São Paulo, sábado, 21 de janeiro de 2006

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OPINIÃO ECONÔMICA

Futuro do Brasil

GESNER OLIVEIRA

No passado, o Brasil era sempre lembrado como o país do futuro. Passaram-se anos e décadas e o Brasil não correspondeu às expectativas. Virou piada. Parecia destinado a ser sempre o país do futuro. Atualmente, a situação é ainda mais grave. A incapacidade de aproveitar a excepcional conjuntura mundial dos últimos anos acentuou a frustração. Gerou uma perigosa desesperança, uma sensação de país sem futuro.
O mercado financeiro olha apenas o curto prazo. Os detentores de papéis brasileiros têm razão para otimismo em relação a 2006. Parece um ano razoável, bem menos tenso do que o ano eleitoral de 2002. A economia deverá crescer entre 3% e 4%. Mas e depois? Qual a perspectiva de médio e longo prazo? Como o país poderia assegurar um desempenho razoável em meio a conjunturas externas adversas?
Há diferentes formas de reencontrar o caminho do crescimento sustentado. Há reflexões importantes dentro e fora do país acerca desse tema. Um exemplo é o do Centro de Estudos Brasileiros da Universidade de Columbia, de onde passo a contribuir semanalmente para esta coluna nos próximos meses. Há um debate intenso e plural acerca dos rumos da América Latina e do Brasil.
Não há uma única fórmula para resgatar o crescimento sustentado, para deixar de mirar com inveja as taxas de crescimento da China e da Índia. A receita do bolo inclui pelo menos sete ingredientes.
Em primeiro lugar, é preciso acertar a dose do remédio antiinflacionário. Não se pode errar na mão com a taxa de juros. É impossível ser campeão mundial de juros reais e de crescimento ao mesmo tempo. Pois quem paga a conta é o Tesouro e a produção.
Em segundo lugar, o país precisa passar por um choque de gestão que reduza significativamente o desperdício. A maior parte desse dever de casa deve ser feita pelo setor público. Os menores encargos financeiros aliados ao controle de gastos correntes ensejariam redução em bases sólidas do endividamento do Estado. Isso permitiria redução do risco e maior espaço para desonerar os investimentos produtivos.
Em terceiro lugar, a possibilidade de recuperação do investimento público teria de vir complementada pela inversão privada. Infelizmente, ao contrário do investidor financeiro de curto prazo, o investidor de longo prazo está inseguro em relação ao Brasil. Operadores estratégicos importantes estão deixando o país em vez de aplicar recursos em mercado tão carente de infra-estrutura. Isso se deve à falta de regras claras e de perspectiva de crescimento sustentado.
Em quarto lugar, o Brasil precisa de um choque de produtividade que passa por um salto educacional. É hora de emprestar um pouco do legítimo orgulho que sentimos pela seleção brasileira para outras áreas, especialmente de conhecimento. O Brasil não pode, por exemplo, aceitar a posição de lanterninha em aprendizado de matemática. Países asiáticos estão fazendo o salto para a economia do conhecimento. O Brasil não pode ficar marginalizado.
Em quinto lugar, o salto educacional deve repercutir no setor produtivo mediante estímulo sistemático à inovação e ao empreendedorismo. Chama a atenção a ênfase dada a esse ponto pelo programa da recém-eleita presidente do Chile, Michel Bachelet.
Em sexto lugar, o empreendedorismo só vai deslanchar mediante um choque de desburocratização e desoneração da produção e do investimento. O excesso de carga tributária sufoca a economia na atualidade.
Por último, o Brasil precisa procurar de forma prioritária e pragmática o acesso a mercados externos. Para isso, não bastam pomposos acordos internacionais. Mas é indispensável ter produtos e serviços melhores, desejados pelos consumidores mundiais e naturalmente mais baratos.
O caro leitor não assiste a novela, mas, se assistisse, teria concordado com a personagem Bia, que, irada e com a vida que lhe confere o talento de Fernanda Montenegro, deu um basta no gerundismo de sua assistente. Chega de "vou estar fazendo" e, sobretudo, de "vou estar falando"! É preciso mudar o tempo do país. E usar o futuro com a determinação de quem cumpre metas preestabelecidas e compatíveis com um plano consistente de desenvolvimento.


Gesner Oliveira, 49, é doutor em economia pela Universidade da Califórnia (Berkeley), presidente do Instituto Tendências e ex-presidente do Cade. Atualmente, é professor visitante do Centro de Estudos Brasileiros na Universidade Columbia (EUA).
Internet: www.gesneroliveira.com.br
E-mail - gesner@fgvsp.br


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