São Paulo, domingo, 21 de março de 1999

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TRABALHO
Crescem empresas que fornecem serviços de apoio para altos executivos que têm patrimônio e boa qualificação
Desempregado de luxo cria novo mercado


da Equipe de Articulistas

As ondas de demissões e enxugamento em níveis intermediários e mesmo na alta gerência das empresas cria um novo tipo de desempregado, que tem renda e qualificação. Prosperam também as empresas que oferecem produtos e serviços para esse desempregado, que em geral sai do emprego com uma poupança razoável ou um polpudo saque no FGTS.
O desempregado de luxo é um cliente cobiçado por consultores, empresas de recolocação profissional, "headhunters" (literalmente, caçadores de cabeças) e psicólogos. Apesar (e por causa) da crise, surge um interessante nicho de mercado.
Um executivo de alto padrão num dos maiores bancos do país, que prefere não se identificar, estava há mais de um ano trabalhando no desenvolvimento de uma nova linha de produtos financeiros. Com a crise, o banco decidiu suspender totalmente o projeto e demitiu o executivo. Mas ofereceu um pacote de apoio, por tempo indeterminado, até que ele encontre uma nova posição.
O pacote foi contratado numa empresa que presta esse tipo de serviço e oferece apoio na elaboração de currículo, na sua divulgação e, durante a transição, um pequeno escritório com telefone, fax, e-mail e secretária.
O executivo afirma ser melhor assim do que ir para casa e ficar de pijama, angustiado, gastando a poupança para bancar o nível de vida alcançado. Demitido há pouco mais de três meses, ele ainda não encontrou outra colocação, mas a possibilidade mais interessante de emprego novo acabou surgindo por meio de um amigo, que o indicou para entrevistas numa multinacional.
Aliás, ele conheceu esse amigo num emprego mais antigo, o que revela a importância das boas relações em cada emprego como uma espécie de seguro contra o desemprego futuro.

Serviços
A Saad Fellipelli Recursos Humanos é uma dessas empresas que atende ao mercado de desempregados de alto nível. Dirigida por duas psicólogas, Adriana Fellipelli e Eliane Saad, a empresa opera com duas divisões, uma para pessoa física e outra para pessoa jurídica. Mantém uma equipe de 34 pessoas em São Paulo, Rio de Janeiro e Curitiba e inclui, entre seus clientes, até mesmo um presidente de grande empresa.
Adriana afirma que o negócio teve uma primeira onda de crescimento depois do Plano Collor. De lá para cá, não parou de se expandir e, hoje, inclui serviços não só de recolocação profissional, mas também de atuação preventiva ("coaching").
Empresas que constatam dificuldades de relacionamento em equipes ou quedas de desempenho contratam serviços de avaliação psicológica de seus funcionários. A Saad Fellipelli aplica um teste importado dos EUA, conhecido como MBTY (Myers Briggs Type Indicator). É uma adaptação da noção de arquétipo de Carl Gustav Jung (1875-1961).
Uma abordagem semelhante é adotada pela empresa Lens & Minarelli, que defende a necessidade de o profissional "tomar conta da própria carreira". José Augusto Minarelli é autor do livro "Empregabilidade - Como Ter um Trabalho e Remuneração Sempre" e oferece serviços de recolocação para empresas que estão em vias de demitir um funcionário.
A alternativa à recolocação profissional é se convencer de que o mundo do emprego está desaparecendo e que, de agora em diante, vão predominar formas novas de trabalho. "O importante é identificar necessidades não atendidas", define o consultor Dino Mocsányi, que tem oferecido cursos de "capacitação e aperfeiçoamento de consultores de empresas".
Mocsányi já trabalhou como engenheiro em empresas como Siemens e Motorola, chegando a vice-presidente da empresa de consultoria Phillip Crosby. Em 1993, avaliando que seus caminhos na empresa estavam limitados, ele resolveu abrir uma empresa de consultoria em gestão de empresas e controle de qualidade.
"Mas logo vários amigos e ex-clientes começaram a me procurar, perguntando como era a vida de consultor, pedindo dicas, vários aliás ainda bem empregados", relata. Percebendo nessa demanda um nicho de mercado, ou seja, a existência de uma necessidade não atendida, Mocsányi começou a dar consultoria sobre como é a vida de um consultor.
Uma de suas referências é o norte-americano William Bridges, que afirma estarmos no início de uma época em que haverá cada vez mais trabalho, porém menos empregos com carteira assinada, previdência social e férias garantidas.
Além da recolocação e da opção pela consultoria, também têm crescido os serviços de apoio à formação de micro e pequenas empresas, nicho em que se destaca o Sebrae (Serviço de Apoio à Pequena e Média Empresa).
Segundo um consultor que faz atendimento num dos balcões da instituição, o maior problema entre os candidatos à utilização de uma poupança ou FGTS levantado na demissão é a incapacidade de atuar como autêntico empresário.
Depois de passar vários anos confinado a um escritório, seguindo uma rotina e obedecendo a uma hierarquia, o candidato a empresário tem dificuldades para atuar "por conta própria". Há centenas de casos de gente que gasta toda a poupança numa franquia, por exemplo, que ao quebrar deixa a pessoa desempregada e sem poupança.
(GILSON SCHWARTZ)



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