São Paulo, domingo, 21 de março de 2010

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OPINIÃO

País desvirtuou ideia de royalty

HÉLIO SCHWARTSMAN
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

COMO SÓI acontecer, o Brasil desvirtuou completamente a ideia de royalties do petróleo, dando assim margem ao embate protagonizado pela Câmara dos Deputados e pelo governador fluminense, Sérgio Cabral.
Os dois lados costumam apresentar seus argumentos em termos de compensações por impacto ambiental, demográfico ou de benefícios decorrentes da propriedade do óleo. A questão, entretanto, está mal colocada, pelo menos segundo os cânones da teoria econômica neoclássica. É o que mostra Flávia Caheté Lopes Carvalho em "Aspectos Éticos da Exploração do Petróleo", dissertação de mestrado apresentada em 2008 à Coppe/UFRJ.
Conceitualmente, os royalties seriam devidos à União, que é a proprietária de todos os recursos minerais do país, e teriam uma função bastante precisa: compensar as próximas gerações pelo uso presente de um bem que, por ser exaurível, não estará mais disponível no futuro, quando valeria ainda mais do que hoje.
Quem colocou o problema em bases matemáticas foi o economista Harold Hotteling (1895-1973) no texto clássico "The Economics of Exhaustible Resources", de 1931. A ideia central defendida pelo autor é que é preciso pôr um preço na utilização das jazidas de modo a maximizar, ao longo do tempo, os benefícios que elas trazem para toda a sociedade.
Evidentemente, apenas os pagamentos não bastam para assegurar que os objetivos pretendidos sejam alcançados. Seria necessário também aplicar os recursos em áreas estratégicas que preparem o país para o futuro no qual o petróleo não mais existirá. Tipicamente, o dinheiro deveria ir para rubricas como pesquisa, desenvolvimento tecnológico e educação. São, afinal, conhecidos os perigos da "doença holandesa", a desindustralização provocada pela exploração de recursos naturais e pelas distorções cambiais dela decorrentes.
Num plano mais imediato, faria sentido repassar parte desses recursos a Estados e municípios, para que invistam em projetos concretos que visem a diversificação da economia na região e, vá lá, em obras de infraestrutura.
O Brasil, entretanto, resiste a se curvar à boa teoria econômica. Como os royalties se converteram em moeda de troca nas mais diversas negociações políticas, qualquer preocupação estratégica que pudesse haver foi rifada. A Lei do Petróleo, que regulamenta a matéria, permite que governadores e prefeitos façam uso livre do dinheiro dos royalties.
O resultado, previsível, é que unidades premiadas por caprichos geográficos dediquem a cada ano mais recursos ao custeio de estruturas cada vez mais inchadas, produzindo efeitos opostos aos desejados.
Royalties já representam cerca de 12% do Orçamento do Rio de Janeiro, no que ameaça configurar-se como um caso de "doença fluminense". É claro que também não dá para, do dia para a noite, subtrair R$ 7 bilhões às finanças do Estado.


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