São Paulo, domingo, 21 de setembro de 2008

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"Precisamos de um novo Bretton Woods"

MARCELO NINIO
DE GENEBRA

Parece uma idéia que o presidente francês, Nicolas Sarkozy, conhecido por sua hiperatividade política e o gosto pelos grandes eventos diplomáticos, adoraria pôr em prática: uma conferência mundial, por iniciativa da Europa, para discutir regras para as desgovernadas finanças globais. A sugestão é de alguém próximo do poder francês, o economista Christian de Boissieu. Como presidente do Conselho de Análise Econômica, em Paris, ele é responsável por orientar os passos do primeiro-ministro, François Fillon. "Precisamos de um novo Bretton Woods, desta fez para discutir o sistema financeiro", disse Boisseu em entrevista à Folha, em referência à conferência de 1944 que estabeleceu as regras das relações comerciais e econômicas no pós-guerra.

 

FOLHA - O plano anunciado pelos EUA vai conseguir estabilizar os mercados?
CHRISTIAN DE BOISSIEU
- O objetivo foi dar um choque de confiança. A iniciativa se parece com a que foi implementada no começo dos anos 90 nos EUA, o Resolution Trust Corporation [fundo criado pelo governo para assumir instituições de poupança e empréstimo falidas]. Uma solução semelhante foi adotada no Japão nos anos 90 e também na Rússia. É uma forma clássica de separar os bons dos maus ativos e acho que pode funcionar não só como um choque mas como uma solução de longo prazo. Mas esse plano vai aumentar o déficit americano, depois de envolver totalmente os contribuintes na gestão desta crise.

FOLHA - Estamos vivendo a pior crise financeira da história?
DE BOISSIEU
- Esta crise é diferente do Crash de 1929 por duas razões: primeiro graças à resiliência dos grandes emergentes em seu crescimento, China, Índia, Brasil e Rússia. A outra é a reação das autoridades, que é totalmente diferente do que ocorreu em 1929, quando o Fed [BC dos EUA] apertou a política monetária americana, o que foi uma loucura. Temos de reconhecer o fato de que as reações do Fed e do BCE [Banco Central Europeu] contiveram os riscos sistêmicos. Além disso, houve intervenção direta do Tesouro americano e do britânico. Apesar disso, minha sensação é de que as turbulências ainda vão continuar.

FOLHA - Uma ação global é possível?
DE BOISSIEU
- O mundo precisa de um Bretton Woods financeiro. A conferência de Bretton Woods, em 1944, foi monetária, não financeira. O grande objetivo foi restaurar o comércio e criar um sistema de câmbio para facilitar o renascimento do comércio após a guerra. Hoje não é possível fazer nada sobre o câmbio. Levará um bom tempo até voltarmos à estabilidade cambial em termos mundiais. Por isso é que precisamos de um Bretton Woods, para dar respostas consistentes a vários tópicos, como o desempenho das agências de rating, os padrões de contabilidade, as normas de conduta dos fundos soberanos, limites de liquidez para os bancos, e outros. Precisamos de respostas globais para um desafio global. Acho que a Europa poderia tomar a iniciativa de convocar uma reunião. Essas não são decisões que possam ser tomadas apenas entre EUA e Europa. Precisamos de um novo formato com a abertura para os grandes emergentes: Índia, China, Brasil.


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