São Paulo, domingo, 20 de dezembro de 1998

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FINANÇAS
Apesar dos altos lucros, instituições privadas pagam menos IR do que as oficiais, revela estudo de consultoria
"Comprar banco é um bom investimento"

SILVANA QUAGLIO
da Reportagem Local

Comprar bancos oficiais e outros problemáticos tem-se provado um excelente negócio para instituições que atuam no mercado brasileiro. Bancos lucrativos conseguem amainar o apetite do "leão" e aliviar o peso dos compulsórios depositados no Banco Central com a ajuda dos bancos comprados.
"Crédito tributário tem sentido amplo, mas, sem dúvida, é um valor pelo qual se pode pagar", diz Fernando Santoro, diretor do Unibanco.
No final do primeiro semestre de 98, o Itaú pagou US$ 15 milhões de Imposto de Renda, apenas 4% do seu lucro. O Bozano, Simonsen não pagou; tinha um crédito de US$ 19,18 milhões. Os dois bancos deram bons lucros: US$ 367,5 milhões o Itaú e US$ 68,26 milhões o Bozano, de acordo a Austin Asis.
"Comprar banco é um bom negócio", afirma o professor Alberto Borges Matias, da Austin, empresa especializada na análise de balanços de bancos. Matias produziu um estudo que mostra, por exemplo, que bancos oficiais pagam muito mais IR do que os privados.
Somando-se o IR pago por 185 bancos, no primeiro semestre de 98, chega-se a US$ 893,7 milhões. Esses mesmos bancos declararam lucros de US$ 2,33 bilhões. Apenas cinco bancos oficiais recolheram US$ 472 milhões de IR, ou seja, mais da metade da fatia abocanhada pelo "leão".
"Está evidente que uma fonte de captação do governo é o próprio governo. Com a privatização dos bancos, cairá o recolhimento de IR", afirma Matias. Segundo o professor, os bancos oficiais pagam mais porque não recorrem às brechas da lei para reduzir o imposto devido, o chamado planejamento tributário.
O Itaú comprou o Banerj (Banco do Estado do Rio de Janeiro), em junho de 97, pelo preço mínimo de R$ 311 milhões, usando moedas de privatização para pagar. Em setembro deste ano, comprou o Bemge (Banco do Estado de Minas Gerais) por R$ 583 milhões -um ágio de 85,58%.
A diretoria do banco não atendeu pedido da reportagem da Folha para falar sobre os créditos tributários e o alívio nos compulsórios recebidos com essas operações, mas especialistas avaliam que o banco fez bons negócios.
Para comprar o Bemge, o Itaú teve de duelar com o Bradesco, depois que os envelopes abertos mostraram as ofertas: R$ 486,1 milhões do Itaú, R$ 443 milhões do Bradesco e R$ 391,1 milhões do Bozano, Simonsen.
"Sem dúvida a aquisição de bancos estaduais gera uma otimização tributária muito grande", diz Pedro Guimarães, analista de bancos do Bozano, Simonsen.
O balanço semestral do Bemge dá uma pista. O banco pagou US$ 184,5 milhões de IR e teve prejuízo de US$ 41,5 milhões. Analistas calculam créditos tributários de cerca de US$ 190 milhões.
Os compulsórios (sobre depósitos à vista e a prazo), que não precisarão ser depositados temporariamente, deverão render outros R$ 900 milhões ao Itaú, de acordo com o mercado. A desobrigação de fazer esses depósitos é negociada com o Banco Central.
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Inversão O caso do Bozano, Simonsen é ainda mais emblemático de como uma boa estratégia pode render gordos dividendos. O banco comprou o Meridional, em dezembro de 97, por R$ 265,66 milhões -um valor 54,97% acima do mínimo.
O banco tinha créditos tributários de mais de R$ 200 milhões, só que para usá-los tinha de dar lucro. Como isso não aconteceria no curto prazo, o Bozano colocou boa parte do seu patrimônio no Meridional e passou a ser controlado pelo banco comprado.
Movimentos como esse não são ilegais, explica o tributarista Régis Fernando de Ribeiro Braga, do escritório Mattos Filho. "Os bancos, como de resto todas as empresas, fazem planejamento tributário, buscando aproveitar todas as brechas da legislação", concorda Márcio Branco, analista de bancos do FonteCindam.
A compensação de prejuízos passados no lucro posterior é definida em lei. Até o final de 94, os prejuízos podiam ser compensados totalmente, com um limite temporal de quatro anos, segundo Braga. Agora não há mais o limite de tempo, mas só se pode compensar até 30% do lucro por ano.
A mudança foi feita por meio de medida provisória no final de 94, e virou lei em 95. Vários bancos já obtiveram o direito de abater 100% do prejuízo até dezembro de 94, alegando direito adquirido. Muitos continuam brigando contra a limitação de 30%.
"A compensação parcial é uma espécie de empréstimo compulsório", diz Braga. Vários bancos também estão aumentando seus créditos tributários mediante reconhecimento de diferenças no cálculo da inflação no Plano Verão (janeiro de 89) e no Plano Real.
Segundo Braga, em cada um desses períodos houve diferenças nos índices de inflação de mais de 40%. "À medida que não foi reconhecida a correção, o lucro é fictício e o imposto indevido", diz Braga.
Medidas judiciais e outras negociações com a Receita (como a dedução de provisionamentos feitos pelos bancos em razão da alta inadimplência de clientes) têm ajudado a reduzir o IR pago pelas instituições. Bancos como o Bradesco e o Unibanco não pagaram nada de IR no primeiro semestre de 98, mesmo tendo lucros polpudos.



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