São Paulo, terça-feira, 22 de janeiro de 2008

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VINICIUS TORRES FREIRE

As desrazões do pânico


Bolsas caem sem motivo "essencial", devido a feriado nos EUA e à rebarba de notícias de sexta-feira em Wall Street

PÂNICOS TÊM muitos e diferentes motivos. Tantos motivos, tantas explicações diferentes e de origem tão diversa que, no conjunto, não explicam grande coisa.
Sim, o medo está em disparada -mas faz quase uma quinzena. Sim, ninguém entendeu ou apreciou o pacote Bush. Sim, Ásia e Europa pegaram a rebarba do final da sexta-feira passada em Nova York, que nos números não foi tão dramático, mas que acrescentou novo motivo de preocupação para bancos e mercados de crédito, em especial o de finanças exóticas. De resto, o mercado americano estava fechado ontem e, pelo jeito, ninguém quis esperar para ver se o caminhão da finança dos EUA também hoje desceria a rua desgovernado, como indicavam os índices futuros ontem de tarde.
Mas por que a ficha da recessão teria caído só ontem a leste do Atlântico?
Ações de instituições financeiras puxaram os tombos na Europa e na Ásia. Havia rumores de perdas em bancos chineses, alemães e franceses com derivativos imobiliários americanos. O custo de fazer seguro financeiro para empresas européias decolou. Mas, em suma, o fator de medo menos irracional parecia ser a crise de instituições que fazem seguro de títulos financeiros nos EUA.
Não se trata de seguradoras, reguladas pelo governo. São empresas que entram em contratos por meio dos quais se comprometem a cobrir eventual calote num título financeiro e, em troca, recebem pagamentos periódicos da outra parte. O título financeiro pode ser qualquer coisa: de simples empréstimo de uma empresa até um estrambótico derivativo, um título que rende o pagamento de outro título lastreado num pagamento do mundo "real" -prestação de casa ou cartão de crédito.
Para ficar num caso bem simplezinho: se as finanças da empresa que tomou o empréstimo "segurado" pioram, o banco que emprestou está em tese e/ou em parte coberto e não precisa registrar no balanço que o tal empréstimo pode ir para o vinagre.
Mas, se a empresa que fez o "seguro" também está micada, o "seguro" passa a valer menos ou nada.
Pois bem, depois de muito boato, agências de cotação de risco passaram a confirmar na sexta-feira que essas "seguradoras" estão mal das pernas: podem não cumprir os contratos, pois "seguraram" muita dívida ruim. Perderam a "nota dez" de crédito. Se forem à breca ou receberem notas menores, os títulos ruins que elas "seguravam" passam a valer menos, e bancos têm de reservar mais dinheiro para perdas (certas instituições são obrigadas a vender tais títulos apodrecidos). Na semana passada, Merrill Lynch e Citigroup já deram baixa de R$ 4 bilhões de títulos em tese "segurados".
Quanto menor o crédito das "seguradoras", menos vale seu "seguro", menos valem os papéis apodrecidos que tais instituições "seguravam". Fica mais arriscado emprestar. O crédito fica mais caro. A economia "real" também tende a sofrer.
Para piorar, tais contratos de "seguro", "credit default swaps" (CDS), também são negociados no mercado, o que só aumenta a confusão e a cadeia potencial de perdas. Quase nada desse dominó começou a cair.
O Brasil com isso? A Bovespa é "mundializada". Significa que a economia vai entrar em parafuso? Por ora, não -não por isso, ao menos.

vinit@uol.com.br


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