São Paulo, terça-feira, 21 de julho de 2009

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BENJAMIN STEINBRUCH

Basta de conservadorismo


Se a recuperação continuar no próximos meses, a velha pregação ortodoxa ganhará força; será hora de rechaçá-la

SURGIU UMA nova discussão no país: deve o Brasil continuar tomando medidas para estimular a retomada econômica?
Durante os piores momentos da crise, na virada do ano, houve quase unanimidade na defesa de medidas anticíclicas do governo, como a redução de impostos, a liberação de créditos e outros incentivos ao consumo e ao investimento.
Como o susto inicial passou, conselheiros conservadores já criaram coragem para espalhar sua velha pregação contra novos estímulos ao crescimento. O secretário-geral da OCDE, Angel Gurría, esteve em Brasília na semana passada. Entre as declarações elogiosas ao Brasil, ele acrescentou um conselho: a elevação de despesas e a queda de receitas podem levar ao desequilíbrio fiscal. E, por isso, seria hora de parar com as desonerações.
O Brasil deve agradecer aos conselhos do representante da OCDE. De fato, o desequilíbrio fiscal é sempre uma ameaça à economia. Ocorre, porém, que o país ainda não se livrou da maior ameaça da crise, que é a perda de produção e de empregos.
Há sinais de melhora da atividade econômica. Depois de dois trimestres em queda, o PIB deve ter crescido até 2% no segundo trimestre sobre o primeiro. Estamos muito longe, todavia, de retomar o ritmo de expansão continuada, até porque quase nada se pode esperar em matéria de demanda externa. A China já acelerou seu crescimento para 7,9% ao ano, mas EUA e Europa ainda mostram reações discretas.
No comércio interno, por exemplo, as vendas subiram após as desonerações fiscais e o apoio ao crédito.
Mas outros indicadores mostram que, em junho, a indústria ficou estagnada em relação a maio, principalmente em São Paulo. Nos últimos 12 meses, a produção industrial paulista caiu 6,2%. Em todo o país, a carga de energia consumida em junho, quando comparada com a do mesmo mês de 2008, recuou 4,5%.
Nas estradas, o fluxo de veículos pesados caiu 2,4% de maio para junho. São indicadores antecedentes bastante preocupantes.
Há outros motivos para apreensão. O ritmo de alta da massa salarial, que em 12 meses ainda mostra expansão real de 6,6%, deve começar a cair. O setor automotivo também pode ter um semestre mais fraco, pois o estímulo do IPI será retirado aos poucos a partir de outubro.
É muito cedo, portanto, para pensar em acionar mais instrumentos ortodoxos, que, aliás, já machucaram a economia brasileira durante longos anos. Em todo o mundo, ainda vigora uma parafernália de medidas que vão de incentivos fiscais e bônus para compras até créditos a juros baixos para o consumo.
Na China, embora o ritmo de expansão do PIB já se aproxime de 8% ao ano, o governo anunciou que não está disposto a pisar nos freios da economia. Só em junho, Pequim despejou no mercado créditos equivalentes a US$ 220 bilhões. No primeiro semestre do ano, a cifra atingiu US$ 1 trilhão.
Nos próximos meses, se a recuperação continuar, a velha pregação ortodoxa ganhará força. Será hora de rechaçá-la, para que o país não tenha seu ímpeto de crescimento econômico mais uma vez sufocado por conservadorismo ou por medo.
Na luta obrigatória pelo equilíbrio fiscal, o melhor caminho não é suprimir estímulos, mas cortar gastos correntes. Os mais fanáticos fiscalistas poderiam consultar a tabela que a "Economist" publica em sua última página. Em uma lista de 43 países, o Brasil é o segundo com menor déficit fiscal previsto para o ano: 2% do PIB, em comparação com quase 14% nos EUA e no Reino Unido, 4% na China e 5,9% na União Europeia.


BENJAMIN STEINBRUCH , 55, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho de administração da empresa e primeiro vice-presidente da Fiesp.

bvictoria@psi.com.br


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