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OPINIÃO ECONÔMICA
Defesa dos controles de capital (em inglês)
PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.
Estive anteontem no fórum de
debates organizado anualmente
pelo ex-ministro Reis Velloso.
Neste ano, além da participação
de expositores nacionais, tivemos também a de alguns economistas estrangeiros, como Jan
Kregel, da Unctad, Barry Eichengreen, da Universidade de
Berkeley, Califórnia, e Uri Dadush, do Banco Mundial. Os
dois primeiros são renomados
especialistas em questões financeiras internacionais; o terceiro
ocupa atualmente o cargo de diretor do Grupo de Perspectivas
do Desenvolvimento no Banco
Mundial.
Como se sabe, nós, brasileiros,
temos uma fraqueza arraigada,
talvez atávica, por tudo o que é
dito ou escrito em inglês. Assim,
foi muito gratificante ouvir os
três economistas estrangeiros
defender controles seletivos sobre os movimentos internacionais de capital.
Ainda na semana passada, eu
reclamava, nesta coluna, da escassa presença do tema no debate brasileiro. O desinteresse quase geral, mesmo entre economistas, por uma questão tão importante para as perspectivas do
Brasil vinha me deixando numa
amarga frustração.
Insisti no assunto várias vezes
nos últimos meses sem suscitar
uma única e solitária reação.
Constatava, aflito, o despontar
dos sintomas de uma nova obsessão não correspondida (por
outro lado, sem idéias fixas, não
há como manter uma coluna semanal).
Mas nada como uma semana
depois da outra! A preocupação
com a volatilidade dos fluxos internacionais de capital foi um
traço comum às intervenções
dos três economistas estrangeiros. Ainda que com diferenças
de ênfase e argumentação, eles
coincidiram no seguinte ponto
fundamental: a abertura da
conta de capitais do balanço de
pagamentos pode ser perigosa,
particularmente para países em
desenvolvimento.
A tese não é nova, mas adquiriu importância especial depois
da impressionante virulência de
algumas crises cambiais e financeiras dos anos 90. O trabalho
apresentado pelo economista do
Banco Mundial, por exemplo,
embora acompanhado da ressalva de que as opiniões não devem ser atribuídas a sua instituição, sugere que a discussão
do tema está bem mais avançada em Washington do que no
Brasil.
Uri Dadush recapitulou as razões pelas quais economias periféricas como o Brasil costumam
ser mais prejudicadas por turbulências financeiras internacionais e pelas "imperfeições endêmicas nos mercados financeiros". Nessas economias, observa
Dadush, "qualquer choque adverso leva imediatamente a
uma reavaliação da probabilidade de moratória", provocando saídas acentuadas de capital.
Isso significa, lembra ele, que a
entrada de recursos externos pode diminuir exatamente quando ela é mais necessária. Por esses e outros motivos, esses países
são forçados a responder a choques adversos com políticas monetária e fiscal mais restritivas,
justamente o oposto do que seria
normalmente recomendável ou
do que costumam fazer os países
desenvolvidos.
Dadush observa, também, que
"os argumentos em favor de
uma plena liberalização da conta de capitais nos países em desenvolvimento nunca foram especialmente bem desenvolvidos". E recorda, ainda, que,
mesmo nas economias desenvolvidas, a liberalização completa
dos fluxos internacionais de capital é um fenômeno muito recente.
Agora que o Brasil está começando a escapar da armadilha
cambial em que nos aprisionaram nos últimos anos, toda essa
discussão é de grande relevância
para nós. Não podemos, entretanto, continuar imaginando
que a solução dos nossos problemas nessa área (ou em qualquer
outra) virá de fora.
Como observou um ex-presidente do Banco Central do Brasil, Paulo Pereira Lira, no debate de anteontem, o Brasil não
pode se limitar a fazer apelos
para que o Grupo dos 7 encontre
formas de disciplinar os fluxos
financeiros internacionais. Não
temos tempo para esperar que os
EUA, a Europa e o Japão cheguem a um acordo sobre a
questão. Mais ainda, como nota Paulo Lira, as regras que
vierem eventualmente a ser estabelecidas pelos países centrais atenderão, em primeira
instância, a seus interesses e
prioridades. Interesses e prioridades que, em geral, divergem dos nossos.
Felizmente, há muito o que
pode ser feito, no plano nacional, para controlar a conta de
capitais sem ferir qualquer
compromisso internacional
assumido pelo país e sem danificar a nossa credibilidade externa e interna.
Um sistema bem pensado de
controles, aplicado de forma seletiva e criteriosa, fortalecerá
consideravelmente as chances
de sucesso da flutuação cambial,
abrindo caminho para a retomada do crescimento econômico e para a geração de empregos.
Mas, com a conta de capitais
excessivamente aberta, como está desde o início dos anos 90,
corremos o risco de experimentar volatilidade exagerada da
taxa cambial. Dependendo da
evolução do quadro nacional e
da conjuntura internacional, a
flutuação poderá ser perigosamente tumultuada, obstruindo
a recuperação da economia e
realimentando propostas de dolarização e assemelhadas.
Nesse ambiente, as mesmas figuras carimbadas, aqui e no exterior, que hoje se declaram contrárias a restrições na conta de
capitais serão as primeiras a
proclamar "urbi et orbi" a inviabilidade da moeda nacional.
Por isso é que eu insisto e repito e volto a dizer: pelo amor de
Deus e pela Santíssima Trindade: CONTROLEM OS MOVIMENTOS DE CAPITAL!
Paulo Nogueira Batista Jr., 44, economista e
professor da Fundação Getúlio Vargas-SP, escreve às quintas-feiras nesta coluna.
E-mail: pnbjr@ibm.net
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