São Paulo, terça-feira, 21 de novembro de 2000

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LUÍS NASSIF
O preço do Banespa

As discussões em torno da privatização do Banespa demonstram a dificuldade que há, ainda, para tratar de temas técnicos.
Na avaliação de uma empresa, há dois elementos de análise. Um é a rentabilidade do negócio em si. Avalia-se quanto a nova empresa poderá render, sob nova administração, monta-se um fluxo estimado de lucros em determinado prazo e se traz a valor presente de acordo com a taxa de desconto que o comprador está disposto a pagar -taxa de desconto equivale à rentabilidade esperada do investimento.
O segundo elemento é o estratégico. O comprador admite pagar mais (e ter uma rentabilidade menor) por razões estratégicas. O Bradesco toparia pagar mais do que acha que o Banespa vale, se houvesse risco de o Itaú adquirir o Banespa e se transformar no maior banco brasileiro. Ou -o que acabou ocorrendo- o Santander topa pagar muito mais do que seus concorrentes, porque pretende ampliar substancialmente sua posição no mercado brasileiro.
Quando entram fatores dessa natureza na disputa, o preço mínimo deixa de ter importância, mas a boa avaliação continua sendo relevante.
Há dois trabalhos dos avaliadores. O primeiro é levantar o maior número possível de informações objetivas sobre o banco -sua rentabilidade atual, sua carteira de ativos, seu passivo trabalhista e atuarial etc. O segundo é, em cima desses dados, aplicar uma determinada metodologia de avaliação, utilizando taxas de desconto para calcular o valor presente dos resultados futuros.
O trabalho fundamental é o primeiro. Mais que uma avaliação, é um levantamento e organização de todas as informações relevantes para estimar o valor do banco. Dispondo desses dados, cada comprador vai trabalhar o seu cenário específico, colocando as variáveis que pretender -taxas de desconto menores (que levam a um preço maior), se estiver disposto a correr mais risco, taxas maiores, se pretender correr menos riscos.
O que o TCU (Tribunal de Contas da União) fez foi identificar dados relevantes incorretos no trabalho dos avaliadores. Foi um trabalho técnico complexo e dos mais respeitáveis. Já o trabalho no qual o Ministério Público Federal de Brasília se baseou consistiu simplesmente em pegar os dados levantados e alterar a taxa de desconto utilizada.
Tendo os dados disponíveis, cada candidato vai utilizar a sua taxa de desconto, independentemente daquela escolhida para a avaliação. Teria sentido considerar outras taxas de desconto se não houvesse disputa pelo banco.
Em relação ao preço final, não resta dúvida de que os fatores estratégicos conferiram ao Banespa um valor muito maior do que o do mero retorno do capital. Tanto assim que os bancos americanos saíram da competição antes da hora e as ações do Santander caíram 5% assim que foi revelado o resultado da compra.
Antes do Banespa, coube ao Santander igualmente o lance mais extravagante já feito por um portal latino-americano -a compra do Patagon por mais de US$ 700 milhões. Aliás, é provável que a privatização do Banespa seja responsável por um paradoxo curioso: internamente, os mesmos procuradores de sempre sustentando que, qualquer que seja o preço pago, estará abaixo do valor do banco; e, na Espanha, os acionistas do Santander questionando o preço pago, por ter sido muito maior que o preço justo.


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