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Agrofolha
Banco do Brasil é acusado de "venda casada"
Controladoria Geral da União afirma que agricultores têm de comprar produtos e serviços para receber empréstimo do Pronaf
Relatório aponta que
agricultor teve de comprar
seguro de vida; em outro
caso, "produto vendido"
foi título de capitalização
JOSÉ MASCHIO
DA AGÊNCIA FOLHA, EM LUNARDELLI (PR)
O Banco do Brasil, principal
agente operador do Pronaf
(Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar), usa a liberação de recursos do programa para vender produtos e serviços, aponta
fiscalização da CGU (Controladoria Geral da União). A prática
é vedada pelo MCR (Manual de
Crédito Rural), em norma do
Conselho Monetário Nacional.
Fiscalizações da CGU constataram irregularidades, em
pelo menos quatro Estados, de
venda "casada" de produtos e
serviços -títulos de capitalização, poupança e seguro de vida- no momento da contratação de empréstimos do Pronaf.
Relatórios da controladoria,
com base em fiscalizações realizadas no ano passado e divulgadas no dia 9 do mês passado,
mostram que o BB condiciona a
liberação de créditos do Pronaf
à compra, pelo agricultor, de
produtos do banco.
Essas irregularidades aparecem em municípios como Antônio Dias e Ninheira (MG), Paranaíba (MS) e Lunardelli (PR).
Em Chuvisca (RS), o BB é acusado pela CGU de não devolver
juros para débitos quitados antes do prazo.
Ainda no Rio Grande do Sul,
em São João da Urtiga, a controladoria apontou que o banco
concedeu empréstimos do Pronaf a agricultores com renda
anual superior ao limite estabelecido pelo programa.
Além do sorteio dos municípios a serem fiscalizados, a
CGU usa o método de escolher
dez dossiês (contratos) de Pronaf para análise.
Em Antônio Dias e Ninheira,
por exemplo, o índice de exigência de reciprocidade por
meio da compra de seguro de
vida foi de 70% dos dez casos
analisados. Essa exigência
constava dos contratos analisados e, segundo o relatório técnico, os agricultores não tinham conhecimento da contratação do seguro.
Seguro e poupança
Em Antônio Dias, um caso de
uso, pelo banco, do Pronaf para
fazer receita é exemplar. Segundo o relatório dos técnicos
da CGU, ao obter empréstimo
de R$ 18 mil, com prazo de oito
anos e pagamento anual, um
agricultor foi obrigado a comprar um seguro de vida com pagamento anual de R$ 453.
No município de Lunardelli
(391 km ao norte de Curitiba),
onde a controladoria relatou
episódios de reciprocidade para a concessão de empréstimos,
a Folha encontrou casos ainda
mais graves, como compra de
títulos de capitalização, de seguro de vida e bloqueio de recursos de produtores.
Adenir Gomes Ferreira, dono de 9,6 hectares, é um dos
agricultores com dinheiro bloqueado pelo BB. Na safra de verão passada, ele fez empréstimo de R$ 8.000, com vencimento em outubro. Para ter o
dinheiro, teve que comprar um
título de capitalização.
Em abril deste ano, Ferreira
vendeu R$ 8.500 em soja para
uma cooperativa e teve o dinheiro retido pelo BB, que
abriu, compulsoriamente, uma
poupança para garantir o pagamento do empréstimo.
"Fizeram eu abrir uma poupança e o dinheiro está lá, bloqueado, para quitar uma dívida
que só vai vencer em outubro",
afirma Ferreira. Ele disse que
precisou pegar empréstimos
com agiotas para plantar a safra de inverno deste ano.
"O banco poderia ter quitado
a dívida antecipadamente e devolver os juros cobrados de
abril a outubro, mas nunca fazer o bloqueio", afirma a gerente da Emater (Empresa de Assistência Técnica e Extensão
Rural) em Lunardelli, Liliane
Rodrigues da Fonseca.
"Esse é um caso de perversão, de irregularidade, que precisa ser investigado", diz o diretor financeiro e de proteção à
produção rural, João Luiz Guadagnin, da Secretaria de Agricultura Familiar.
Guadagnin admite que é difícil impedir a exigência de reciprocidade. "As normas proíbem, mas o assédio das agências para que o agricultor familiar compre serviços é difícil de
controlar. Sempre existe a desculpa de que o banco ofereceu
o produto, mas não obrigou o
agricultor a comprá-lo."
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