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São Paulo, quarta-feira, 21 de maio de 2003

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País é refém do curto prazo, diz economista

ÉRICA FRAGA
ENVIADA ESPECIAL AO RIO

A tão esperada estréia do governo petista no Fórum Nacional, principal arena de discussão de temas econômicos no país, não aconteceu. Ontem, primeiro dia da 15ª edição do evento, os dois representantes do governo esperados, o senador Aloizio Mercadante (SP) e o secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Marcos Lisboa, não apareceram.
Com as baixas, que provocaram desconforto entre os participantes, as atenções ficaram centradas em um confronto entre os economistas Affonso Celso Pastore (ex-presidente do Banco Central) e Ricardo Carneiro (professor da Unicamp).
Respectivamente, Pastore e Carneiro reproduziram os tradicionais embates entre ortodoxia e heterodoxia que, em fóruns passados, haviam sido protagonizados pelo ex-ministro da Fazenda Pedro Malan e pelo próprio Mercadante, quando era oposição.
Pastore e Carneiro até concordavam num ponto: o fluxo de capital que o Brasil tem recebido este ano é principalmente de curto prazo, o que deixa o país vulnerável ao risco de saída repentina desse dinheiro.
As diferenças entre os dois economistas, no entanto, se referem às causas da incapacidade de o país atrair investimentos de mais longo prazo e, principalmente, às soluções para isso.
O estudo apresentado por Pastore centrava-se na defesa de que a solução do problema fiscal brasileiro é a chave para que o risco-país caia, fluxos de investimento de mais longo prazo voltem e a taxa de câmbio real (câmbio nominal descontada a variação entre a inflação externa e a doméstica) atinja um ponto de equilíbrio. Tudo isso reduziria os riscos de novos choques inflacionários e levaria à diminuição da vulnerabilidade externa.
Segundo o economista, foi o temor da insolvência fiscal que, em 2002, fez disparar o risco-país brasileiro. Isso levou a uma brutal redução no fluxo de investimentos para a economia, fazendo a taxa de câmbio disparar acompanhada pelo aumento de preços internos e pela relação entre dívida pública e PIB (Produto Interno Bruto).
A sugestão de Pastore -encampada por outros participantes do fórum, como Alexandre Schwartsman, economista-chefe do Unibanco, e Raul Velloso, especialista em finanças públicas- é que o país ataque o problema fiscal de duas formas.
A primeira, no curto prazo, seria a redução do grande passivo cambial do governo, que reduziria a vulnerabilidade da dívida. O segundo passo, de longo prazo, é a redução significativa do endividamento público por meio de reformas estruturais, como a da Previdência.
Carneiro diz que o foco deveria ser transferido da política fiscal para o câmbio. O economista, que garantiu a pluralidade do debate, causou arrepios nos demais palestrantes ao sugerir um controle da taxa de câmbio.
Para Pastore e Schwartsman, ele havia dado a entender que propunha a volta de um regime de bandas fixas ajustáveis, praticado no Brasil até janeiro de 1999.
"Esse regime [de câmbio flutuante] é extremamente eficaz, e não ineficaz como quer o Ricardo Carneiro. Ao fazer a proposição que o Ricardo está fazendo, que se tire o foco do lado fiscal, ele está invertendo em 180 graus aquilo que é a proposta do Plano A, não a do Plano B. Acredito que ele está cometendo um erro", diz Pastore.
Carneiro se defendeu. Negou que tivesse sugerido a volta do regime de bandas fixas cambiais. Segundo ele, sua proposta é que haja um regime de controle de capitais com "uma banda de câmbio real não explícita".
"A tributação na entrada e eventualmente na saída [de capitais] pode tornar o país menos sujeito à entrada e saída de capitais. Com isso, elimina-se a instabilidade do câmbio", afirmou Carneiro, para quem essa é a forma de transformar os fluxos de curto prazo em investimentos de longo prazo.
Segundo ele, que é filiado ao PT, a proposta não é um Plano B, já que ele nem é do governo. Carneiro chegou a trabalhar na formulação do programa de Luiz Inácio Lula da Silva tanto na última como em eleições passadas, mas não participa do governo devido a divergências com o ministro da Fazenda, Antonio Palocci Filho.


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