|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
COMUNICAÇÕES
Rede vê influência no governo de fatores alheios ao assunto, como criação de empregos e investimentos
Globo teme rumo da discussão da TV digital
ELVIRA LOBATO
DA SUCURSAL DO RIO
É de preocupação o clima na Rede Globo quanto ao rumo da discussões no governo para a escolha
do sistema de televisão digital. Para os executivos da empresa que
acompanham o assunto de perto,
a discussão tomou um caminho
perigoso ao priorizar a implantação de uma fábrica de semicondutores no país.
A confiança na escolha do padrão japonês -defendido pela
Globo e pela grande maioria dos
radiodifusores- foi substituída
por uma crescente apreensão, à
medida em que a União Européia
promete apresentar, nos próximos dias, uma proposta efetiva
para a construção da fábrica.
Duas semanas atrás, a Folha noticiou que o presidente Lula já tinha se decidido pelo padrão japonês, atendendo aos radiodifiusores. O anúncio oficial era esperado para o último dia 11, mas o comitê de ministros que estuda o assunto pediu um prazo adicional
para examinar as ofertas dos concorrentes. Desde então, os europeus fazem uma grande ofensiva
para reverter o jogo.
Em entrevista à Folha, os diretores da Rede Globo de Engenharia, Fernando Bittencourt, e de
Relações Institucionais, Evandro
Guimarães, demonstraram preocupação da empresa com a possibilidade de o sistema de TV digital
vir a ser escolhido em razão de
contrapartidas que não tenham
relação com as prioridades das
emissoras de televisão.
Terno por cimento
"É como se eu fosse comprar
um terno e o gerente me oferecesse três sacos de cimento como
contrapartida para eu levar um
modelo que não me serve", disse
Bittencourt.
Três tecnologias estão na disputa: a norte-americano (ATSC), a
européia (DVB) e a japonesa
(ISDB). Mas, como o padrão norte-americano não comporta a
transmissão para aparelhos móveis (como telefones celulares),
ela acabou polarizada entre os sistemas japonês e europeu.
Estima-se que as emissoras, em
seu conjunto, terão de investir
US$ 500 milhões para montar as
redes de retransmissão com a nova tecnologia digital. As TVs, hoje, funcionam com sistema analógico.
Evandro Guimarães, diretor de
Relações Institucionais, disse que
todos os radiodifusores estão
apreensivos. O receio é de que o
debate em torno da implantação
da fábrica acabe empurrando o
governo para uma sinuca e que
ele se veja forçado a fazer a escolha em razão de temas que, embora importantes -como geração
de empregos na indústria e transferência de tecnologia-, não têm
a ver com o ponto central da discussão, que é a migração da radiodifusão do sistema analógico para
o digital.
"Se a preocupação é a geração
de empregos na indústria, a escolha do sistema japonês vai impulsionar a produção de milhões televisores portáteis para ônibus,
trens, barcos e táxis", diz Bittencourt.
A construção da fábrica de semicondutores foi colocada na
pauta de discussão pelo próprio
governo. O ministro das Comunicações, Hélio Costa, tem repetido
que o único valor agregado pelo
Brasil na montagem de produtos
eletrônicos é a embalagem.
O assunto veio à tona quando o
governo divulgou que os japoneses teriam se comprometido com
a construção da fábrica de semicondutores, durante visita de executivos da Nec, da Sony, da Panosonic e da Toshiba, ao Brasil, há
duas semanas.
O consultor do sistema japonês
Murilo Pederneiras esclareceu
que as empresas prometeram
examinar o assunto junto com o
governo, mas não se comprometeram de antemão com a construção da fábrica, que exigiria investimentos da ordem de US$ 2 bilhões.
A reação inicial dos europeus
foi de ceticismo. O presidente da
Philips, Marcos Magalhães, chegou a declarar que o Brasil perdeu
o "bonde da história" da indústria
de semicondutores, no início dos
anos 1990, e que não haveria mais
retorno. Mas, em seguida, a ST
Electronics (franco-italiana)
anunciou também estar disposta
a implantar a fábrica em troca da
escolha do sistema europeu para a
TV digital brasileira.
A ST Electronics, juntamente
com Philips (holandesa), Siemens
(alemã), Thomson (francesa),
Nokia (finlandesa) e Rohde &
Schwarz (alemã) integram a "coalizão DVB" para contrapor o
lobby dos radiodifusores pelo sistema japonês.
Texto Anterior: Despesa pública: Juro cai se gasto melhorar, diz Levy Próximo Texto: Multiprogramação é amadorismo, afirma emissora Índice
|