São Paulo, segunda-feira, 21 de maio de 2007

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Real forte leva indústria a importar item acabado

Estratégia é usada devido à longa queda do dólar

JANAINA LAGE
DA SUCURSAL DO RIO

Começou com a importação crescente de insumos, mas a apreciação prolongada do real levou segmentos tradicionais da indústria a jogar a toalha e recorrer à importação de bens acabados.
Dessa forma, algumas empresas reduziram sua atuação ao papel de importadoras de parte da linha de produtos enquanto o governo ainda avalia como evitar que o dólar teste novos pisos abaixo de R$ 2.
É o caso da Suggar, tradicional fabricante de exaustores. No passado, chegou a exportar 14 mil secadoras de roupas por mês. Com a valorização do real, Lúcio Costa, dono da empresa, optou por importar bens acabados. Com isso, passou a oferecer 40 produtos -34 importados, sendo 28 chineses.
"Cada produto custaria, no mínimo, R$ 10 milhões para ser fabricado no Brasil. Estou nesse ramo desde 1966, já passei por superinflação, confisco da poupança, meus principais clientes pediram concordata. Decidi pegar minhas ferramentas, passar graxa e guardar. Quem sabe amanhã começo a produzir mais novamente."
Segundo Costa, a estratégia tem sido adotada por todas as empresas de eletrodomésticos de pequeno volume. "Só não fazem isso com a máquina de lavar porque o frete não vale a pena. O contêiner ainda é caro", disse. Com a nova estratégia, teve de cortar 104 empregos.

Cenário indefinido
Segundo Antonio Licha, professor do Grupo de Conjuntura da UFRJ, é difícil distinguir no atual cenário o que é resultado da apreciação cambial e o que é sinônimo da nova especialização do trabalho decorrente do efeito China. Na prática, o processo poderia resultar até mesmo no desaparecimento de alguns segmentos industriais.
"A apreciação cambial pode ser revertida em algum momento. Os setores que estão importando bens não vão mais conseguir importar e terão fechado as unidades domésticas. Isso cria uma incógnita sobre o futuro da indústria."
Para Licha, a taxa de câmbio atual já prejudica as montadoras de veículos que vieram para o Brasil durante a década de 90. O eventual fechamento de unidades poderia acentuar ainda mais as desigualdades regionais e estimular o fluxo de mudanças entre as regiões. "Se fecha uma fábrica na Bahia, a tendência é o operário procurar emprego em outras regiões."
Enquanto o cenário cambial não se define, o presidente da fabricante de brinquedos Estrela, Carlos Tilkian, afirma que traçou uma estratégia que permite produzir ou importar de acordo com o cenário.
Em 2007, a fabricante de brinquedos estima que as importações responderão por 40% do faturamento. A Estrela criou uma campanha de relançamento dos brinquedos mais tradicionais. Quem brincou de Genius (jogo de teste de memória, na década de 80) verá um produto agora produzido integralmente na China.

Câmbio ideal: R$ 2,70
Para José Augusto de Castro, vice-presidente da AEB (Associação de Comércio Exterior do Brasil), o dólar ideal para os exportadores seria na faixa de R$ 2,70. O razoável para contentar 80% dos exportadores seria na faixa de R$ 2,40 a R$ 2,50, patamar ainda distante do atual.
Outra estratégia adotada para driblar o real forte é acelerar o processo de internacionalização. A Marcopolo, fabricante de carrocerias de ônibus, aumentou a produção em unidades no México, na África do Sul e na Colômbia para enfrentar a concorrência. Além disso, reduziu a exportação de insumos e de componentes brasileiros para essas unidades.
"Passamos a aproveitar os insumos e os componentes locais", afirma Nelson Gehrke, diretor de operações comerciais do mercado externo. A maior parte (74%) das exportações da Marcopolo está concentrada na América do Sul.
A Azaléia, fabricante de calçados, adotou estratégia similar. Decidiu focar no mercado interno. No primeiro trimestre, as exportações caíram 40,3% com a valorização do real. A meta é mesclar o abastecimento do mercado externo com exportações do Brasil e da China.


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