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Oferta de gás será "justa" em 2007 e 2008
Responsável pelo planejamento do setor energético diz que suprimento a partir de 2009 depende de conclusão de obras
Entre os problemas do setor,
está a falta de oferta de
usinas hidrelétricas para
serem colocadas nos leilões
de energia nova
CLÁUDIA TREVISAN
DA REPORTAGEM LOCAL
O Brasil vai enfrentar um período "justo" no fornecimento
de gás em 2007 e 2008, e o risco
de falta de energia depois desse
período só estará afastado com
a conclusão, até 2009, dos projetos de exploração da Petrobras em Santos, Espírito Santo
e Bacia de Campos e das hidrelétricas previstas pelo governo.
A avaliação é de Mauricio
Tolmasquim, presidente da
EPE (Empresa de Planejamento Energético), criada em 2004
para cuidar do desenvolvimento do setor a longo prazo.
Apesar do "buraco" no fornecimento de gás em 2007 e
2008, Tolmasquim afirma que
não há risco de racionamento,
mesmo que o país cresça os 5%
anuais desejados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
O presidente da EPE diz que
o governo enfrenta o problema
de ter poucas usinas hidrelétricas para serem colocadas nos
leilões de energia nova. A seguir, trechos da entrevista concedida à Folha por telefone na
semana passada.
FOLHA - Existe risco de falta de
energia a partir de 2008 ou 2009?
MAURICIO TOLMASQUIM - Não
existe possibilidade de falta de
energia. As distribuidoras têm
100% de suas necessidades de
energia contratadas com geradoras até 2012. É claro que não
há só as distribuidoras. Existe
também o mercado livre, que
corresponde a 25% do total.
FOLHA - Qual a situação dos 25%?
TOLMASQUIM - É o mercado livre, dos grandes consumidores.
Os distribuidores contratam a
geração e, normalmente, as
grandes empresas têm contratos para suas demandas.
Entre 2007 e 2008, existe a
questão de gás. Nós temos uma
situação justa de abastecimento de gás para as termelétricas,
mas ela não coloca em risco o
suprimento de energia, porque
as termelétricas não precisam
funcionar o tempo todo.
Se há problema de chuva, as
termelétricas são ligadas para
complementar as hídricas. Nos
últimos quatro anos, as térmicas funcionaram em média
30% do tempo. Simulações
mostram que haveria gás para
funcionarem 60% do tempo.
Além disso, a média de chuvas prevista para 2007 é 30%
superior à média dos últimos
70 anos. É uma situação muito
boa em termos pluviométricos,
que permite passar por esse buraco, melhor dizendo, esse período justo em termos de gás
que é 2007 e 2008.
Por que 2009 já está resolvido? Porque em 2009 estão entrando 24 milhões de m3 de gás
da Petrobras a partir de Santos,
Espírito Santo e a Bacia de
Campos. Além disso, há 20 milhões de m3/dia de GNL (Gás
Natural Liqüefeito) no Rio de
Janeiro e no Pecém, no Ceará.
FOLHA - As térmicas serão capazes
de suprir a demanda com qual nível
de crescimento do PIB?
TOLMASQUIM - Trabalhamos
com taxas entre 4% e 5%.
FOLHA - Se o país crescer 5%, como
quer o presidente Lula, já a partir do
ano que vem e até o fim do segundo
mandato, haverá energia?
TOLMASQUIM - Sim.
FOLHA - Se houver seca semelhante à que levou ao apagão em 2001,
em quanto as térmicas teriam de
funcionar para o país crescer 5%?
TOLMASQUIM - Eu não tenho essa conta precisa aqui, mas em
princípio essa margem de 60%
seria suficiente.
FOLHA - Se há problema no fornecimento de gás, não é equivocado o
modelo de leilões de energia nova,
que privilegiaram as térmicas?
TOLMASQUIM - Não foi contratada nenhuma térmica a gás nova. As que foram contratadas
foram as "botox", que são as
construídas recentemente que
não foram amortizadas, mas
são classificadas como novas.
FOLHA - Houve pouca procura por
hídricas e no último leilão duas usinas não foram arrematadas.
TOLMASQUIM - O problema é que
temos poucas usinas hídricas
para serem leiloadas.
FOLHA - Mas duas do último leilão
não foram arrematadas.
TOLMASQUIM - Sim, eram duas
usinas caras, que têm custos
ambientais elevados. Optamos
por deixar o mercado decidir. O
preço que colocamos, de R$ 156
o MW/hora, era mais caro que
o preço das térmicas, de R$ 140.
Por que há poucas hidrelétricas? No passado recente foi relegado a segundo plano o planejamento, que foi retomado com
o novo modelo do setor elétrico. Sem planejamento, ficaram
em segundo plano os inventários das bacias hidrográficas, os
estudos de avaliação ambiental
integrada e os estudos de viabilidade. Antes de leiloar usinas,
você precisa desses estudos.
No modelo antigo, a concessão era leiloada mesmo sem licença ambiental. Era um verdadeiro faz-de-conta. Agora,
são licitadas só usinas que tenham licença, que é precedida
daqueles estudos. A EPE está
realizando os estudos, mas eles
só vão frutificar mais adiante.
FOLHA - Mas não é também um
faz-de-conta licitar usinas por um
preço que não vai ser aceito pelo
mercado, como no último leilão?
TOLMASQUIM - Cem por cento
da demanda foi atendida. O que
foi mais atrativo entrou. É um
sistema de competição, no qual
o mais atrativo ganha.
FOLHA - O problema é que isso está
levando à maior dependência do
gás, que está justo em 2007 e 2008.
TOLMASQUIM - Não tem aumentado a participação [do gás].
FOLHA - Não há o risco de falta de
energia, mas o gás vai subir.
TOLMASQUIM - O preço do gás
tende a aumentar. O mercado
tem crescido em torno de 7% a
10% ao ano e a previsão é que
cresça 17% nos próximos anos.
Há um desajuste entre crescimento da demanda e da oferta.
FOLHA - Se não há risco de falta de
energia, por que as empresas que
produzem energia, as que consomem energia e os analistas do setor
afirmam que ele existe?
TOLMASQUIM - Até hoje eu não
vi nenhum estudo embasado
que desse respaldo a essas observações. Houve um fenômeno em 2001, quando a sociedade foi pega de surpresas. Poucos analistas chamaram atenção para o problema e eu fui um
deles. Acho que existe um trauma pós-racionamento, que foi
muito ruim para o país.
FOLHA - Uma das condições para
que o cenário com o qual vocês trabalham se concretize é que os projetos da Petrobras não atrasem.
TOLMASQUIM - Sem dúvida. É
importante que o gás esteja disponível em 2009, assim como a
planta de GNL e os gasodutos.
Não basta ter o gás. Hoje nós temos 5.680 km de gasodutos.
Estão em construção 1.076 km
e mais 3.481 km estão sendo
iniciados e deverão estar prontos até 2009. E as hidrelétricas
não podem ser atrasadas. Também é importante a ampliação
da capacidade de transmissão.
Nos quatro anos, terão sido instalados 13.904 km de linhas,
mais do que foi instalado nos
oito anos do governo anterior.
FOLHA - Uma das críticas que o setor privado faz ao plano decenal da
EPE é a de que ele se baseia em grandes projetos, como as usinas do rio
Madeira, que correm risco de atrasos em razão do impacto ambiental.
TOLMASQUIM - Não existe outra
opção agora. O problema que
temos é o da falta de hidrelétrica para os leilões.
FOLHA - Qual o tempo necessário
para os estudos de viabilidade?
TOLMASQUIM - O de inventário
demora cerca de dois anos. O
objetivo é ver qual a melhor
distribuição das quedas para
aproveitar as bacias. A avaliação ambiental integrada, mais
ou menos um ano. Depois, vêm
o estudo de viabilidade econômica, o de impacto ambiental e
os relatórios ambientais, para,
aí sim, pedir a licença prévia.
Tudo demora uns quatro anos.
O rio Madeira é uma forma de
ganhar esse tempo.
FOLHA - Se os estudos demoram
quatro anos, por que não começaram a ser feitos antes?
TOLMASQUIM - Quando começou o governo, não havia um
modelo, havia um caos. A EPE
foi criada em 2004 e logo começou a fazer os estudos.
FOLHA - É possível tornar o licenciamento ambiental mais rápido?
TOLMASQUIM - Existem problemas que têm de ser resolvidos.
Temos uma multiplicidade de
agentes que influenciam e aumentam o custo ambiental dos
projetos. Parte da energia fica
mais cara por causa desses custos ambientais, que passaram
de uma média de 8% a 10% para
algo em torno de 15% a 20%.
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