e de frango; refeição fora de casa é cada vez mais comum

Ricos tomam 6 vezes mais leite que pobres

DA SUCURSAL DO RIO

Alimento mais consumido pelo brasileiro, o leite é também o retrato da desigualdade do país: a diferença entre o consumo da camada mais rica da população e o da mais pobre é de 613%.
Enquanto as famílias com renda maior do que R$ 6.000 têm um consumo per capita anual de 63,5 litros de leite, os lares com rendimento de até R$ 400 bebem apenas 8,9 litros por ano. O consumo médio no Brasil é de 27,9 litros.
Traduzindo os números, equivale dizer que os mais ricos tomam um copo de leite todos os dias, enquanto os de renda menor bebem um copo a cada oito dias. Embora seja o produto mais utilizado, o consumo per capita caiu 40% em relação ao de 1987.
"As pessoas no Brasil tomam café, mas com leite depende da renda", diz Wasmália Bivar, diretora de Pesquisas do IBGE.
A mesma disparidade, embora numa proporção menor, ocorre com a carne: os mais ricos comem 20,5 quilos per capita anual, contra 11 quilos dos que estão na faixa de rendimento menor. É uma diferença de 86%.
Quanto menor o preço unitário dos produtos, seu consumo é mais equilibrado entre as diferentes faixas de renda.
Mais barato do que a carne de vaca, o frango tem um consumo um pouco menos desigual: os mais ricos consomem 54% a mais de carne de frango. No sentido contrário, os tradicionais arroz e feijão são mais consumidos pelos mais pobres, que comem 28% e 40%, respectivamente, mais do que a camada mais rica.
Os dados do IBGE revelam ainda que o perfil do prato do brasileiro não se alterou muito da década de 70 para cá: arroz, feijão, carne de frango ou de vaca e farinha de mandioca são os itens básicos mais consumidos. No café da manhã, leite (especialmente para os mais ricos), café e pão -tudo com muito açúcar.
Apesar disso, a alimentação fora do lar ficou cada vez mais comum e as quantidades consumidas em casa, menores. Um dos dados que mais chama atenção é a redução do consumo de carnes.

Consumo de carne cai
Segundo informações de dez das principais regiões metropolitanas do país, o brasileiro comia 16,2 kg de carne bovina em 1974-1975 no domicílio. A cifra caiu para 14,6 kg em 2002-2003 -um recuo de 9,9%. Em 1995-1996, no auge do Plano Real, eram 20,8 kg. Na comparação com 2002-2003, a queda é de 29,8%.
No caso do frango, a redução foi ainda maior: de 24,2 quilos em 1974-1975 para 14,2 quilos -ou 41,3% menos. Em 1995-1996, o consumo do produto era 60% maior (22,7 quilos).
Para Edílson Nascimento da Silva, técnico do IBGE, três fatores explicam a redução do consumo de carnes: o recuo da renda nos últimos anos, o aumento do uso de alimentos já preparados e a propagação da refeição fora do lar. Em 2002-2003, o rendimento total nas principais regiões metropolitanas do país teve queda de 18% ante 1995-1996.
O peso da alimentação fora do lar no orçamento passou de 2,45% em 1974-1975 -os dados são do Endef (Estudo Nacional da Despesa Familiar)- para 4,11% em 2002-2003. Considerando apenas gastos com alimentação, a participação da refeição fora do lar passou de 9,7% para 24,05%.
Para a presidente interina da Associação Brasileira de Nutrição, Andrea Galante, os dados revelam que o consumo de carnes não atende às necessidades diárias de ingestão de proteínas (de 150 a 200 gramas). Ela afirma, porém, que essa aparente deficiência pode estar sendo compensada na alimentação fora do lar. O IBGE não detalhou o consumo de alimentos fora do domicílio.
Para Wasmália Bivar, é a urbanização, no fundo, que explica todas as mudanças no padrão de consumo de alimentos: "As pessoas não têm mais tempo para comer em casa. Por isso caiu o consumo daqueles itens mais tradicionais que compõem o almoço".
A economista da FGV (Fundação Getúlio Vargas) Sônia Rocha concorda e destaca dois fatores que impulsionaram a alimentação longe do domicílio: o aumento do número de mulheres no mercado de trabalho e a disseminação do vale-refeição.
O uso de alimentos preparados subiu 216% de 1974-1975 para 2002-2003. Seu consumo per capita cresceu de 1,7 para 5,4 quilos.
O peso da alimentação é muito diferente de acordo com a renda. As famílias de menor renda desembolsam 32,66% de seu orçamento com alimentação. Já as mais ricas, apenas 9,04%.
Para Sônia Rocha, além de mais diversificada, a estrutura de consumo ficou mais cara -o alimento fora de casa custa, em média, o dobro, segundo a economista.
Rocha cita o exemplo do iogurte -cujo consumo aumentou 709% (de 0,36 quilo para 2,9 quilos)-, substituindo, em parte, o leite. Foi um dos poucos produtos em que houve crescimento do consumo per capita. Um outro exemplo é a água mineral, cujo consumo cresceu 5.694%.
Os dados do IBGE revelam também que o brasileiro consome mais açúcar do que precisa. Utiliza 12,6 kg per capita por ano (média do Brasil) só do tipo cristal. É um consumo maior do que o de feijão: 12,8 kg na média nacional. (PEDRO SOARES)


Texto Anterior: Na educação, curso superior é o que mais consome orçamento
Próximo Texto: Sudeste come mais pão; Nordeste, mais feijão
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.